A importância de monitorarmos indicadores educacionais
Monitoramento de aspectos de gestão da educação por tribunais de conta poderia ajudar a incentivar prefeitos a melhorar os sistemas de ensino
POR: Renan PieriA história da educação básica no Brasil tem muitos reveses e a qualidade do aprendizado promovido pelo sistema está muito aquém do que um país que tem as graves distorções socioeconômicas que temos precisa. Mas, curiosamente, não temos vergonha de quantificar o quanto a educação vai mal no país. Desde meados dos anos 90, com a criação do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), podemos identificar as disparidades entre redes no ensino de matemática e português, acompanhar a evolução de cada rede ao longo do tempo e começar a inferir quais políticas educacionais conseguem, de fato, promover um melhor aprendizado.
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Com a introdução da Prova Brasil, em 2005, e a divulgação do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) a partir de 2007, o sistema de monitoramento da educação brasileira subiu de patamar. Mesmo considerando limitações que o Ideb como qualquer indicador tem, passamos não só a fazer inferência acerca do desempenho de cada rede, mas também de cada escola que possua uma certa quantidade de alunos matriculados. Com o Ideb, criou-se um sistema de incentivos para gestores públicos, diretores e professores buscarem formas de melhorar a gestão pedagógica da escola ou ao menos promoverem o aumento do índice.
Em algumas redes, a simples divulgação dos resultados por escola parece pressionar os gestores públicos no processo eleitoral, havendo evidências de que municípios cujas escolas tem melhor desempenho possuem maiores chances de seus prefeitos se reelegerem (acesse aqui estudo de Firpo, Pieri e Souza sobre o tema). Para outras redes, esses incentivos foram reforçados através de políticas de bônus para professores e diretores, com algumas experiências positivas e outras nem tanto (veja aqui estudo sobre os resultados da política de bônus em São Paulo)
Na próxima segunda-feira, dia 3, serão divulgados os resultados do Ideb 2017, mas que não devem trazer grandes novidades. A estagnação das redes nas últimas edições acende um alerta sobre o atual sistema brasileiro de monitoramento e nos faz questionar de que forma ele está contribuindo para a melhoria da aprendizagem dos alunos, ou mesmo se ele tem sido utilizado de forma adequada pelas redes.
Aparentemente, diversas redes que adotam sistemas de bônus não estão tendo a evolução desejada, e as pressões da opinião pública sobre os resultados das escolas parecem não ser suficientes para promover a melhoria do sistema.
Obviamente, cabe aqui questionarmos sobre a questão do contra factual: será que na ausência de tais sistemas de incentivos diretos ou indiretos, os resultados não seriam ainda menos positivos? Não sabemos disso com certeza e o debate está em aberto.
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Nesse sentido, é interessante a iniciativa dos tribunais de conta estaduais de monitorar ações de gestão dos municípios no que diz respeito a várias áreas da administração pública, dentre elas a educação. Em recente relatório divulgado pelo Tribunal de Contas do Estado Rio de Janeiro (TCE-RJ), constatou-se que 56% dos municípios do estado não monitoram a demanda por vagas em creches, 49% não tem programa específico para o desenvolvimento em leitura e escrita e 57,5% não monitoram quantas crianças de 4 a 5 anos estão fora da escola. O monitoramento dos tribunais de contas está consolidado no IEGM (Índice de Efetividade da Gestão Municipal), índice que é apenas informativo sobre a gestão municipal, mas que tem potencial para se tornar no futuro critério para que os órgãos de controle analisem a gestão de cada município.
Dessa forma, o papel de tais órgãos deixará de ser apenas o de validar o cumprimento de critérios de distribuição de gastos, mas passará também a avaliar aspectos básicos de gestão. Tais incentivos poderão reforçar a pressão que as urnas fazem sobre o mal desempenho dos alunos nos testes padronizados e estender aos gestores municipais os incentivos trazidos pelos sistemas de bônus. E, se os TCEs não só gerarem pressão mas buscarem dar suporte e dialogar com os municípios, esses efeitos poderiam talvez ter mais chances de serem positivos.
Certamente, o sucesso de tal iniciativa dependeria diretamente dos critérios adotados pelos órgãos de controle e dessa capacidade de dialogar de forma empática com as redes. Se a implementação não for de cima para baixo a perspectiva pode ser otimista, já que pessoas costumam responder a incentivos. E se houver um conjunto de práticas de gestão que passarão a ser monitoradas, os gestores se focarão em tais práticas para melhorar seus índices. O monitoramento da gestão da educação tem potencial para melhorar o sistema. Se vai dar certo ou não, só saberemos no futuro.
Para saber mais:
DIAS, Marina Villas Boas. Does Information on School Quality Affect Voting? Evidence from Brazil. 2017. PhD Thesis. PUC-Rio.
FIRPO, Sergio; PIERI, Renan and SOUZA, Andre Portela. Electoral Impacts of Uncovering Public School Quality: Evidence from Brazilian Municipalities. Revista Economia, 2016.
IEGM – Índice de Efetividade da Gestão Municipal, Resultados de 2017. Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.
OSHIRO, Cláudia Hiromi; SCORZAFAVE, Luiz Guilherme; DORIGAN, Tulio Anselmi. Impacto sobre o desempenho escolar do pagamento de bônus aos docentes do ensino fundamental do Estado de São Paulo. Revista Brasileira de Economia, 2015, 69.2: 213-249.
TAVARES, Priscilla Albuquerque. Três ensaios em economia da educação. Fundação Getulio Vargas, Tese de Doutorado, São Paulo, 2014.
TORAL, Guillermo. When are Local Governments and Bureaucrats Held Accountable for the Quality of Public Services? Evidence from Brazil's Education Sector. 2016.
Renan Gomes De Pieri é doutor e mestre em Economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), com pós-doutorado pelo Insper e bacharel pela Universidade de São Paulo (USP). É professor de Economia e pesquisador na área de Avaliação de Políticas Públicas.
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