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A importância de demonstrar altas expectativas em relação a todos os alunos

Ter altas expectativas não resolve todos os problemas das escolas, mas estudos mostram que as expectativas dos professores afetam os resultados e as atitudes dos alunos

POR:
Ernesto Faria
Crianças de escola pública em sala de aula   Foto: Arquivo/Agência Brasil

Hoje, dia 3 de maio, a Nova Escola e o Iede lançam a coluna Pesquisa Aplicada. A partir de hoje, sempre às quintas-feiras, pesquisadores que estudam educação em diferentes especialidades - clima escolar, formação docente, gestão escolar, financiamento na educação, entre outras - publicarão aqui seus artigos.

Sendo o Brasil um país tão grande e complexo, as políticas públicas em educação não podem abster-se de olhar os dados e evidências de pesquisa que temos. Este é, portanto, um espaço que busca contribuir com o debate educacional, apresentando evidências de pesquisas que possam auxiliar formuladores de política pública e educadores.

Dentro dessa iniciativa, eu, diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Eduacional (Iede), escrevo o 1º texto sobre os efeitos que as expectativas de aprendizagem dos professores têm no desempenho dos alunos. Além de ser um tema de grande relevância, este é um tópico já com muito estudo na academia. Mas, antes de trazer apontamentos acadêmicos, cabe aqui uma pergunta: o que significa mesmo expectativa de aprendizagem?

O dicionário Aurélio traz as seguintes definições para a palavra expectativa: “ato ou efeito de expectar; esperança baseada em supostos direitos, probabilidades, pressupostos ou promessas; ação ou atitude de esperar por algo ou por alguém, observando; esperança baseada em supostos direitos, probabilidades, pressupostos ou promessas.” Expectativa, logo, está muito ligado ao conceito de “esperança”, o que diz muito sobre a relação aluno professor quando trazemos o conceito de expectativa de aprendizagem. O docente ter altas expectativas de aprendizagem para a sua turma tem a ver com a crença que tem em relação aos seus alunos.

Estudo de referência no tema, realizado em 1968 pelos psicólogos Robert Rosenthal e Lenore Jacobson, encontrou um efeito pigmaleão, como chamaram os autores, que diz que quanto maior a expectativa que os professores têm em relação aos seus alunos maior serão os seus resultados. No estudo, um grupo de alunos de uma escola da Califórnia fez um teste de QI no início e ao final do ano, sendo que, no início, os professores foram informados de que um grupo de alunos estava prestes a ter um período de rápido crescimento intelectual - quando, na verdade,  o resultado deles havia sido semelhante ao dos demais. Ao final do ano letivo, porém, os alunos que os professores acreditaram que tinham desempenho potencial acima da média, de fato se sobressaíram.

Este estudo mobilizou muitos formadores de opinião e veículos de mídia sobre a importância das expectativas dos professores. Cabe destacar que o estudo foi lançado após o impactante “Relatório Coleman”, encomendado pelo governo americano e de autoria do sociólogo James Coleman, em 1966, que mostrava que o impacto da escola era baixo em comparação aos efeitos extraescolares (nível socioeconômico dos alunos, por exemplo).

Será que haveria, então, uma oposição do que as pesquisas apontavam? Como ter altas expectativas se a realidade mostraria o contrário?

A pesquisadora Kathleen Cotton publicou, em 1989, uma metaanálise com 67 estudos da área que trazem importantes apontamentos. Entre as principais conclusões, pode-se destacar que: 1. As expectativas de aprendizagem, quando comunicadas na sala de aula e em toda a escola, afetam o resultado e as atitudes dos alunos; 2. As expectativas são um componente importante das escolas eficazes e que, nessas escolas, as expectativas são comunicadas dentro de políticas e práticas que focam em metas acadêmicas. Outra conclusão é que comunicar baixas expectativas tem um efeito negativo maior no desenvolvimento de um aluno do que o efeito positivo de se comunicar altas expectativas.

Cotton mostra que vários aspectos influenciam as expectativas dos professores, como gênero do aluno, nível socioeconômico, raça, aparência, maus resultados acadêmicos, posição que senta na sala de aula, entre outros. E, por haver características associadas a um menor desempenho, aponta também o efeito negativo de pesquisas acadêmicas que enfatizam a importância de efeitos externos à escola.

Cotton não contesta o impacto dos fatores sociais na aprendizagem dos alunos, mas aponta que várias pesquisas mostram que escolas eficazes são capazes de atenuar esse efeito.  Segundo ela, algumas pesquisas como o “Relatório Coleman”, quando comunicadas de forma inadequada podem ter um efeito negativo nas expectativas dos professores. Olhando o que apontam os dados dos questionários da Prova Brasil de 2015, Cotton parece estar certa.

A figura abaixo, feita com base nas respostas de 262.417 professores de 5º e 9º ano do ensino fundamental que responderam aos questionários da Prova Brasil, mostra que um percentual maior percentual deles atribui dificuldades de aprendizagem a fatores externos, como falta de participação dos pais, do que a fatores ligados à atuação docente e da escola.

Respostas dos professores à pergunta: “Na sua percepção, os possíveis problemas de aprendizagem dos alunos da série(s) ou ano(s) avaliados ocorrem nesta escola devido à/aos(s)” (Inep, 2015)

O que as análises de Cotton sugerem é que há uma influência grande do ambiente social, mas a escola pode e precisa trabalhar para evitar esse impacto no desenvolvimento cognitivo dos estudantes. E acreditar na aprendizagem de todos os alunos é fundamental para isso.

Não está sendo dito aqui que altas expectativas vão resolver todas as dificuldades das escolas. Cotton, aliás, faz a ressalva em seu estudo de que veículos norte-americanos utilizaram inadequadamente os achados do efeito pigmaleão para responsabilizar professores por resultados ruins dos alunos. No entanto, altas expectativas são fundamentais para os alunos se engajarem com a escola e com a aprendizagem. E, como a pesquisadora ressaltou, os malefícios de demonstrar baixas expectativas são ainda maiores. Por isso, é fundamental que, independentemente de renda, raça ou qualquer característica que os alunos tenham, a escola e seus professores os estimulem. Essa é uma evidência científica já consolidada e que precisa ser incorporada em todas as práticas acadêmicas.

Veja algumas ações que a pesquisadora Kathleen Cotton aponta que podem ser feitas pelos educadores nas escolas.

Ernesto Martins Faria é diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) e doutorando em Organização do Ensino, Aprendizagem e Formação de Professores na Universidade de Coimbra.