Como agrupo meus alunos?
Em duplas, trios, quartetos... Para definir a melhor alternativa, é necessário, antes de mais nada, diagnosticar o que cada um sabe sobre o conteúdo. Como forma de ajudar nessa tarefa essencial para a aprendizagem, respondemos a 13 questões sobre o tema
POR: Bianca Bibiano, Beatriz Santomauro, NOVA ESCOLA, Ana Rita MartinsAs professoras Ana Paula Kordash e Vera Lúcia Guastapaglia, da EMEF Leandro Klein, em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, lecionam para uma turma de 5º ano. Para ensinar conteúdos de todas as disciplinas, muitas vezes elas dividem os 28 alunos em grupos, mas nunca de forma aleatória. A razão é simples: as duas já sabem que colocar trabalhando juntos os que têm saberes diferentes é uma forma poderosa de fazer todos aprenderem. Para tanto, sempre iniciam uma atividade com um diagnóstico em que verificam o que cada um sabe sobre o tema em questão. Só então planejam as situações de interação. Três delas - em Língua Portuguesa, Matemática e Geografia - são mostradas nas ilustrações nos quadros abaixo.
O procedimento de Ana e Vera - e de outros professores que usam os agrupamentos em sala para ensinar - está baseado em conhecimento produzido desde o início do século 20 por pesquisadores de diferentes áreas. Em 1930, o psicólogo bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934) já chamava a atenção para a importância da interação entre a criança e o professor e entre a criança e os colegas em situações de aprendizagem. Em A Formação Social da Mente, ele afirma que o bom aprendizado é aquele que foca o potencial que o aluno pode desenvolver com a ajuda de outros. Trabalhar em grupo, então, não é apenas importante, mas fundamental para ele.
Os estudos realizados na área destacam as condições em que se dá esse processo - o que inclui o conteúdo e o conhecimento prévio da turma -, além da importância do intercâmbio cognitivo, que traz avanços conceituais. O progresso alcançado quando os integrantes de um grupo confrontam pontos de vista moderadamente divergentes foi comprovado por pesquisa de Anne Nelly Perret-Clermont, da Universidade de Neuchâtel, na Suíça. Eles estão relatados no livro Desenvolvimento da Inteligência e Interacção Social, de 1979. Independentemente de as opiniões dos estudantes estarem certas, ela comprovou que a diversidade de posições leva a conflitos e, em consequência, ao desenvolvimento intelectual e à aprendizagem.
Isso fica claro na alfabetização, campo em que os agrupamentos são mais difundidos. No início dos anos 1980, pesquisas da educadora argentina Ana Teberosky mostraram como é produtivo agrupar os pequenos com colegas que apresentam hipóteses diferentes (mas próximas) sobre leitura e escrita. Apesar de tudo isso, poucos professores utilizam os grupos de forma criteriosa.
Hoje, um dos núcleos de destaque na investigação sobre a interação é integrado por César Coll, da Universidade de Barcelona, que, entre outros aspectos, estuda o papel do professor. Segundo ele, cabe ao educador criar condições para que os alunos realizem o trabalho com os próprios instrumentos e manter o agrupamento sempre produtivo. Para ajudar você nessa tarefa, NOVA ESCOLA selecionou 13 questões de leitores sobre o tema - entre 60 enviadas pelo site.
Critérios de agrupamento
Reescrita de conto
Disciplina Língua Portuguesa
Objetivo Desenvolver a produção de textos com base na linguagem que se usa para escrever
Conteúdo Produção de textos
Critérios de agrupamento Duplas, em que os dois têm nível de conhecimento próximo, mas habilidades distintas no que se refere à ortografia e à coesão de texto
Papel do professor Vera Lúcia Guastapaglia acompanhou o trabalho para garantir que os integrantes trocassem informações e se ajudassem para que ambos avançassem
Interação entre alunos Para reescrever a história, cada dupla produziu um texto e o redigiu conjuntamente, alternando o papel de escriba
Edilania Maria Rodrigues Batalha Pereira, Cubatão, SP
O primeiro passo é pensar no conteúdo a ser ensinado e nos objetivos específicos da atividade. Só depois de ter claras as duas informações, é hora de verificar o que a turma já sabe, o que se alcança com a investigação do nível de conhecimento de toda a classe e de cada aluno individualmente. De acordo com César Coll, a aprendizagem sempre tem como base conceitos, concepções, representações e conhecimentos construídos durante as experiências prévias dos estudantes. "Isso é o que condiciona em um alto grau o resultado da nova aprendizagem", explica ele no livro Aprendizagem Escolar e Construção do Conhecimento.
Esse mapeamento é o ponto de partida das ações do professor e o que dá apoio para a divisão em grupos, em que se reúnem os que têm condições de trocar em determinada tarefa. Quanto mais se sabe sobre o nível de conhecimento da garotada e o conteúdo a ser ensinado, mais produtivo é o agrupamento. Por isso, não basta fazer um diagnóstico no começo do semestre. A sondagem individual tem de ser repetida ao longo do ano, e o desempenho de cada um, acompanhado de perto em observações e na análise das produções.
Diferentes conteúdos exigem variados tipos de diagnóstico. Para verificar o que as crianças sabem sobre o basquete, por exemplo, nada melhor do que primeiro propor que assistam a uma partida e façam comentários. Em seguida, entregar uma bola a elas e deixar que mostrem esse conhecimento na prática, em quadra. Outro exemplo: para verificar como os recém-chegados à pré-escola escrevem e o que pensam sobre o sistema de escrita, o ideal é analisar o que produzem tendo lápis e papel nas mãos.
Há a necessidade também de fazer diferentes diagnósticos dentro de uma mesma disciplina, como Matemática. "Uma atividade para avaliar o conhecimento sobre o sistema de numeração não se parece em nada com a que se faz quando o assunto é espaço e forma", cita Priscila Monteiro, consultora pedagógica da Fundação Victor Civita (FVC). "Para a primeira, o desafio seria comparar diferentes valores de algarismos conforme a posição que ocupam no número. Já em relação à segunda, o diagnóstico exige, por exemplo, descrever o trajeto desde a casa até a escola ou identificar uma figura plana específica no meio de outras."
Sue Ellen Reis Oliveira Nascimento, Juiz de Fora, MG
A decisão depende de sua intencionalidade. Elas têm liberdade de escolher com quem vão trabalhar se a atividade não tiver como objetivo ensinar um conteúdo - como jogos conhecidos ou outras propostas em que estão em jogo conhecimentos adquiridos. Porém tudo muda se o objetivo é a aprendizagem. Nesse caso, a afinidade não cabe como um critério de agrupamento, pois o principal objetivo da estratégia é a interação cognitiva e a construção de conhecimentos.
Se os escolhidos para trabalhar juntos não se relacionam bem, um dos caminhos é mediar possíveis atritos para que a produtividade não seja prejudicada. Essa é também uma oportunidade para todos aprenderem a lidar com as diferenças e se respeitarem, independentemente dos vínculos emocionais. Ser capaz de perceber o ponto de vista alheio e considerá-lo exige aprendizado. "É essencial ver esse processo como uma construção progressiva e que depende da vivência de situações que promovam avanços nas relações, em direção à cooperação e à autonomia", afirma Heloisa Helena Garcia, mestre em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (USP), que desenvolve o seu doutorado sobre a interação.
Silvia Helena Rocha Barroso, Fortaleza, CE
Não. Ao definir as equipes, é importante garantir a máxima circulação de conhecimentos e informações. Quando se utilizam critérios como esse, não se configura necessariamente uma boa situação de trabalho. "As características pessoais podem facilitar o debate e a discussão, mas o mais importante é que as equipes sejam produtivas do ponto de vista dos conteúdos que você pretende ensinar", explica Camilla Schiavo Ritzmann, coordenadora pedagógica da Escola Santo Inácio, em São Paulo.
Todas as interações pressupõem um empenho para que o bom relacionamento prevaleça. É papel também do professor garantir que isso aconteça, criando condições para a colaboração e evitando que uns se calem ou obedeçam, enquanto outros dominam o trabalho. "De modo geral, ninguém é o tempo todo calmo, agitado, tímido ou extrovertido. Um jovem que tenha mais facilidade em Matemática tende a ser mais participativo nas aulas dessa disciplina e menos nas de outra em que não se saia tão bem", ressalta Juliana Pacheco Neto, mestranda em Metodologia do Ensino e Educação na USP e que tem nos agrupamentos um dos focos de seus estudos.
Atenta a isso, Ana Cristina Marotto, que leciona Matemática para o 4º ano no Colégio Equipe, em São Paulo, não usa as características pessoais dos alunos como critério principal para formar grupos. Em uma atividade cujo objetivo era a resolução de problemas, ela se certificou primeiro de que os quatro integrantes da equipe tivessem habilidades matemáticas distintas, verificadas durante a atividade de diagnóstico. "Só depois de garantir isso, procurei levar em conta a afinidade entre eles. O relacionamento nunca foi um empecilho para que solucionassem as questões propostas."
Janaina Oliveira Barros, Seabra, BA
Os erros não acontecem quando se tem em mente que o mais relevante para definir as formas de agrupamento é levar as crianças a avançar. Fazer um diagnóstico detalhado também é essencial para pensar nos desafios que precisam ser vencidos por elas, nas hipóteses e nos saberes que cada uma apresenta e, acima de tudo, nos progressos a promover. Alguns deles, necessitam de esforço individual. "Antes de apresentar um trabalho coletivo, é preciso avaliar se é realmente a hora de promover a troca de conhecimento ou se é melhor pedir que cada aluno faça o seu", diz Lino de Macedo, do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade da USP.
Numa atividade de Língua Portuguesa com o objetivo de reescrever um texto baseado em uma história já conhecida, a professora Vera Lúcia, da EMEF Leandro Klein, utilizou um bom critério para organizar os alunos em duplas, como se vê na ilustração no quadro acima.
Após a leitura coletiva de um conto para que todos se familiarizassem com o enredo, a professora reuniu um estudante hábil na construção de textos com coesão ao lado de um colega que tinha a ortografia na ponta da língua. "Sabia que se juntasse dois que apresentavam a mesma habilidade, eles não avançariam", explica. A estratégia funcionou: eles construíram a história juntos, discutindo o que e como escrever e se revezando no papel de escriba.
Papel do professor
Discussão sobre estratégias de cálculo
Disciplina Matemática
Objetivos Desenvolver e debater em grupos diferentes estratégias de cálculo mental
Conteúdo Cálculo mental
Critérios de agrupamento Organização ascendente, iniciando com o trabalho individual, depois em duplas (cada um apresentava uma estratégia diferente ou a mesma estratégia com resultados errados) e, por fim, em quartetos (análise da estratégia mais econômica)
Papel do professor Ana Paula Kordash observou as estratégias dos alunos e, com base nisso, fez agrupamentos ao longo da atividade. Durante o trabalho, pedia que eles explicitassem suas estratégias de cálculo
Interação entre alunos Em dupla, cada um defendeu seu ponto de vista e suas estratégias para o colega. Quando as duplas formaram um quarteto, ambas mostraram as formas de calcular para, todos juntos, estabelecerem o caminho mais preciso
5. Devo dar autonomia à classe ou intervir sempre de modo a mediar o trabalho?
Paulo Cesar dos Santos Alves, Bebedouro, SP
Dar autonomia não significa deixar de intervir. César Coll diferencia dois mecanismos de influência do educador: as situações de construção dirigida de conhecimento e as de construção colaborativa. A primeira se caracteriza pela participação coletiva da turma com a orientação docente. A segunda é marcada pela interação entre os pares. Nesse momento, no entanto, é comum ver crianças sem assistência e livres para fazer o que quiserem - o que não garante a troca de conhecimentos.
Para evitar que isso ocorra, deve-se notar que o trabalho em grupo transforma o papel tradicional do mestre, que passa a criar as condições para que a garotada tome decisões e resolva as situações-problema sem ter o processo todo dirigido. Cabe a ele definir a tarefa a ser realizada, dar instruções e sugestões de encaminhamentos, indicar materiais, explicar as regras sobre cooperação entre os participantes e fazer correções de rotas.
Na atividade em grupo, tem lugar uma troca horizontal (aluno com aluno) e não vertical (professor com aluno). Por isso, tirar uma dúvida do grupo não significa responder às perguntas, mas levar os integrantes a relacionar conhecimentos e informações que levem à resposta.
Raimunda Aurisete Lucas, Itapipoca, CE
Ajudando um a compartilhar com o outro seu modo de pensar sobre determinada situação-problema. Depois de identificar o nível de conhecimento de cada um no início de um processo de ensino, torna-se importante observar o desempenho de todos no processo e modificar a formação dos grupos conforme a necessidade. Esse cuidado é essencial para garantir a atenção e a vontade de contribuir. Além disso, as atividades devem estar de acordo com os níveis de aprendizagem: nem muito fáceis nem muito complicadas.
Simone Santos da Fonseca, que leciona para uma classe em fase de alfabetização na EMEF Manuel Egídio, em Bonito, a 515 quilômetros de Salvador, comprovou como é produtivo aproveitar bem a heterogeneidade. Em uma atividade de escrita, ela formou duplas com o seguinte critério: uma criança com hipótese silábica com valor sonoro (que representa cada sílaba por uma letra que expressa o som correspondente) e outra com escrita silábica sem valor sonoro. Em seguida, ela distribuiu alfabetos móveis e pediu que com eles as duplas escrevessem a parlenda "Rei, capitão, soldado, ladrão, moça bonita do meu coração". Os integrantes se revezavam na escrita. Quando o primeiro fazia uma escolha considerada errada, o outro explicava que aquela letra não servia e apontava opções. Juntos, os dois alunos refletiram sobre o sistema de escrita e aprenderam.
Paulo Victor Oliveira, São Paulo, SP
Sim. Segundo a educadora argentina Delia Lerner, da Faculdade de Educação da Universidade de Buenos Aires, a articulação do trabalho de grupo e individual se dá em processos complementares: um ascendente e outro descendente.
No primeiro, a produção individual ou de duplas é o ponto de partida para o processo de aprendizagem, que em seguida é discutido em grupos maiores e, enfim, compartilhado por toda a turma. A professora Ana Paula, da EMEF Leandro Klein, conduziu uma atividade de cálculo mental obedecendo a esse tipo de organização. A intenção dela era que as crianças debatessem, em grupo, diferentes estratégias e chegassem à solução com menos margem de erro. Para isso, o primeiro passo foi propor que resolvessem os problemas individualmente. Assim, ela verificou que tipos de resolução eram utilizados e, com base nisso, formou duplas com ideias distintas. Em seguida, foi a vez de reunir duas duplas novamente com estratégias diferentes e pedir que cada par mostrasse ao outro seu pensamento e elegesse o menos trabalhoso. Além de notar quais agrupamentos eram mais produtivos, Ana Paula avaliou o trabalho o tempo todo, verificando se havia erros e indicando possíveis caminhos.
O modo de organização descendente, por sua vez, começa com o trabalho coletivo e termina no individual ou em dupla. Ele se aplica preferencialmente quando já se sabe que a dificuldade imposta pela tarefa é grande e que, sozinho, ninguém vai conseguir realizá-la. Um exemplo é a leitura de textos mais complexos. O professor faz a leitura para todos, de modo coletivo, para discutir questões pontuais que facilitem a compreensão.
Ida Maria Fanchini, Franco da Rocha, SP
Sim, desde que haja um objetivo geral e comum a todos os grupos. Essa situação se justifica, por exemplo, no caso em que é preciso variar o grau de desafio da proposta para melhor atender à diversidade da classe. Maria Lúcia Castanheira, vice-diretora do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, diz que quando cada equipe tem uma tarefa, o professor deve planejar bem cada uma delas. "Isso demanda mais tempo do que se todos tivessem o mesmo desafio e inclui orientar o que cada grupo fará e ressaltar a importância de se cumprirem os objetivos específicos e os gerais."
Também é essencial prever as necessidades de cada grupo no desenvolvimento das tarefas e pensar nas intervenções a fazer, já que elas serão mais diversas que de costume. Para garantir a unidade, uma ideia interessante é realizar um projeto em que o trabalho de cada grupo sirva de base para a construção de outro, da sala inteira (um seminário, por exemplo, reunindo o resultado dos diferentes trabalhos realizados pelas equipes em um novo conhecimento partilhado e construído coletivamente).
Interação entre alunos
Pesquisa e escrita de texto sobre rios
Disciplina Geografia
Objetivo Redigir um texto informativo sobre um dos rios do estado de São Paulo
Conteúdo Bacia hidrográfica
Critérios de agrupamento Duplas que iriam pesquisar diferentes informações sobre o mesmo conteúdo
Papel do professor Vera Lúcia Guastapaglia indicou a bibliografia e os sites a serem pesquisados e orientou a seleção das informações mais importantes. Durante a redação do texto, garantiu que os dois alunos participassem e se revezassem na função de escriba
Interação entre alunos Cada dupla escolheu o rio que gostaria de conhecer e definiu o que ambos iriam pesquisar em casa. Em classe, os dois selecionaram os dados mais relevantes e, com base neles, redigiram um texto relacionando as informações pesquisadas
9. Como evitar que alguns alunos fiquem ociosos?
Mariliana Costa, Fortaleza, CE
Oriente os estudantes para que não atribuam a responsabilidade de realizar as tarefas a apenas um integrante da equipe ou que as dividam - o que impede que interajam. Isso não significa que todos os membros da equipe devam contribuir da mesma maneira. Para perceber se a troca de informações está sendo feita de forma desejável, o professor necessita acompanhar o trabalho e identificar as dificuldades. Outra ajuda é definir a atuação de cada um. Por fim, caso perceba que um deles não está produzindo porque tem um nível muito diferente do apresentado pelos demais - por um erro de diagnóstico -, a saída é reagrupar.
Num trabalho de Geografia proposto pela professora Vera, da EMEF Leandro Klein, as crianças foram reunidas em duplas após uma aula expositiva sobre a hidrografia do estado de São Paulo. A primeira tarefa foi escolher um rio paulista e pesquisar sobre ele, destacando os dados mais relevantes. Com as informações em mãos, elas se dedicaram à escrita de um texto sobre o assunto. Como era preciso discutir o tempo todo para definir quais seriam os dados principais e de que forma construiriam o texto - sem a interferência direta da professora -, nenhuma das duas ficou ociosa durante o trabalho.
Maria Lúcia Monteiro, São Paulo, SP
Se realmente há quem faça tudo ou não faça nada, os pais têm razão. Quando eles estavam na escola, provavelmente esse tipo de atividade não envolvia a interação, mas a divisão de tarefas. Nesse caso, o trabalho acaba sendo feito individualmente, e as produções reunidas antes da entrega, sem construção coletiva de conhecimento nem orientação do professor.
Alda Luiza Carlini, que leciona Didática na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, exemplifica a situação no caso de um trabalho de Ciências. "Quando o educador passa um roteiro pedindo o nome de frutas e as vitaminas que elas contêm, provavelmente as crianças dividem as funções e cada uma procura um dos itens. Isso não é trabalho coletivo." O melhor, nesse caso, é apresentar uma situação-problema: por que é importante comer frutas? "Dessa forma, o conhecimento é construído por meio da pesquisa e do debate entre as crianças."
Se o professor já tem uma atividade planejada e considera o nível de conhecimento da garotada sobre o conteúdo, acompanha e avalia o trabalho, provavelmente está promovendo um agrupamento produtivo. Cabe a ele mostrar as vantagens desse tipo de estratégia didática aos pais que reclamarem.
Alessandra Neroni Riul, Franca, SP
As crianças aprendem a se concentrar em uma só atividade quando ficam mais tempo fazendo aquilo em que estão interessadas e têm acesso a temas instigantes e adequados para a faixa etária delas. "A dispersão não é só uma questão de maturação biológica. É também de aprendizagem", explica Maria Virgínia Gastaldi, formadora de professores do Instituto Avisa Lá, em São Paulo. "Trabalhar em grupo é a melhor forma de aprender a trabalhar dessa forma."
A organização do espaço é um meio de favorecer esses agrupamentos. Em vez de manter a sala com carteiras enfileiradas, é mais adequado montar ambientes diversos e voltados a uma quantidade menor de crianças nos chamados cantos de aprendizagem.
São exemplos os cantos de leitura, de jogos no computador, de faz-de-conta, de consultório médico, de supermercado, de escritório e de salão de cabeleireiro. Dessa maneira, eles se reúnem por interesses, preferências e gostos, ao mesmo tempo em que aprendem a lidar com conflitos. Assim, têm a oportunidade de desenvolver o relacionamento interpessoal sem o controle direto do professor, a quem cabe selecionar e organizar os materiais, como fantasias e objetos diversos, para contribuir no enriquecimento dos papéis de faz-de-conta, demonstrar as regras das brincadeiras e ajudar quando uma criança não consegue, por exemplo, resolver um jogo de encaixe sozinha ou com a ajuda dos amigos.
Os pequenos da creche e da pré-escola precisam de espaço para mostrar suas vontades, pois é esse o momento de começar a desenvolver a identidade e a autonomia. Por isso, nessa fase, é importante que eles sejam levados a variar as atividades praticadas e a buscar novos desafios. Por exemplo, experimentando um novo canto. "O ideal é que o professor não regule tão estritamente o ritmo das atividades. As crianças sempre fazem suas escolhas respeitando as opções planejadas e as condições estipuladas", argumenta Maria Virgínia.
Eulália Antunes, São Bernardo do Campo, SP
Vale esclarecer que ter um papel não significa ter uma tarefa e dar conta dela sozinho. A criança precisa saber qual é a sua função no grupo - definida de acordo com o que precisa aprender ou ensinar -, e desempenhá-la com a ajuda dos demais.
O psicólogo e filólogo espanhol Joan Bonals diz no livro O Trabalho em Pequenos Grupos na Sala de Aula que as questões atitudinais no trabalho em grupo devem ser vistas como um conteúdo em si. De acordo com ele, para que a atividade seja produtiva, é essencial que os alunos tenham reforçado o que chama de papéis positivos, como propor ideias, avaliar, manter o foco, coordenar e conciliar. Por outro lado, os papéis negativos precisam ser neutralizados. São eles os de quem se retrai, brinca demais, chama a atenção para si, agride, domina e compete. Sem levar em conta a questão atitudinal, não há como obter sucesso na aprendizagem conceitual.
Laísa Martins Rodrigues Pereira, Jacareí, SP
Aquelas que eles dão conta de realizar por meio da troca de saberes com os colegas, com pouca interferência do professor. Cindy Siqueira, professora da EMEF Professor Anézio Cabral, em Osasco, na Grande São Paulo, propôs um trabalho de Educação Física para a 3ª série em que todos interagiram de forma autônoma. Para que eles aprendessem jogos comuns no bairro, ela selecionou os preferidos e uniu quem sabia a forma de brincar com quem não a conhecia. Com pouca interferência dela, todos aprenderam com os colegas e ensinaram a eles.
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Colégio Equipe, R. Bento Frias, 223, 05423-050, São Paulo, SP, tel. (11) 3579-9150
EMEF Leandro Klein, R. Prestes Maia, 100, 09572-690, São Caetano do Sul, SP, tel. (11) 4232-6023
EMEF Manuel Egídio, Pça. Egídio Cruz, s/nº, 46820-000, Bonito, BA
EMEF Professor Anézio Cabral, R. Venezuela, 155, 06033-220, Osasco, SP, tel. (11) 3609-6183
Heloisa Helena Garcia
Juliana Pacheco Neto
Lino de Macedo
Maria Lúcia Castanheira
Maria Virgínia Gastaldi
Priscila Monteiro
BIBLIOGRAFIA
A Formação Social da Mente, Lev Vigotski, 224 págs., Ed. Martins Fontes, tel. (11) 3241-3677, 39,80 reais
Aprendizagem Escolar e Construção do Conhecimento, César Coll, 160 págs., Ed. Artmed, tel. 0800-703-3444, 48 reais
Desenvolvimento da Inteligência e Interacção Social, Anne Nelly Perret-Clermont, 414 págs., Ed. Instituto Piaget, tel. (51) 3371-3383, 71,70 reais
O Trabalho em Pequenos Grupos na Sala de Aula, Joan Bonals, 184 págs., Ed. Artmed (edição esgotada)
INTERNET
Neste site, textos sobre interação produzidos na Universidade de Barcelona (em espanhol)
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