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Produção de texto: como estimular a escrita nos Anos Finais

O trabalho com os gêneros entrevista e biografia permite explorar diferentes ideias e histórias de vida, favorecendo o engajamento da turma

POR:
Ana Cláudia Santos

A produção de textos no cotidiano escolar faz parte de um processo que exige que os alunos se percebam como autores.

“Ninguém é capaz de escrever bem, se não sabe bem o que vai escrever.” A provocação do linguista Câmara Júnior nos desperta uma reflexão sobre o processo de escrita em nosso cotidiano, o caminho que a atividade para a produção de um texto percorre até a sua elaboração. Trocando em miúdos, ao escrever, precisamos considerar as dimensões conceituais e procedimentais dos conteúdos materializados nas experiências reais de interlocução.

A prática de produção de texto precisa estar sintonizada com momentos de aprendizagem da escrita devidamente contextualizados, por meio de debates e leituras de bons exemplos de gêneros textuais, focalizando os efeitos de sentido e os recursos linguísticos mais representativos. Dessa forma, a escrita ganhará significado e favorecerá as aprendizagens, garantindo a construção de sentido e de sujeitos capazes de se integrar à vida em sociedade por meio dos textos que leem e produzem.

Para que possam construir seus dizeres, os alunos devem compreender que escrever é um exercício capaz de traduzir um pensamento, de desenvolver a sensibilidade e de dar ao autor posse e responsabilidade sobre o que escreve. 

O trabalho com o gênero entrevista

Uma sugestão para promover a produção textual dos alunos é o trabalho com a entrevista. Atualmente, ela é um dos gêneros responsáveis pela ampla divulgação de ideias, posicionamentos e informações. Mostre aos alunos que, indiretamente, é o recurso que embasa outros gêneros de texto, como a notícia, a reportagem e até mesmo textos que não estão no domínio jornalístico, como a biografia.

Leia mais: Crônica: explore o gênero textual e mobilize o protagonismo dos estudantes

Incentive a leitura para além do que é dito, atentando-se para as entrelinhas e informações implícitas. A arte de fazer perguntas pode ser conferida no livro Por trás da entrevista, de Carla Mühlhaus. Segundo ela, “é graças à sua abertura à voz do outro que a entrevista laureia a espontaneidade e a ironia que andam tão escassas. Na escolha do entrevistado está uma mensagem”.

Indagar é uma forma de explorar o universo do outro, seus saberes, vivências e contextos. Por isso, colocar o aluno em contato com esse gênero é essencial. Para ver e ouvir entrevistas, sugiro a página Casaum.org, que traz uma seleção de programas de entrevistas e debates para discutir e aprender sobre os mais diversos temas.

Se preferir o gênero em formato escrito, proponha a leitura de jornais de grande circulação ou mesmo locais. É importante que os textos mantenham uma estreita relação com os temas que pretende discutir em sala. Independentemente do formato escolhido, sugira uma análise das entrevistas apresentadas para dar ao aluno subsídios para a sua própria produção. Organize uma discussão sobre os elementos que estruturam o texto, a linguagem usada, as variações da oralidade para a escrita e os recursos utilizados pelo entrevistador para aguçar as respostas do entrevistado.

Produção de texto com as próprias entrevistas

Uma maneira de estimular a escrita é oportunizar aos alunos as próprias impressões sobre os temas apresentados. A retextualização pode ser feita por meio de um artigo de opinião, de uma notícia ou até mesmo de uma narrativa. Dê as orientações conforme deseja explorar a capacidade de síntese. Destaque não apenas as características do gênero, mas também o trabalho de pesquisa realizado.

Os alunos também podem fazer suas próprias entrevistas, pesquisando sobre seus entrevistados e avaliando temas pertinentes antes mesmo de fazerem as perguntas. Oriente que façam um planejamento das etapas que serão desenvolvidas até a produção final do texto. Chame a atenção para aspectos relacionados à construção linguística, como elementos coesivos, ortografia e concordância.

Voltar sempre ao texto é parte essencial da escrita, para verificar os sentidos produzidos, a adequação da linguagem e os recursos usados como condições favoráveis à produção. A revisão tem sempre destaque no processo de escrita, afinal, contempla a avaliação que o próprio autor faz sobre a sua criação.

Explorando o gênero biografia

A entrevista pode ser também o esqueleto para a contar ou descrever a história de vida de uma pessoa, servindo como desdobramento para a criação do gênero discursivo biografia. 

O texto biográfico tem o objetivo de proporcionar ao leitor a reconstituição, o mais real possível, da imagem de uma personalidade cuja vida está sendo contada. As citações funcionam como um interessante recurso, porque permitem incorporar ao texto a “voz” daquela pessoa, associando-a a momentos importantes da sua vida.

Diferentes instrumentos podem motivar debates em sala de aula, como fotos antigas da cidade onde aquela pessoa viveu. E, com base nas questões propostas, também é possível levantar questionamentos e hipóteses sobre, por exemplo, a importância da infância, as relações familiares e as marcas deixadas nos relatos que tocam a nossa sensibilidade.

A leitura do livro O brasileiro voador, de Márcio Souza, proporciona um misto de ficção e biografia ao revelar aos leitores a personalidade de um notável brasileiro, Santos Dumont. Nessa linha, uma sugestão é construir um mural temático com a biografia das pessoas que contribuíram para que a história do local onde vivem fosse escrita. Para que se sintam mais próximos das personagens que admiram, organize com a turma o roteiro de entrevista que servirá como base para os relatos da vida do biografado.

Lembre-se de que a construção de textos no cotidiano escolar faz parte de um processo que exige envolvimento com a escrita, planejamento, compartilhamento de ideias e revisão. E, principalmente, que os alunos percebam a si mesmos como autores.

Boa escrita a todos!

Ana Cláudia Santos é professora de Língua Portuguesa na Educação Básica da rede estadual de ensino há 20 anos e mestranda em Educação Profissional e Tecnológica. Foi vencedora do Prêmio Educador Nota 10, promovido pela Fundação Victor Civita, nas edições de 2014 e 2018, com os trabalhos O Povo Conta e O (Ser)tão de Cada Um. Recebeu a medalha Ordem do Mérito Educacional (MEC) – Grau de Cavaleiro e o troféu Capitão-Médico João Guimarães Rosa, da Academia de Letras da PMMG.