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Educação Ambiental: como trabalhar a temática da água de forma prática e engajar os alunos

Abordagem deve ser interdisciplinar, dialogar com a realidade dos estudantes e ter foco no uso sustentável desse recurso natural

POR:
Ingrid Yurie
Crédito:  Tayná Marques/NOVA ESCOLA

As mudanças climáticas, o desmatamento, a poluição de rios e oceanos e a redução da biodiversidade são alguns dos principais problemas socioambientais do nosso tempo. Para formar cidadãos conscientes de seu papel na preservação dos recursos naturais do planeta, que desde cedo tenham hábitos e atitudes sustentáveis e, no futuro, possam estender esse olhar para suas ações e decisões pessoais e profissionais, é fundamental garantir uma Educação Ambiental nas escolas. 

É mais efetivo e simples conscientizar as crianças, que estão formando as práticas e os valores que vão carregar pelo resto da vida, do que trabalhar com sujeitos que já têm hábitos arraigados ao seu cotidiano”, destaca Denise Conselheiro, gerente de Educação do Instituto Akatu, organização que trabalha pela conscientização e a mobilização da sociedade para o consumo responsável. 

A Educação Ambiental na escola está prevista pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), pela Lei nº 9.795/1999, pelo Parecer CNE/CP nº 14/2012 e pela Resolução CNE/CP nº 2/2012. Os documentos preveem a formação dos estudantes em temáticas ligadas à natureza em seus aspectos sociais, econômicos, comunitários e ambientais. 

Essas aprendizagens devem acontecer desde o início da escolarização, durante o ano todo, contextualizadas com o território e a realidade dos alunos e, principalmente, de forma interdisciplinar. “Essa é a chave para formar cidadãos que compreendam, por exemplo, que a poluição do Rio Doce pelo rompimento da barragem de Mariana (MG) traz impactos ambientais e também na qualidade de vida, como o aumento de casos de febre amarela nas comunidades e a impossibilidade de pesca na região”, diz Márcio Martins, professor de Geografia da rede particular do interior de São Paulo e palestrante sobre Educação Ambiental em escolas públicas. 

A Educação Ambiental demanda a compreensão integral das questões ligadas à natureza, o que contribui para entender o que cada um pode fazer de significativo ao seu redor”, completa o professor.

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A questão da água: bem coletivo e a responsabilidade de cada um

Na Educação Ambiental, o estudo da água ocupa um lugar central. Além de ser a base de todas as formas de vida e estar presente no cotidiano das crianças, é algo que elas identificam mais facilmente como uma questão ambiental concreta e, assim, podem tomar ações individuais para contribuir para a sua preservação. É urgente formar cidadãos que lidem com a água como recurso escasso e que precisa ser usado com consciência para que todos possam ter qualidade de vida, afirma Denise. 

A especialista recomenda abordar o tema da água sob uma perspectiva prática. Primeiro, chamando a atenção para a sua presença no dia a dia, considerando a água visível – aquela que sai da torneira – e a invisível ou virtual – a utilizada no processo de produção de objetos e alimentos. Para saber mais sobre o assunto, baixe gratuitamente o infográfico nos botões abaixo. 

Depois, a turma pode ir a campo para explorar os recursos hídricos nas redondezas ou estações de tratamento e identificar e mudar hábitos que não são sustentáveis. Outra dica é aproveitar os recursos digitais para engajar a turma. Por exemplo, no site Edukatu, do Instituto Akatu, há atividades e jogos gratuitos, e a plataforma Tamanduá Edu traz uma seleção de filmes sobre o assunto que podem ser trabalhados com os estudantes. Já o Google Earth permite visualizar mapas de rios de diferentes regiões. Outra sugestão é criar um grupo de “fiscais do desperdício” na escola. 

É importante que as pessoas conheçam o seu papel individual na gestão da água enquanto bem coletivo, que não é só responsabilidade do estado, do município e do nosso modelo produtivo. Também diz respeito à forma como consumimos a água, compramos objetos e desperdiçamos alimentos”, explica Denise. 

Enquanto uma questão coletiva, também é fundamental envolver a comunidade e a família nas discussões da escola. Sempre há alguém que aplica soluções criativas e práticas para economizar água e pode compartilhar sua experiência. E as crianças, estudando o tema, também têm muito a ensinar. 

Aprendendo esses hábitos desde cedo, os estudantes podem romper com padrões antigos e se tornar exemplos para outras pessoas, difundindo em nossa sociedade valores de sustentabilidade”, salienta o professor Márcio. “É assim que se preserva a água e se constrói um meio ambiente melhor, com um trabalho de formiguinha”, complementa o educador, que também é o criador do Projeto Pedalágua, criado para incentivar a preservação do recurso. 

Temas que podem ser explorados

A questão da água está presente durante todo o ano e em praticamente todas as atividades que Natália Teixeira, professora dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental na rede particular de Ouro Preto (MG), realiza com suas turmas. Ela ressalta que abordar o assunto do aspecto macro para o micro facilita a compreensão dos estudantes. 

Quando chegamos perto de suas realidade, estamos a um passo de desenvolver na prática projetos que impactam as suas vidas e contribuem para a preservação da água”, afirma a professora, que também leciona no curso de Pedagogia da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). 

A educadora indica alguns tópicos que podem ser abordados com as turmas dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: 

No mundo:

- a quantidade de água existente na Terra e quanto dela é potável;

- os diferentes usos que os países fazem do recurso;

- a escassez de água ao redor do planeta 

No Brasil:

- a distribuição da água em nosso território;

- os usos que diferentes populações fazem dela;

- a importância mundial que o país ocupa em relação ao recurso;

- a relação com os biomas e a preservação da vegetação e do solo;

- saneamento básico;

- fontes poluentes;

- a relação entre desastres ambientais e o planejamento e a estrutura das cidades;

- geração de energia e seus impactos para as comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas.

Na cidade e no bairro:

- o percurso da água até a torneira;

- recursos hídricos da região;

- instituições que trabalham pela preservação da água;

- problemas do território relacionados ao recurso, como saneamento, poluição, falta d’água e racionamento. 

No dia a dia

- a utilização da água no cotidiano, seja de forma direta ou indireta;

- estratégias de economia e uso consciente da água.

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Investigações a partir dos interesses da turma

Mônica Felismino, professora na EM Doutor Isidoro Boucault, em Mogi das Cruzes (SP), aproveitou as dúvidas e curiosidades da sua turma do 5º ano do Ensino Fundamental para aprofundar os estudos sobre a água. Ela conta que, em 2018, estava estudando com os alunos os recursos hídricos existentes nos arredores da escola. Juntos, exploraram um mapa de rios, fontes e nascentes do território e foram a campo estudar um lago e a porção do rio Tietê que corta a cidade. 

Durante as investigações, um estudante encontrou e compartilhou com o grupo uma notícia sobre a empresa municipal que faz o tratamento da água. Isso disparou uma série de perguntas dos alunos, como “por que aqui é diferente?” e “como conseguem limpar a água?”. Foi então que as crianças decidiram que era preciso visitar o local. 

A professora agendou uma data, e a turma conheceu todo o percurso de captação da água até a sua distribuição nas casas. “A partir disso, o estudo de recursos hídricos mudou completamente. Eles ficaram tão encantados com todo o processo de tratamento da água que isso começou a invadir todas as disciplinas, e eu nem tive como mudar de assunto”, lembra a professora Mônica.  

Em Língua Portuguesa, os alunos elaboraram textos a respeito do tema, como um relato sobre a visita, e um glossário dos componentes químicos usados no processo. Em Matemática, calcularam volumes e proporções, compararam unidades de medida e fizeram a leitura de uma conta de água. Também estudaram rios, afluentes e área de mananciais em Geografia. Em Arte, pesquisaram obras com cenários com água nos cinco continentes. A turma também produziu uma miniestação de tratamento de água com materiais recicláveis e maquetes sobre quatro questões climáticas: efeito estufa, chuva ácida, desertificação e poluição dos rios. 

As crianças propuseram ainda uma feira de ciências sobre a água, e cada grupo decidiu o tema que abordaria. Um dos grupos, por exemplo, descobriu e estudou um fenômeno incomum na cidade: um rio que “sobe a serra”, ascendendo oito graus. Outro criou um microscópio caseiro para observar os microrganismos presentes na água do lago. Houve até campanha nas redes sociais pela preservação das áreas verdes da cidade convidando a comunidade a fotografar a vegetação e plantas que as pessoas encontrassem pelo caminho e depois publicar a foto nas redes sociais com a hashtag #MogiDasÁrvores. 

“O tratamento da água estava no currículo, mas foram eles que escolheram como queriam aprender sobre o tema – na prática, no território. Isso engajou a turma e fez com que eles aprendessem tanto. A coragem de ouvir as crianças vale a pena”, instiga a professora. 

Conscientização ambiental na prática

Outra educadora que trabalha o tema de forma “mão na massa” é Gláucia Buzato, que leciona para o 1º ano do Ensino Fundamental na EMEF Ricardo Puccetti, na zona rural de Capela do Alto (SP). Sua grande ferramenta pedagógica é uma horta. 

Em torno dela, as crianças plantam e regam enquanto aprendem sobre a importância da água. Na hora de adubar e proteger as plantas, falam sobre os adubos naturais que estão utilizando. “Uma delas lembrou dos peixes mortos que viu em um riacho atrás de uma grande horta perto de sua casa. Isso me deu a oportunidade de falar sobre os problemas dos defensivos agrícolas e a poluição dos recursos hídricos”, destaca a professora. 

A horta oferece ainda a possibilidade de as crianças se perceberem enquanto uma pequena comunidade que precisa usar e cuidar desse espaço de forma a garantir sua existência – o que é muito parecido com os cuidados que devemos ter com a água. 

Em outro momento, os alunos plantaram árvores na rua da escola, conversaram sobre o ciclo hídrico e conheceram criadouros de mosquito da dengue, estudando a questão e sua relação com a água. Decidiram, então, desenvolver panfletos para serem foram distribuídos na comunidade. 

“Dessa maneira, eles aprendem na prática sobre questões ambientais, sabendo que preservar a água e a natureza depende da tomada de ações. É um caminho para a conscientização ambiental e o desenvolvimento do conhecimento científico”, afirma a professora Gláucia.

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