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Educadores contam o que aprendem com seus pares

Confira depoimentos de docentes que se inspiram nas qualidades de mestres do passado e na parceria com colegas do presente para aprimorar sua prática

POR:
Carol Firmino
A professora Rosalina de Lázaro com seus alunos na EE José dos Santos, em Aspásia (SP). Foto: Fernando Graf/NOVA ESCOLA

Entre as célebres frases do professor e escritor brasileiro Augusto Cury, há uma que diz: “Professores brilhantes ensinam para uma profissão. Professores fascinantes ensinam para a vida”. É fato que, entre brilhantes e fascinantes, muitos se tornam inesquecíveis na trajetória de seus alunos, principalmente daqueles que resolveram seguir o mesmo caminho, isto é, a carreira docente.

Todo outubro, mês dos professores, essas histórias ganham os holofotes na mídia e trazem a oportunidade de não só refletir e debater sobre a prática docente, mas também de compartilhar os aprendizados e as memórias afetivas que os professores carregam consigo. Afinal, é comum reconhecer na própria prática as marcas deixadas pelos grandes mestres.

Com 36 anos de trabalho dedicados à educação pública, Rosalina de Lázaro, especialista em Treinamento Desportivo e Educação para a Diversidade Étnico-Racial e professora de Educação Física na EE José dos Santos, em Aspásia (SP), não esquece daqueles que moldaram sua experiência em sala de aula. “No Ensino Fundamental, tive uma professora chamada Alzira. Ela lecionava Educação Física e sempre se apresentava com uma alegria contagiante. Como eu gostava muito de ginástica rítmica e atletismo, o sorriso aberto dela, a aparência saudável e o porte de ginasta me faziam sonhar ir para as Olímpiadas”, lembra.

O encanto de quem estava conhecendo os próprios sonhos foi reforçado ainda pela figura do professor de música. Foi ele, conta Rosalina, quem lhe revelou um dos principais valores da vivência docente: o despertar da imaginação. “Ele ensinava as notas musicais e nos dava oportunidade para criar. Com ele, aprendi a fazer música com materiais recicláveis. Lembro até que montamos um grupo de samba e nos apresentamos na escola”, rememora.

É um legado que Rosinha, como é chamada carinhosamente pelos alunos, mantém vivo até hoje, ao sugerir a realização da mesma atividade nos ambientes educacionais por onde passa. “Esse professor encantava pela criatividade, pela liberdade que oferecia”, conta a professora.

Por fim, o jeito firme e decidido, porém amável, que Rosalina encontrou em sua professora de ginástica na universidade completa essa tríade de inspiração que a move em sua prática. Dessa professora, ela leva o entendimento de que, frente às turmas, é preciso saber o que dizer a respeito do conteúdo e demonstrar confiança, mas também ter empatia para entender o aluno. “O educador que marca a vida da gente é aquele que olha nos olhos, que percebe o esforço do aluno, que valoriza seus pequenos avanços. Procuro compreender e conhecer as potencialidades e fragilidades de cada um para poder ajudá-los”, diz.

Protagonismo e ensino contextualizado

Tâmila Tavares, alfabetizadora por dez anos no município de Tartarugalzinho (AP) e professora da rede municipal de Macapá, capital do estado, conta que sua vida foi marcada por educadores que tentaram fazer com que ela mostrasse o seu melhor como aluna. “No 1º ano do Ensino Médio, a professora Ana fez com que eu me apaixonasse pelo mundo das Letras e escolhesse a minha profissão. Ela apresentava muitos textos literários e levava autores que, apesar de serem difíceis, se tornavam uma leitura gostosa”, diz a amapaense, relembrando em especial uma atividade feita a partir da leitura do livro Ensaio Sobre a Cegueira, do português José Saramago, que a desafiou a debater o contexto da obra e do autor.

Por meio dessas propostas, diz Tâmila, a professora Ana aproximava os alunos e valorizava suas impressões. “Ela sempre conseguia estar presente, se envolver, perguntar sobre desafios dentro e fora da sala de aula, fazer o estudante perceber que existia alguém com quem conversar”, conta.

Essas características influenciam sua prática até hoje. Em seu cotidiano, ela procura se espelhar nesse exercício de compreensão e considerar as dificuldades dos alunos e suas famílias, principalmente daqueles em situação de maior vulnerabilidade social, como no caso de sua passagem por Tartarugalzinho, onde lecionou para os filhos dos pescadores da região.

Alunos na aula de Educação Física da professora Rosinha. Foto: Fernando Graf/NOVA ESCOLA

Tâmila também relembra a questão do protagonismo do aluno, que no passado não era visto como uma prioridade, mas que hoje felizmente se faz mais presente na prática dos educadores. “Ser protagonista melhorava a autoestima, mostrava que éramos capazes de sair da escola e promover uma mudança social. É o que tento transmitir aos meus alunos. Essa ideia está presente em todos os meus planejamentos”, declara.

Ainda sobre as diferenças entre a prática docente de antes para a de agora, Rosalina acredita que foram muitos os avanços. “Na minha época, os professores usavam métodos tradicionais: os alunos tinham de estar alinhados em fileiras, obedecer sempre, e não havia a oportunidade de falar, de dar opinião sobre coisa alguma. O professor era o detentor do conhecimento e nunca era questionado”, lembra a professora de Educação Física da EE José dos Santos.

Hoje, no entanto, ela vê novas possibilidades e novos aliados, como a tecnologia e os espaços para os estudantes se expressarem. Para a educadora, cabe a cada profissional entender como lidar com esses avanços, orientando as turmas no sentido de buscarem as respostas para suas dúvidas em sites confiáveis, além de acrescentar, de acordo com sua própria bagagem, conhecimento às pesquisas realizadas pelos estudantes.

Na perspectiva dos avanços, notabilizam-se também as contribuições deixadas pelos grandes mestres da educação brasileira. Mirtes Ramos, que atua na Creche Municipal João Eugênio, em Recife (PE), e no time de formadores da NOVA ESCOLA, lembra Paulo Freire e uma de suas célebres frases: “Não há saber mais ou saber menos. Há saberes diferentes”. De acordo com a professora, um dos legados deixados pelo filósofo e educador brasileiro é a necessidade de respeitar todos os tipos de conhecimento, algo que se reflete, inclusive, em instâncias mais pessoais.

“Lembro dos meus pais, que não tinham tanto estudo, mas possuíam a sabedoria da vida. Meu pai encontrava livros na calçada e levava para que eu lesse, pois sabia da importância da leitura. Já minha mãe levava a gente para participar de quadrilhas, celebrações aqui do Nordeste. Isso é respeitar a cultura, e é algo que eu prezo com as crianças das minhas turmas também”, pontua.

De professor para professor: dicas para a prática pedagógica

Todos nós temos aquele professor inesquecível. Os caminhos para marcar a vida de um aluno são tão diversos quanto são as pessoas, mas há alguns pontos, merecedores de atenção, que valorizam a experiência entre professor e aluno. Confira algumas qualidades de um professor memorável, segundo a opinião das entrevistadas:

 

Espaço para o protagonismo estudantil. Para Tâmila Tavares, um professor que deixa um legado é aquele que “sabe que colocar o aluno no centro é importante, mas não só do aprendizado. O aluno tem de perceber que é um indivíduo que importa para a sociedade”.
Empatia. “É aquele que olha nos olhos, que percebe o esforço do aluno, que valoriza seus pequenos avanços”, diz Rosalina de Lázaro.

Escuta ativa e contextualização do aprendizado. A educadora Mirtes Ramos aponta como diferencial saber ouvir o estudante, além de fazer a transposição da teoria para a prática, entendendo o que é importante para o grupo. “Esse professor faz com que todos identifiquem os saberes e a aula fique com um gostinho de quero mais, na qual, mesmo a gente estando em um lugar físico, consegue se transportar para onde a imaginação desejar”, diz.

O valor das parcerias

Se o passado rende aprendizados e inspirações para boas práticas, o presente mostra o peso das parcerias entre os colegas para enfrentar os desafios diários. “A troca entre professores é muito importante, porque a gente vai compartilhar não só medos e alegrias, mas também saberes. É receber o olhar de um colega que também é profissional e ver todos crescendo juntos”, defende Mirtes.

Ela conta que fez um curso em que cada um recebeu a imagem de um barco como símbolo. O objetivo era dizer o óbvio: “Todos estão juntos no mesmo barco. Então, não era ‘minha criança’ era ‘nossa criança’. Somos todos responsáveis. A gente pensa junto, estuda junto para identificar os problemas e encontrar a solução. É você sentir que não está só e ser também esse colega para o outro”, afirma Mirtes.

De acordo com as professoras entrevistadas, impulsionar o protagonismo dos alunos é um dos pontos-chave das boas práticas pedagógicas. Foto: Fernando Graf/NOVA ESCOLA

Já Rosalina fala da importância da troca de ideias e informações entre o corpo docente para uma formação integral do estudante, que considere as dimensões intelectual, física, emocional, social e cultural do sujeito, e destaca a parceria com Amauri Bassetto, diretor da EE José dos Santos. “Ele tem firmeza na aplicação do currículo ao mesmo tempo em que possui a delicadeza de se preocupar com cada estudante, com a equipe pedagógica, envolvendo as famílias e tratando os professores com empatia e cuidado, em uma gestão pedagógica participativa”, diz.

Sobre a gestão de sala de aula, Mirtes diz que muita coisa mudou desde que iniciou a carreira, visto que são 40 anos de experiência. Entre elas, também destaca o protagonismo do aluno e a chegada das novas tecnologias e salienta a consolidação do aprendizado por interações com Base Nacional Comum Curricular (BNCC). “Enquanto professor, não se espera mais uma doação como detentor do saber, mas a de tempo e de bons ouvidos. Não na posição de mestre, mas de companheiro na jornada de descobertas – compartilhadas, na maioria das vezes”, conclui.

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