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Crianças indígenas de ontem e hoje

Comparar o modo de viver de diferentes povos em épocas distintas é uma maneira eficiente de discutir a diversidade

POR:
Bruna Nicolielo
Entre o povo kamayurá, no Norte do Brasil, as ocas eram construídas com estruturas de madeira e taquara, além da cobertura de palha. Elas não têm divisão interna e servem de moradia para várias famílias. Hoje, estas habitações continuam a existir nas aldeias. Foto: Renato Soares
MODOS DE VIVER Entre o povo kamayurá, no Norte do Brasil, as ocas eram construídas com estruturas de madeira e taquara, além da cobertura de palha. Elas não têm divisão interna e servem de moradia para várias famílias. Hoje, estas habitações continuam a existir nas aldeias.

Propor um estudo sobre crianças indígenas do passado e do presente é uma forma de aproximar as turmas dos anos iniciais do Ensino Fundamental de um dos conteúdos da disciplina: a história dos índios do Brasil. Essa abordagem é resultado de uma pesquisa desenvolvida nos Estados Unidos e que foi publicada no livro Connecting Children with Children - Past and Present (Conectando Crianças com Crianças: Passado e Presente, ainda sem tradução no Brasil). "Com esse recorte, trazemos o modo de vida das crianças indígenas de outras épocas para os dias de hoje", explica a historiadora Maria Auxiliadora Schmidt, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Essa proposta de trabalho tem outro benefício: romper com as generalizações que ignoram as características dos 230 diferentes povos que habitam o Brasil (leia o quadro abaixo). Hoje, há 500 mil índios no país, segundo um levantamento da Fundação Nacional do Índio (Funai) de 2011. Eles formam um conjunto diverso: há os que vivem isolados ou mantendo pouco contato com outros povos e os que estão integrados ao restante da população brasileira. Nesse segundo grupo, o cotidiano não segue um padrão, pois eles vivem realidades diferentes. Alguns frequentam escolas indígenas e aprendem o português como Língua Estrangeira. Outros fogem da falta de terra e da pobreza do campo, migrando para as periferias de grandes cidades. Há ainda etnias que cultivam brincadeiras típicas, embora tenham abandonado os adornos tradicionais. Uma realidade multifacetada que a escola precisa problematizar.

É importante reforçar para os alunos que a imagem do selvagem de cocar e penas, cristalizada no imaginário de muitos, não corresponde à realidade. "Ela já não explica a complexidade de situações que atualmente envolvem os modos de ser indígena e precisa ser repensada", diz o antropólogo Florêncio Almeida Vaz Filho, docente da Universidade Federal do Pará (UFPA).

Os erros mais comuns

- Trabalhar temas da cultura indígena em datas pontuais, como o Dia do Índio. A história dos índios não pode ser tratada só em efemérides, com ênfase em aspectos exóticos ou como uma curiosidade. 

- Encarar as etnias indígenas como um todo homogêneo, descontextualizadas de seu tempo histórico. Tal abordagem reforça estereótipos e idealizações. A diversidade das populações indígenas e os conceitos de sua história devem ser debatidos.

Nas bancas

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=== PARTE 2 ====

Enfocar a diversidade para debater a identidade

Modos de vestir. Foto: Geraldo Guimarães
Modos de vestir. Foto: Renato Soares
Modos de vestir Diferentemente de suas habitações, que pouco mudaram, os hábitos de vestir dos kamayurás, registrados na imagem de 1976, sofreram a influência do homem branco. Hoje, as roupas usadas pelas crianças para se proteger do frio coexistem com o uso de adornos tradicionais, como pinturas e colares, exibidos por seus pais.

Um bom ponto de partida para a atividade é selecionar fotos antigas e recentes (veja os exemplos nesta página e na anterior). Essas imagens podem ser encontradas em sites de busca e em órgãos como a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Museu do Índio e o Instituto Socioambiental (ISA).

É possível escolher imagens que retratem grupos que habitam ou habitaram a região próxima à da escola e também as de locais distantes. "É preciso, nesse caso, criar pontos de contato entre aquela realidade e a dos estudantes", diz Maria Auxiliadora. Uma opção é escolher uma comunidade que tenha migrado de um estado para outro ou saído da zona rural para um centro urbano.

Ao apresentar as imagens à turma, lance perguntas como: "O que elas mostram?", "São da mesma época?", "Retratam crianças parecidas com vocês?". Anote o que é dito no quadro ou num cartaz. Em seguida, leve a criançada a comparar peculiaridades culturais - vestimentas, brincadeiras, alimentação e rituais, por exemplo - de uma ou mais comunidades com a dos estudantes no passado e nos dias de hoje. Depois da discussão, a turma pode ser dividida em duplas para sistematizar no caderno as questões debatidas com os colegas.

Vale apresentar outros documentos históricos pertinentes ao estudo. Reportagens e textos literários e informativos, além do acervo de museus locais dedicados à questão indígena, entram nessa categoria. "A diversidade de materiais e fontes históricas ajuda a turma a estabelecer correlações entre sua realidade e a de crianças indígenas", afirma Juliano Custódio Sobrinho, selecionador do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10.

Professores de escolas indígenas também podem propor a comparação de crianças de diferentes épocas. Nesse caso, o recomendado é adotar os mesmos procedimentos, estimulando que os alunos estudem sobre o passado da etnia à qual pertencem e estabeleçam correlações entre ela, outros povos e outros grupos étnicos. Atividades de história oral, como a realização de entrevistas, são uma boa alternativa para aprofundar o tema. "Depois de verem fotos e lerem textos, as crianças podem ser preparadas para sair a campo, entrevistando as pessoas mais velhas da aldeia", explica o historiador José Giovani Silva, professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). Quando lecionou para crianças da etnia kadiwéu, numa reserva no Pantanal mato-grossense, ele fez uma atividade desse tipo, com foco no surgimento e na história do povo. "No fim do trabalho, os estudantes tinham uma nova percepção de sua história", relata Silva.

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