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Como gestores escolares podem incentivar boas práticas em suas escolas

É na sala de aula que a relação ensino-aprendizagem encontra toda sua potência; assim, o foco da gestão deve ser criar um ambiente que potencialize as iniciativas dos docentes

POR:
José Marcos Couto Júnior
Foto: Getty Images

Se você é professor e faz parte de qualquer grupo de WhatsApp, muito provavelmente já se deparou com um vídeo do Diogo Almeida. Nos últimos anos, o jornalista e humorista tem ganhado notoriedade em diversas mídias sociais e acumulado milhares de fãs – só o seu canal no YouTube, Vida de Professor, conta com mais de 560 mil inscritos. 

Correções de prova fora do horário de trabalho, a necessidade constante de planejar aulas e projetos, os combinados com os alunos, o amor pelo EVA, o ódio pelo diário escolar… Tudo isso faz parte do conteúdo produzido pelo comediante, que já atuou como professor e coordenador pedagógico. Em meio às piadas, que se relacionam com o cansaço e mesmo com o desgaste da docência, é interessante notar outro ponto: seus vídeos reafirmam o amor e o prazer dos professores em relação ao magistério. Um sentimento que faz parte de nós, não é mesmo?

Falo isso com ainda mais propriedade porque, entre março de 2019 e abril de 2022, atuei exclusivamente como gestor da EM Professora Ivone Nunes Ferreira, aqui no Rio de Janeiro (RJ), experiência que baliza as reflexões que trago mensalmente por aqui. No entanto, algumas conjunturas me fizeram retornar ao PEJA, como é conhecida a modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA) aqui na cidade, à noite.

Longe de mim querer glamourizar esses meus três turnos de trabalho atuais, mas percebi que, desde que voltei a lecionar, me sinto como nas esquetes do Diogo: acabado e feliz. Eu realmente estava morrendo de saudade da sala de aula (ambiente em que estive por dez anos antes de assumir a direção da Ivone) porque é nela que a “magia” acontece. E é com esse sentimento que eu quis trazer para este espaço uma análise sobre como nós, que atuamos na gestão, podemos impulsionar os professores para que essa “magia” ocorra constantemente em toda a nossa escola.

Boas ideias surgem na sala de aula

É fato que estar na direção nos permite dialogar com diversos segmentos, facilitando ações que terão impacto em toda a comunidade. Porém, é o contato diário com as turmas que possibilita acompanhar o desenvolvimento e a formação de crianças e jovens de forma efetiva.

Não à toa e por diversas vezes, as melhores práticas, os projetos mais adequados à realidade e as propostas mais significativas saem justamente da sala de aula, da cabeça dos professores regentes. Foi assim comigo entre 2016 e 2018, quando lecionava na EM Áttila Nunes: dialogando com outros professores, desenvolvi o projeto As Caravanas: Limites da Visibilidade. Sem institucionalizar, ou depender de uma estrutura central como a coordenação pedagógica ou a direção, essa foi uma ação que saiu de lá, do chão da escola, e que trouxe diversos aprendizados e marcou a vida dos meus alunos e a minha – e ainda me levou à conquista do Prêmio Educador Nota 10 e Educador do Ano de 2018.

Então, se cotidianamente os docentes estão impactando os alunos com ideias diferenciadas e aulas significativas, onde entra a gestão nessa equação? De volta ao meu exemplo pessoal: esse projeto consistia em um conjunto de aulas como as que sempre dei. Só que, à medida que a Patrícia, a Leila e a Conceição – respectivamente, diretora, diretora-adjunta e coordenadora pedagógica da escola – passaram a abraçar as propostas que eu levava para elas, a iniciativa foi ganhando mais e mais proporção.

Por isso, falando agora de um lugar também de gestor escolar, respondo que, em primeiro lugar, nossa maior ajuda no que diz respeito a estimular as práticas transformadoras em nossas escolas é: não atrapalhar.

Como apoiar as ações dos seus educadores? 

Amiga leitora e amigo leitor, quem me acompanha aqui há mais tempo sabe o quanto milito pela participação ativa de gestores nas práticas pedagógicas da escola. Porém, se tem algo que posso afirmar sobre o tempo em que estive somente em sala de aula, é que nunca fui “atrapalhado” ou “podado” por um coordenador pedagógico ou um diretor. Foi isso que viabilizou a minha prática e os meus projetos.

Entretanto, se você que me lê por aqui entende que “atrapalhar” é um verbo muito pesado, podemos adaptar para termos mais apropriados: o que precisamos, enquanto gestão escolar, é de uma “escuta efetivamente ativa”. Assim, como premissa, temos de saber que não há problema algum (especialmente nesta retomada para o segundo semestre) em readequar planejamentos anuais diante de boas ideias vindas da sala de aula.

Diretores e coordenadores pedagógicos, por mais brilhantes que sejam, só têm a ganhar quando constroem coletivamente as ações de uma unidade escolar – gestão democrática também é isso. É algo que passa por compreender que a escola é viva e mutável, portanto, não devemos desestimular um projeto simplesmente porque ele não se adequa a um planejamento específico.

“Não atrapalhar”, no entanto, não é necessariamente o último estágio desse processo. Caso alcancemos um nível de escuta e diálogo que nos permita dar subsídios às boas práticas dos nossos professores com as suas turmas, a tendência é amplificá-las para toda a equipe, a ponto de se tornarem exemplos a serem seguidos.

Dessa forma, para consolidar essas iniciativas docentes, sugiro ações como: investir pontualmente em um material adequado e/ou diferenciado; buscar parcerias que permitam a realização de propostas; modificar a grade, caso seja necessário; e dar voz e espaço para que os professores desenvolvam plenamente as suas ideias. Todas essas são atitudes simples, porém com um potencial imenso para modificar a realidade, primeiramente de uma turma, e talvez, mais adiante, de toda uma comunidade.

A criação de um ambiente que incentive ao invés de inviabilizar boas práticas pode ser o diferencial entre uma escola comum e a melhor escola possível dentro da sua realidade.

Um forte abraço e até a próxima, 

José Couto Júnior é licenciado em História, tem mestrado em Educação pela Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e é doutorando em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Em 2018, foi eleito Educador do Ano no Prêmio Educador Nota 10. Servidor da Prefeitura do Rio de Janeiro há 10 anos, atua desde 2019 como diretor na EM Professora Ivone Nunes Ferreira, no Rio de Janeiro (RJ).

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