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Antes, durante e depois: ações essenciais para o sucesso da semana pedagógica

Acolhimento, escuta dos educadores e construção conjunta de metas pavimentam o caminho para cumprir os compromissos pedagógicos ao longo do ano

POR:
Maggi Krause
Foto: Getty Images

Um novo ano letivo, e a rotina se reinicia. A semana pedagógica marca a retomada das atividades e pode ser norteadora de muitos caminhos. Ela pavimenta o clima escolar, estabelece as metas de aprendizagem, informa a equipe sobre as regras da Secretaria de Educação e, principalmente, organiza o planejamento pedagógico do ano. 

“A semana pedagógica é um ritual de entrada no ano letivo, e fazer com que esse espaço seja útil e produtivo para os professores é uma tarefa importante e deve ser incentivada por todos – gestores das escolas, das secretarias e das instituições parceiras”, defende Rosaura Soligo, formadora na área de coordenação pedagógica e mestre e doutora pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “O encontro, que às vezes acontece em dois ou três dias, dependendo da rede de ensino, precisa ter em vista avaliar o que foi feito no ano anterior, planejar o atual e documentar o que for acordado”, lista ela, que coordena projetos do Grupo Abaporu, parceiro de várias secretarias de Educação do país.   

Para ser bem-sucedida, a semana pedagógica exige ações antes, durante e depois da sua realização. São diversas as estratégias que podem fortalecer esse momento, considerado decisivo para o bom andamento do ano letivo. Os encontros também se constituem como uma oportunidade de formar e corresponsabilizar os educadores pelas metas da escola. “Muitas vezes se faz uma divisão inadequada entre formação e planejamento. A ação de planejar é uma das mais formativas que existe. Do ponto de vista do professor, o que subsidia sua ação com os alunos pode vir de um bom planejamento”, diz Rosaura. Segundo ela, as secretarias costumam trazer alguém de fora para um “agito conceitual”, o que é válido. Mas é preciso reservar tempo para entender como o trabalho será organizado e como as crianças serão recebidas, além de dar apoio às necessidades dos profissionais. 

Vale ressaltar, no entanto, que a semana pedagógica é parte de um processo muito mais amplo. “O tempo é bastante curto, então [a semana pedagógica] é um pontapé inicial, com apresentação de dados de aprendizagem, documentos oficiais, planejamento com base na BNCC [Base Nacional Comum Curricular] e orçamento para a gestão do ano – tudo dito de modo transparente e formalizado”, ressalta Márcio José Moreira Donadoni, diretor da EM Senador Filinto Müller, em Três Lagoas (MS).  

Antes: o que é preciso mapear para organizar o encontro

A pauta prioritária da semana pedagógica precisa ser a necessidade dos professores, defende Rosaura. A especialista comenta que se pode fazer falas belíssimas, mas, se o conteúdo não for reconhecido pelo professor como algo que acrescente à sua prática, de nada adianta. Assim, o mapeamento dessas necessidades precisa ser feito, de preferência, ainda no ano anterior. 

“Muitos acham que é preciso perguntar diretamente ao professor, mas, se ele soubesse exatamente sua necessidade, já teria arranjado uma alternativa ou solução.” Rosaura explica que, se a questão for indireta, a resposta é mais espontânea.

Algumas sugestões da formadora são: qual sua maior preocupação em relação ao seu trabalho agora? Qual sua maior inquietação em relação às aulas? O que seus alunos têm mais dificuldade de aprender? O que você gostaria que fosse abordado na semana pedagógica, considerando os desafios atuais na escola? “Quando eu era coordenadora pedagógica, a semana era sempre uma resposta às necessidade indicadas na avaliação do ano anterior. Aquilo que foi apontado pelos educadores como pontos positivos, fragilidades e demandas de formação”, relembra. 

No final de dezembro, após o término das aulas, Márcio, que dirige a escola municipal em Três Lagoas, se reúne com as duas coordenadoras pedagógicas e com a equipe da Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SEMEC) para compilar os dados das avaliações internas e externas. A Filinto Müller conta com 56 professores e atende 250 alunos no período matutino e 250 no vespertino, matriculados entre o final da Educação Infantil e o 5º ano.

“Verificamos os pontos positivos, o que será preciso melhorar, o que erramos e as metas que não atingimos, para pedir ao professor sugestões durante a semana pedagógica, depois de apresentar a ele os dados já analisados”, conta o diretor, que é formado em Educação Física e Pedagogia e atualmente participa do curso “Gestão para Equidade”, do Centro Lemann para Equidade.   

A organização dos documentos que serão entregues à equipe docente durante o encontro é também uma tarefa prévia na EE Padre Paulo, em Santo Antônio do Monte (MG). “Este ano montamos um caderninho com tudo o que o professor vai utilizar durante o ano: o quadro de horários, a lista de alunos por turma – já com anotações sobre quem precisará de mais atenção –, o regimento escolar etc. Deixamos também espaço para ele colar as habilidades da BNCC para o ano que vai lecionar e documentos posteriores, como um memorando ou uma nova resolução”, conta Laila Paula Camilo, especialista de Educação Básica (nomenclatura dada aos coordenadores pedagógicos nas redes de Minas Gerais) da escola. Laila é responsável pela coordenação do Ensino Médio, a maior etapa do município, com 850 estudantes e cerca de 28 professores. 

Durante: como envolver a equipe no planejamento

Laila também trabalha como professora dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental na rede municipal e sabe, por experiência própria, o valor de ser bem acolhida na semana pedagógica. “Nós organizamos a apresentação na escola de modo a relembrar os sucessos, como a Feira de Ciências, a Festa Junina e a Feira Cultural. Mostramos slides com fotos dos meninos e o que eles apresentaram. Celebrar o que deu certo traz uma coisa vital para iniciar o ano que é a esperança de melhorar.” 

Os encontros começam com uma acolhida, que é uma confraternização simples, com lanche e conversa. Em seguida, os professores dividem com o grupo suas reflexões sobre o ano anterior. Há apresentações dos novos integrantes e de todas as pessoas envolvidas no bom funcionamento da escola, bem como das regras e horários, da missão e dos pressupostos da instituição. Depois, Laila apresenta os resultados das avaliações externas do ano anterior, os dados de aprovação e reprovação e as conquistas da escola e, junto aos demais profissionais, desenha novas metas a serem atingidas.

“A melhor forma de engajar a todos é por meio da escuta. Quando você ouve os anseios e as ideias do professor e consegue adaptá-los dentro da organização, com apoio da gestão, e os coloca com efetividade no PPP [Projeto Político Pedagógico] ou no cotidiano da escola, as pessoas notam que foram atendidas, ouvidas, respeitadas. Aí elas vestem a camisa. Acredito que toda construção conjunta funciona melhor. E, quando o professor é bem recebido, ele recebe melhor os alunos”, diz a pedagoga, que tem pós-graduação em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 

Para manter a atenção de todos na semana pedagógica, Rosaura recomenda que a ênfase seja no planejamento do ano letivo, e não nas discussões em torno dos documentos (PPP ou o plano de ensino). “É preciso, partindo das demandas que variam de acordo com cada escola, buscar subsídios que façam sentido”, resume. “Também não é sábio sobrecarregar o professor com muitos estudos, ele vai ser mais beneficiado se já iniciar o ano com um planejamento pedagógico organizado.”

Em geral, um ou dois dias da semana pedagógica ficam a cargo da Secretaria de Educação do estado ou do município e os demais são programados pelas escolas. 

Renata Fernandes, diretora da EM Carolina Moraes Silva, em Ilhabela (SP), que atende 120 crianças na Educação Infantil, usou metodologias ativas para chamar a atenção das professoras para a importância do planejamento e dos registros. “Levei uma caixa de materiais diversos e dividi a turma em grupos. Pedi que construíssem um prédio, mas que primeiro planejassem por escrito como seria essa construção. Quando terminaram essa etapa, troquei os planejamentos entre os grupos, e uma turma tinha de construir o que a outra orientou. Ao final, cada grupo avaliou o prédio idealizado.” 

O exercício serviu para mostrar a importância de ter uma proposta bem definida de onde se quer chegar e registrá-la com propriedade para retomá-la durante o ano. “Foi engraçado, pois falaram, por exemplo, que imaginaram tal cor, mas ficou diferente, pois não constava do planejamento!”, conta Renata, que também atua como coordenadora pedagógica da escola, que tem cerca de 12 professoras e 15 auxiliares de sala.

Depois: registros das reflexões e compromissos para o ano

Nos primeiros dias de fevereiro, quando acontece o planejamento conjunto em Ilhabela, Renata vai retomar os direitos de aprendizagem da BNCC para que as professoras reflitam sobre de que forma o trabalho feito no ano passado as contemplou ou não. Com base nisso, vão, então, traçar estratégias prioritárias para explorar o espaço da escola incentivando o protagonismo das crianças pequenas. O objetivo é documentar o que a escola deseja para os alunos dentro de certos temas, como letramento e práticas leitoras. “O que sai desse encontro não é apenas um documento, mas, sim, um movimento, pois ele não é linear, é um planejamento retomado e revisto ao longo do ano”, constata a diretora. “Talvez eu peça que as professoras escrevam uma carta para mim contando o que ficou de mais importante, para depois fazer uma compilação disso em um documento maior, que sirva de norteador durante o ano”, planeja. 

Na escola de Márcio, é elaborada uma ata sobre a semana pedagógica, que informa o que foi proposto pela gestão, as contribuições dos professores e os compromissos assumidos pela equipe. “Os professores precisam ler e assinar o documento, e, assim, cada um que fez parte da construção conjunta se torna corresponsável e sabe qual é o plano a seguir. E, quando há dúvidas, pode recorrer ao registro”, conta o gestor.   

Envolver as famílias é também aconselhável. Em uma semana pedagógica de anos atrás, a equipe de Laila criou em conjunto um termo de compromisso a ser assinado pelos pais e responsáveis pelos estudantes, no qual constavam as regras da escola que precisavam ser respeitadas por todos. “Isso foi em 2018, e todo o ano o revemos. Por exemplo, antes da pandemia era proibido o uso do celular em sala e, ano passado, acrescentamos ‘sem autorização do professor’, já que agora o aparelho é utilizado para fins pedagógicos”, relata. 

Seja qual for a estratégia utilizada, sempre cabe perguntar aos envolvidos como avaliam a semana pedagógica. A formadora de gestores Rosaura propõe questões que possibilitem uma reflexão pelo professor, por exemplo: o que você pensou de diferente ou pela primeira vez nesse encontro, a partir das nossas discussões? O que gostaria que fosse aprofundado em ocasiões futuras? Vale a pena pedir essas observações por escrito. “Depois, é preciso fazer bom uso do que disseram e dar uma devolutiva consistente, sistematizando e acrescentando outros elementos. Só assim as pessoas se sentem valorizadas por fazerem parte dessa construção de conhecimento coletivo”, finaliza.

 

Desafios para o ano letivo de 2023

Entrevistados apontam o que consideram prioritário para a semana pedagógica, conforme suas áreas de atuação

Gestão escolar

“O maior desafio é o redimensionamento da proposta curricular para atender as demandas dos estudantes. Em razão da pandemia, é preciso ajustar ainda mais quais são os saberes relevantes, o que deve ser priorizado com os alunos, seja a partir dos documentos oficiais que a Secretaria enviou ou do que se avaliou na própria escola.”

Rosaura Soligo, formadora na área de Gestão Escolar

Educação Infantil

“Precisamos alinhar a concepção de criança como protagonista com o planejamento para, dentro da nossa prática, dar mais liberdade aos pequenos no espaço que temos na escola. Esse tipo de trabalho está mencionado no nosso PPP, mas não está descrito, sistematizado e documentado como deveria, e esta será nossa tarefa este ano.”

Renata Fernandes, diretora da EM Carolina Moraes Silva, em Ilhabela (SP)

Anos Iniciais do Ensino Fundamental

“No ano passado, chamamos as famílias para assinar um compromisso, e isso resolveu nosso problema de busca ativa, não tivemos evasão escolar e nem reprovação por assiduidade. Em 2023, o desafio é traçar estratégias para focar na aprendizagem com equidade. Temos três turmas em cada ano e há disparidade entre elas, então vamos apostar em professores dando aula no componente curricular em que têm mais potencialidade, uma vez por semana, para as turmas mais frágeis.”

Márcio Donadoni, diretor da EM Senador Filinto Müller, em Três Lagoas (MS)

Ensino Médio

“Precisamos aumentar a frequência e o sucesso escolar, pois na pandemia os adolescentes perderam o hábito de estudar e os professores adoeceram. Tivemos muitas faltas docentes em 2021 e 2022, o que fez com que os planejamentos não fossem cumpridos, gerando queda nos índices de aprendizagem. Na semana pedagógica, convidamos uma psicóloga para abordar a questão do autocuidado e da saúde mental, pois sabemos o quanto a rotina do professor é desgastante e como sua dedicação é reflexo da sua qualidade de vida.”

Laila Paula Camilo, coordenadora na EE Padre Paulo, em Santo Antônio do Monte (MG)

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