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A geometria na arte marajoara

Explore conceitos matemáticos nas faixas decorativas das cerâmicas

POR:
Elisa Meirelles, NOVA ESCOLA, Larissa Teixeira
Medir o tamanho das semirretas e os ângulos formados por elas ajuda a reproduzir os modelos. Alice Vasconcellos Medir o tamanho das semirretas e os ângulos formados por elas ajuda a reproduzir os modelos Em suas produções, os alunos buscaram alternativas para criar figuras simétricas. Fotos Arquivo pessoal/Rosangela Dantas Martins Em suas produções, os alunos buscaram alternativas para criar figuras simétricas Em suas produções, os alunos buscaram alternativas para criar figuras simétricas. Fotos Arquivo pessoal/Rosangela Dantas Martins Em suas produções, os alunos buscaram alternativas para criar figuras simétricas Em suas produções, os alunos buscaram alternativas para criar figuras simétricas. Fotos Arquivo pessoal/Rosangela Dantas Martins Em suas produções, os alunos buscaram alternativas para criar figuras simétricas

A vontade de valorizar a cultura local e, ao mesmo tempo, de ampliar o conhecimento da turma sobre geometria, fez a professora Rosangela Dantas Martins desenvolver um projeto que une Arte e Matemática com os alunos do 8º ano do Liceu Escola de Artes e Ofícios Mestre Raimundo Cardoso, em Belém. Ela se inspirou na arte ceramista da cidade - e do distrito de Icoaraci, onde se localiza a escola - para realizar um projeto pautado na Etnomatemática.

"Essa é a Matemática praticada por grupos culturais, tais como comunidades urbanas e rurais, grupos de trabalhadores, classes profissionais, crianças de uma certa faixa etária, sociedades indígenas e tantos outros grupos que se identificam por objetivos e tradições comuns", explica Ubiratan D'Ambrosio no livro Etnomatemática - Elo entre as Tradições e a Modernidade (Ed. Autêntica, 112 págs., tel. 0800-2831-322, 31 reais). "Esse tipo de trabalho contribui para o resgate da identidade da comunidade e para a valorização da arte local", complementa Dirceu Zaleski Filho, autor de Matemática e Arte (Ed. Autêntica, 184 págs., 37 reais).

Com base nessas concepções, Rosangela iniciou as atividades com uma visita a uma loja ceramista do bairro. "A ideia era despertar a classe para a reinvenção cultural da cerâmica arqueológica produzida na comunidade", conta. Trata-se da mais antiga arte desse tipo no Brasil e de uma das primeiras da América. Além dos traços culturais, a docente convidou a turma a atentar à maneira como são feitos os desenhos presentes nas faixas que adornam as peças. Como está descrito na Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais, "a cerâmica marajoara apresenta padrões decorativos com desenhos labirínticos e repetitivos, traços gráficos simétricos, em baixo ou alto-relevo".

Após a visita, Rosangela conversou com os alunos para verificar como estavam os conhecimentos sobre os conteúdos de geometria que ia trabalhar: ponto, reta, plano e posições entre retas. Eles já estavam familiarizados com o tema, mas ainda tinham dificuldade para identificar alguns conceitos e propriedades. A professora, então, levou para a escola algumas faixas decorativas da cerâmica local, retiradas do livro Motivos Ornamentais da Cerâmica Marajoara: Modelos para o Artesanato de Hoje, de Giovani Gallo (Museu do Marajó, 146 págs., tel. 91/3758-1102, 30 reais). Em seguida, propôs que os estudantes observassem como eram formados os desenhos de cada uma delas e discutissem os conceitos geométricos necessários para produzi-las.

A turma identificou, por exemplo, a diferença entre reta, semirreta e segmento de reta, e as posições delas em diferentes faixas. Ao analisar as figuras, fica claro que são formadas por segmentos de reta dispostos de forma paralela, concorrente ou perpendicular, criando padrões que se repetem lateralmente ao longo de todo o modelo. "Na Etnomatemática, os conceitos matemáticos emergem dentro do contexto sociocultural proporcionado pela aproximação com a Arte", explica Zaleski Filho.

Depois disso, a docente instigou os estudantes a explorar as figuras formadas nas imagens e suas propriedades. Eles mediram os ângulos internos do triângulo, por exemplo, e encontraram a soma: 180 graus. Falaram também sobre os quadriláteros e Rosangela notou que parte da turma não compreendia o conceito. Ela propôs, então, a exploração de semelhanças e diferenças entre quadrado, retângulo e losango. Os alunos tinham de localizar essas figuras nos modelos disponíveis, medir lados e ângulos, compará- -las e classificá-las. Concluíram, assim, que toda figura com quatro lados é um quadrilátero. Se tiver quatro ângulos retos é um retângulo. Se os quatro lados forem iguais e os ângulos opostos tiverem a mesma medida, trata-se de um losango. O quadrado, portanto, é um losango e um retângulo, pois tem lados com a mesma medida e quatro ângulos retos.

Paralelamente a isso, a professora pediu ajuda a Márcia Mara Baleiro Barroso, docente de Arte, que introduziu o tema em suas aulas. A turma pôde aprofundar os estudos sobre as características da cerâmica marajoara e ter contato com composições de artistas que utilizam aspectos geométricos. "É importante o contato com diferentes manifestações culturais como forma de ampliar o conhecimento e valorizar a criação artística", aponta Zaleski Filho.

Reproduzir e criar padrões

A exploração dos conceitos geométricos deu aos alunos condições para passar à etapa seguinte: a reprodução de faixas decorativas. Eles se reuniram em grupos para identificar o padrão de repetição de cada um dos modelos e tentar construí-lo coletivamente. Para a atividade, foram utilizados um par de esquadros, compasso, transferidor, lápis e papel.

À medida que as dúvidas surgiam - "Qual o número de repetições necessárias para construir a faixa?", "Como criar figuras iguais?" - a garotada discutia e, sempre que necessário, pedia a ajuda da professora. Para copiar modelos que contenham figuras triangulares ou quadriláteros, o aluno pode usar estratégias como medir lados e ângulos. Para tanto, uma opção é usar régua e transferidor. Outra é traçar uma circunferência em torno de um dos vértices da figura, marcar os ângulos conhecidos e calcular os demais, sabendo que a soma é 360 graus. Vale também atentar para a localização de cada figura no modelo - se está colada na base, se dista alguns centímetros dela, se está próxima a outro elemento etc.

Por fim, foi a vez de cada um construir a sua própria faixa com base nas referências artísticas adquiridas nas aulas de Arte e nos conceitos geométricos estudados em Matemática. Os estudantes criaram diferentes padrões e buscaram alternativas para replicá-los, fazendo os próprios modelos. Os desenhos foram usados como base para estampar camisetas personalizadas.

Saddo Ag Almouloud, coordenador do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), lembra que durante o processo é importante também realizar momentos de socialização das aprendizagens, em que os alunos possam compartilhar com os colegas as estratégias que utilizaram para reproduzir as faixas e analisar as mais eficientes, sistematizando assim o que aprenderam.

Ao final, a garotada entendeu que os conhecimentos geométricos são ferramentas fundamentais para reproduzir padrões e criar desenhos. Além disso, se apropriou da cultura local e entendeu a importância do polo ceramista para a cidade. "O projeto levou os jovens a ter outra relação com a comunidade e valorizar o lugar em que nasceram como produtor de uma cultura significativa", explica Zaleski Filho. "Percebi que são grandes as conexões entre Matemática e Arte e quanto uma contribui com a outra", diz a aluna Jenifer Almeida, 14 anos.

1 Conhecer referências Coloque a classe em contato com manifestações artísticas, como a cerâmica marajoara. Discuta como a Matemática está presente nelas. Se possível, faça uma parceria com o professor de arte.

2 Explorar conceitos Leve modelos para a sala e proponha, com base neles, a discussão de conceitos matemáticos. Os jovens podem explorar as propriedades das figuras geométricas e conceitualizar ponto, reta, semirreta e segmento de reta.

3 Reproduzir modelos Proponha a reprodução das faixas utilizando esquadro, compasso, transferidor, lápis e papel. Os alunos devem aproveitar os conceitos geométricos para garantir que os padrões sejam replicados de forma correta.

4 Criar faixas customizadas Convide a turma a criar modelos, usando como base os conhecimentos de geometria e os aspectos artísticos discutidos. Peça que socializem e discutam as estratégias usadas para replicá-los.

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