5 etapas para a formação de professores decolar
Continuidade, progressão e avaliação são essenciais para a aprendizagem dos docentes
POR: Karina PadialEncontros agendados semanalmente, equipe presente, as dúvidas dos professores sendo levadas às reuniões. Parece que tudo está certo com a formação permanente na escola. Porém, no fim do ano, um olhar atento para o desempenho dos alunos constata que eles estão com as mesmas necessidades de ensino do início das aulas; e os professores, com as mesmas dúvidas sobre como ensinar determinados conteúdos.
Não é difícil concluir: falta alguma coisa para que o horário de trabalho coletivo seja mais eficaz. Pode ser que, mesmo com tempo e espaço reservados, falte um plano para a formação na escola. Sim, um projeto elaborado e estruturado de modo a fazer com que os temas tratados obedeçam a uma sequência lógica e as estratégias formativas levem à reflexão sobre a prática e ao aprofundamento do conhecimento didático. Tudo planejado com consistência para que não seja apenas um treinamento mas traga também mudanças efetivas na maneira de ensinar. "O trabalho do coordenador pedagógico é garantir que as intenções educacionais sejam transformadas em práticas concretas que levem ao aprendizado dos alunos. E, para que isso aconteça, é preciso ter um projeto de formação muito bem elaborado", diz Dayse Gonçalves, formadora de professores e coordenadora pedagógica da Escola Carlitos, em São Paulo.
Erros mais comuns
- Definir a pauta às vésperas da reunião.
- Deixar de compartilhar com os professores os propósitos dos encontros e as metas a ser alcançadas.
- Copiar modelos desenvolvidos por terceiros que não levem em conta a realidade da escola e o diagnóstico dos estudantes e dos professores.
- Incluir temas em excesso e não aprofundar nenhum deles.
- Avaliar os encontros formativos só no fim do semestre ou do ano, impedindo assim que se identifiquem falhas e se façam adaptações ao longo do percurso.
Para orientar os coordenadores pedagógicos a elaborar um bom plano de formação, apresentamos a seguir as cinco etapas que devem ser seguidas:
1. Concepção
É o embasamento do projeto, que deve considerar as necessidades de aprendizagem dos alunos e dos professores imprescindíveis para a escola atingir as metas do projeto político-pedagógico (PPP). Para conceber o plano de formação, é preciso retomar as aspirações da comunidade e os objetivos por série ou ciclos em cada disciplina. Se um deles for desenvolver espírito crítico e autonomia dos jovens, os encontros formativos devem dar subsídios para o professor planejar a aula prevendo intervenções e a participação dos estudantes. Se está estabelecido que no fim do 2º ano as crianças serão capazes de escrever alfabeticamente, o foco dos encontros formativos dos professores das séries iniciais estará nas didáticas de alfabetização. "Comparar as expectativas com os resultados alcançados permite ao coordenador definir os rumos de seu trabalho", afirma Maria Josefa de Sousa Távora, coordenadora do grupo de pesquisa Currículo e Tecnologia Educacional da Universidade Estadual do Pará (UEPA).
De olho nas diretrizes
Durante a revisão do PPP da EMEI Antenor Honório Pizzol, em Venda Nova do Imigrante, a 120 quilômetros de Vitória, a coordenadora Rita Agostine constatou que o documento considerava a importância das brincadeiras para o desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças. Porém, os espaços e materiais utilizados não permitiam que essas intenções se concretizassem. No planejamento da formação, ela incluiu leituras e discussões sobre conceitos da primeira infância e como a creche e a pré-escola podem atuar nesse segmento. Nas três reuniões sobre o uso do espaço e dos materiais, os próprios educadores sugeriram a reformulação completa do pátio da escola. Em um mês, o local ganhou um acervo de brinquedos e objetos como panelas, barbantes, garrafas e cordas, que possibilitaram a diversidade de propostas para experiências sensoriais, corporais e artísticas. As paredes, antes vazias, receberam pinturas e demais produções das crianças.
2. Diagnóstico
Para decidir os conteúdos da formação, é fundamental conhecer as reais necessidades de aprendizagem dos estudantes para ajudar o professor a atender a elas. Três instrumentos facilitam esse processo:
o acompanhamento dos planejamentos (semestral, planos de aula, relatórios das atividades) e das avaliações, que revelam o conhecimento de cada professor sobre didática e como o utiliza na prática;
a análise das produções dos alunos (tarefas e cadernos), que indicam como eles interagem com a maneira como o professor ensina e com o conteúdo. "Muitas vezes a atividade está bem planejada, mas a turma não conseguiu entender o conteúdo e o seu significado", afirma Fátima Souza, professora da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). A organização de pastas por série e disciplina, com a cópia dos registros, facilita essa consulta;
os resultados das avaliações internas e externas, que possibilitam identificar as dificuldades e os avanços da garotada ao longo de um período.
Investigando a aprendizagem
A semana da coordenadora pedagógica Eliane Teixeira, da EMEF Ireno Antonio Berticelli, em Ariquemes, a 219 quilômetros de Porto Velho, começa com a análise do planejamento semanal dos professores. Ela anota em um caderno como cada docente tem usado os conteúdos da formação na prática. "Verifico o que eles compreenderam e o que ainda precisa ser trabalhado, e isso me ajuda a decidir a forma como os temas serão retomados: se avalio que um assunto não está claro para a maioria da equipe, planejo novas estratégias para abordá-lo nos encontros coletivos seguintes. Se apenas um ou dois professores estão com dificuldades em determinada questão, levo para reuniões individuais", explica Eliane.
Além disso, há um acompanhamento periódico das produções dos alunos com base nos assuntos trabalhados nos encontros. Assim, fica mais fácil detectar os avanços e as dificuldades e dar devolutivas que favoreçam a formação.
3. Estruturação
Depois de realizar o diagnóstico, o coordenador se vê diante de muitas demandas. Querer contemplar todas no projeto de formação é impossível, pois a abordagem seria rápida e superficial. É preciso, portanto, elencar prioridades com base nas informações coletadas nas etapas anteriores. A participação dos professores nesse processo garante que as expectativas estejam de acordo com a realidade e o ritmo de aprendizagem deles e dos alunos. O desafio agora é distribuir os assuntos no calendário de formação. Encontros coletivos semanais ou quinzenais, com duração mínima de duas horas, são o ideal. "O tempo dedicado a cada tema vai variar de acordo com o que os professores já sabem sobre ele", afirma Beatriz Gouveia, coordenadora de projetos do Instituto Avisa Lá, em São Paulo.
Em escolas com a segunda etapa do Ensino Fundamental e o Ensino Médio, se exige maior cuidado com a organização da rotina de formação, pois são necessários três momentos distintos:
- por área de conhecimento - Humanas, Exatas e Biológicas -, semanal ou quinzenal, para abordar as didáticas específicas. Pode ser feito pelo coordenador-geral quando não há coordenadores por área;
- por série, mensal, para discutir a evolução da aprendizagem das turmas; e
- geral, mensal, com a participação de toda a equipe docente.
Um bom projeto prevê ainda planos formativos individuais, baseados nas necessidades de cada docente, com reuniões para fazer a leitura crítica de projetos e sequências didáticas e sugerir leituras específicas.
A organização da agenda de formação exige a distribuição dos conteúdos em uma sequência lógica e o estabelecimento de um prazo para cada etapa ser cumprida, evitando o improviso e o desvio de foco. Atenção, pois isso não significa intransigência. "Se surgir uma questão pertinente não prevista inicialmente ou a necessidade de retomar conteúdos, é preciso ser flexível", afirma Dayse Gonçalves.
Depois, é hora de o coordenador prever os próprios estudos para se atualizar em relação aos conhecimentos e buscar materiais que contribuam para a aprendizagem dos docentes. "Ao lidar com professores especialistas, é provável que o formador aprenda sobre a didática específica ao mesmo tempo que ensina o professor. A meta, no entanto, é ele conquistar uma assimetria nessa relação a fim de oferecer mais ajuda aos docentes", declara Beatriz Gouveia.
Estudos segmentados
Na EM Bernardo Ferreira Guimarães, em Rio Piracicaba, a 142 quilômetros de Belo Horizonte, Elizara Aparecida Mendes e Andréa da Silva, respectivamente diretora e coordenadora pedagógica, montam um verdadeiro quebra-cabeça para planejar os encontros formativos dos professores do 6º ao 9º ano. "Fazemos reuniões quinzenais individuais. Nelas, tratamos das demandas particulares que surgem das análises dos registros e da observação de sala", afirma a diretora.
A equipe docente também participa de formações por área de conhecimento. Em 2013, três tardes por semana eram reservadas para essa finalidade. Este ano, os encontros serão à noite. A ideia é tratar das didáticas específicas e abordar temas que dizem respeito a toda a equipe, como indisciplina e história quilombola - conteúdo imprescindível para conhecer melhor a realidade da comunidade.
Acesse exemplo de plano de formação
4. Desenvolvimento
Aqui, o coordenador vai elaborar as pautas considerando a progressão da aprendizagem da equipe docente e uma sequência formativa que se desenvolva em três etapas:
- Problematização dos conteúdos Apresentação de questões desafiadoras aos professores para que eles reelaborem concepções e conhecimentos e transformem as ações propostas em situações de aprendizagem. "Às vezes o plano tem a intenção de fazer o professor estimular o aluno a ser um sujeito ativo em seu processo de aprendizagem, mas o próprio docente não faz isso durante a formação", alerta Beatriz Gouveia. Entre as estratégias formativas para que essa problematização seja bem-feita estão a tematização da prática, que discute e teoriza bons modelos registrados em vídeo ou texto; a dupla conceitualização que possibilita, ao mesmo tempo, a reflexão sobre o objeto do conhecimento e os processos de ensino e aprendizagem; e a observação de sala, para analisar como as concepções pedagógicas estão se materializando na prática.
- Sistematização É a síntese de tudo o que foi discutido no encontro. "Só assim os docentes consolidam suas reconceitualizações, deixando para trás ideias que não estão de acordo com as práticas pedagógicas adequadas", afirma Beatriz Telles, coordenadora pedagógica da Comunidade Educativa Cedac, em São Paulo.
- Institucionalização dos saberes Etapa em que as didáticas construídas e sistematizadas passam a figurar como conhecimento oficial do grupo e são usadas na sala de aula. Uma produção coletiva, orientada pelo coordenador, é a melhor forma de incorporar os novos saberes, torná-los referência para a equipe pedagógica e dar visibilidade ao processo da formação continuada.
O desenvolvimento dessas ações exige do coordenador a organização de uma rotina própria, na qual preveja, além dos momentos de estudos e planejamento das pautas dos encontros, o acompanhamento das ações desenvolvidas pelos professores, a devolutiva da análise dos registros e as entradas em sala de aula para observação.
Formação na prática
No início de cada semestre, a coordenadora Flávia Viana Pignataro, da EE Professora Noêmia Garcia Ciciliato, em Florínea, a 482 quilômetros de São Paulo, prepara um cronograma com os temas que serão tratados ao longo dos dois horários de trabalho coletivo que realiza por semana - um para Língua Portuguesa, outro para Matemática. "Elaboro uma sequência que leva em consideração o percurso da aprendizagem dos professores", conta Flávia, finalista da última edição do Prêmio Victor Civita Educador Nota 10.
Ao longo de 2012, ela trabalhou leitura e produção de contos. "Achei importante aprofundar os tipos de leitura - compartilhada, em voz alta e reconto - antes de iniciar a discussão sobre a escrita", afirma a coordenadora. "Para isso, reservei as seis primeiras reuniões."
Ela apresentou bons modelos de atividade, inclusive alguns realizados pela própria equipe, pediu que os professores lessem e produzissem um texto e, ao mesmo tempo, identificassem os comportamentos leitores e escritores envolvidos. Na observação de classe, ela anotou os procedimentos que não haviam sido bem incorporados à prática.
Flávia estabeleceu uma rotina semanal para analisar as atividades propostas escolhendo as que mais se relacionavam com os conteúdos dos encontros. Assim, definiu as entradas em sala de aula para fazer observação ou registros em foto e vídeo, que posteriormente iriam entrar em pauta.
Acesse exemplo da pauta de um encontro
Acesse exemplo da ficha de observação
Acesse exemplo da rotina semanal da formadora
5. Avaliação
O acompanhamento é uma etapa constitutiva do processo, pois permite ao coordenador aprimorar as estratégias utilizadas e identificar necessidade de mudança no percurso. Para tanto, é fundamental estabelecer, junto com os professores, os indicadores. "Se na formação em Arte discutimos a importância do uso dos diversos materiais e linguagens, os critérios de análise serão a variedade das atividades realizadas em sala, o envolvimento dos alunos com as propostas e o avanço deles em relação ao uso dos materiais", exemplifica Dayse Gonçalves.
Participação nos encontros, dúvidas levantadas e capacidade de estabelecer novas relações podem constar de uma tabela com todos os nomes em que, ao longo da reunião, o coordenador faça anotações.
Outro caminho é verificar as sequências didáticas, as avaliações e os registros, observando se as reconceitualizações estão presentes. As atividades dos alunos merecem atenção especial - afinal, o avanço das práticas pedagógicas só pode ser constatado quando há reflexo positivo na aprendizagem dos estudantes. Como é impossível olhar toda a produção da escola, uma opção é selecionar uma amostra por turma, de modo que no final do mês todas tenham sido avaliadas.
A autoavaliação contribui: "Ela é eficaz quando o coordenador compara as impressões dos professores com a produção de cada um", pontua Claudiene Dias da Silva, supervisora da Secretaria Municipal de Educação de Ariquemes, a 203 quilômetros de Porto Velho.
A frequência e duração dos encontros, o prazo de entrega dos relatórios, a qualidade e a variedade dos textos e vídeos apresentados e a organização do espaço são itens que podem ser avaliados em uma conversa com o grupo ou colocados em uma ficha específica para ser preenchida por todos.
Monitoramento coletivo
O trabalho de formação em Monteiro Lobato, a 132 quilômetros de São Paulo, é desafiador. No município, as escolas rurais são vinculadas a uma unidade urbana. Sob a coordenação de Deborah Arantes estão os professores e alunos do 1º ao 5º ano da instituição-sede, a EMEF Professora Elizabeth Coelho Micheletto, e de outras duas, as EMEFs São Benedito e Olivia dos Santos Feierabend - incluídas aí 15 salas de alfabetização.
Para dar conta das necessidades de todos os professores, a gestora aposta na avaliação contínua do processo formativo. No ano passado, o trabalho coletivo priorizou o desenvolvimento de procedimentos de escrita na produção de textos e na leitura. A análise das produções e dos cadernos dos alunos foi uma constante. "Eu li o planejamento e o registro das atividades dos professores e dei a devolutiva em encontros individuais", explica. Ela analisou também as reflexões que eles fizeram em dupla, no fim de cada encontro, para identificar se o conteúdo foi bem apropriado ou se era preciso retomá-lo. Além disso, Deborah instituiu a sondagem de hipótese de escrita como atividade permanente para as turmas de alfabetização, possibilitando a avaliação dos alunos.
Para conhecer a percepção dos professores sobre o trabalho desenvolvido, pediu que todos escrevessem um texto contando a maneira como os estudos contribuíram para a prática em sala de aula, os impactos na aprendizagem dos alunos e sugestões para o planejamento seguinte.
Acesse exemplo do mapa de saberes das turmas
Fotos: Omar Paixão