As novas peças e os velhos papéis do Conselho Nacional de Educação
Apesar da troca de sete de seus 24 membros, o Conselho Nacional de Educação (CNE) segue influindo pouco no jogo das políticas públicas. Veja por quê
POR: Clara VieiraUma coisa não dá para negar: a Educação brasileira é generosa em siglas. CNE é uma delas (e, sejamos sinceros, faz parte do time de abreviações que muitos não sabem o que significam ou o que representam). Apesar de sua relevância, o Conselho Nacional de Educação ainda é, para muitos professores, uma casa desconhecida nos tabuleiros da Educação. Aliás... para que mesmo serve o CNE? Por que tanta gente diz que ele é importante, mas faz menos do que poderia? Por fim, por quê, mesmo com a substituição de sete de seus 24 integrantes (veja no quadro abaixo e na página seguinte a biografia de todos os conselheiros), os especialistas afirmaram que pouco deve mudar na entidade? Esta reportagem pretende ajudar a responder a essas questões.
Quem é quem
Divididos em duas Câmaras - de Educação Básica e de Educação Superior -, os conselheiros têm mandatos com duração de quatro anos, renováveis por mais quatro
Câmara de Educação Básica (CEB)
Adeum Hilário Sauer | César Callegari | Clélia Brandão Alvarenga Craveiro |
Francisco Aparecido Cordão | José Fernandes de Lima | Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva |
Maria Izabel Noronha | Mozart Neves Ramos | Nilma Lino Gomes |
Raimundo Moacir Mendes | Regina Vinhaes Gracindo | Rita Gomes do Nascimento |
Novo membro | Representante do MEC | Presidente da Câmara | Presidente do Conselho |
Câmara de Educação Superior (CES)
Antônio de Araújo Freitas Júnior | Antônio Carlos Caruso Ronca | Arthur Roquete de Macedo |
Gilberto Gonçalves Garcia | Luiz Antônio Constant | Maria Beatriz Luce |
Maria Paula Dallari Bucci | Milton Linhares | Paschoal Armonia |
Paulo Monteiro Vieira Braga Barone | Paulo Speller | Reynaldo Fernandes |
Novo membro | Representante do MEC | Presidente da Câmara | Presidente do Conselho |
Vale começar explicando o que é um conselho. Como o próprio nome diz, esse órgão - municipal, estadual ou nacional - existe para aconselhar e assessorar o governo na formulação de políticas públicas e diretrizes de ensino por meio de pareceres, estudos e pesquisas. Essa era a função dos pioneiros Conselhos de Educação no país (o primeiro de que se tem notícia é o da Bahia, de 1842). No caso do CNE, a Constituição de 1988 conferiu-lhe diversas outras missões, aumentando, em tese, sua importância (conheça todas as atividades desenvolvidas no quadro abaixo).
Tabuleiro de tarefas
Para virar lei, propostas e atribuições (em vermelho) do CNE precisam de aprovação do Executivo ou do Legislativo (em azul)
Ilustrações: Sattu
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Na prática, entretanto, o Conselho manda pouco. Como se diz no jargão técnico, a maioria de suas decisões não é terminativa - ou seja, para entrar em vigor, ainda precisa da aprovação de outras instâncias, como a Câmara dos Deputados, o Senado e o Ministério da Educação (MEC). "Seria benéfico mudar a lei para que certas decisões não dependessem de homologação ministerial", diz o conselheiro César Callegari.
Outro problema é que o CNE não pode interferir em alguns assuntos importantes para a Educação, como o financiamento. "Em áreas como a Saúde, o Conselho Nacional também decide sobre os aspectos econômicos", afirma Juca Gil, professor de Políticas Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Para Gil, o órgão tem sido pouco efetivo mesmo em suas atribuições, como a elaboração do Plano Nacional de Educação (PNE). "Hoje, o Conselho apenas apresenta sugestões e tira dúvidas sobre a legislação. Quem de fato elabora e avalia o PNE é o MEC."
Em parte, a atuação tímida pode ser explicada pela falta de estrutura. Por não possuir orçamento próprio, o CNE depende do suporte do MEC, utilizando suas dependências e contando com a ajuda de seus técnicos. "Isso é complicado. Como o CNE desempenha funções que corresponderiam ao Judiciário, é necessário ter independência em relação ao Executivo", explica Dermeval Saviani, especialista em História da Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Já os membros do Conselho defendem que a proximidade com o Ministério é benéfica para que as decisões sejam tomadas na base do diálogo. "Temos liberdade para realizar propostas e conversar até chegar a um acordo. É o jogo democrático", defende o conselheiro Francisco Aparecido Cordão.
Muitos críticos, porém, consideram excessiva a interferência governamental. Um dos motivos seria a própria forma de escolha dos integrantes do órgão. De início, eles são indicados por entidades ligadas à Educacão. Mas, para serem empossados, dependem da aprovação do presidente da República (leia o quadro abaixo). Em tese, ele leva em conta a biografia do candidato e procura atender à diversidade do ensino brasileiro, indicando especialistas em Educação Especial, Indígena, de Jovens e Adultos e assim por diante. Mas a preocupação - óbvia - é que cada governante crie conselhos à sua imagem e semelhança, enfraquecendo muito o poder fiscalizador do órgão. "Eu diria que hoje, em grande parte, o principal foco de pressão são os partidos políticos", afirma Juca Gil.
Quem dá as cartas
Entidades indicam integrantes, mas decisão é do presidente da República
Indicações | Seleção | Palavra final |
Embora não haja consenso sobre uma forma de escolha alternativa, uma das opções seria promover eleições. "A proposta de que as entidades possam votar e não apenas apontar conselheiros vem sendo discutida desde os anos 1980, mas ainda não vingou", diz Gil. Há quem defenda ainda ampliar a representação para além das entidades e dos grupos de interesses, ouvindo também a voz de professores e gestores. "Entre 1989 e 1992, durante a gestão da prefeita Luiza Erundina, em São Paulo, o Conselho Municipal era composto de integrantes eleitos pelas escolas", argumenta Romualdo Luiz Portela de Oliveira, professor da Universidade de São Paulo (USP).
Repensar a seleção dos membros, melhorar a estrutura e garantir uma maior independência são os gargalos cruciais para o fortalecimento do CNE nos próximos anos. O resultado desses desafios vai definir se o órgão poderá, de fato, dar as cartas - ou se será apenas mais um jogador pouco influente no disputado jogo da Educação brasileira.
Reportagem sugerida por Luanna de Sousa Lacerda Silva, Brasília, DF
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