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Parece mentira: só tivemos uma mulher à frente do MEC

Como é difícil para uma professora brasileira chegar ao Ministério da Educação - e como não deveria ser

POR:
Paula Peres, Soraia Yoshida, Laís Semis
Crédito: Getty Images

Ainda que tenham um nível de formação superior ao dos homens, as mulheres brasileiras não ocupam nem metade dos cargos de gestão no Brasil. Estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que elas ocupam apenas 37,8% deles. Está crescendo? Não, caiu: eram 39% um ano antes e 39,5% há cinco anos.

Vamos conhecer - e valorizar! - as mulheres da nossa vida?

“Se existisse meritocracia, nós teríamos uma distribuição igualitária entre homens e mulheres nos cargos de direção", afirma Joana Chagas, gerente de programas da ONU Mulheres, braço na Organização das Nações Unidas que promove igualdade de oportunidades para as mulheres. "Se vivêssemos em uma sociedade igualitária, teríamos muito mais mulheres CEOs de empresas e cientistas, por exemplo”.

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Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2016 mostram que, enquanto 15,6% dos homens entre 25 e 44 anos estavam formados em 2015, o índice entre as mulheres era de 21,5%. Ou seja: há mais mulheres formadas, mas por alguma razão elas não sobem tanto na carreira quanto os homens. “Existe uma barreira invisível que impede as mulheres de chegarem ao topo”, considera a pedagoga Olga Freitas, doutoranda pela Universidade Nacional de La Plata, na Argentina.

Essa relação foi tema do estudo de Olga, “A feminização da Educação e a ocupação dos espaços de poder pela mulher: tetos de vidro e as contradições na gestão escolar”, que analisa dados de gestores da rede pública do Distrito Federal nas eleições de 2016. Na rede, todos os diretores e vices são eleitos pela comunidade escolar. Como não há o privilégio da indicação política, o formato permite liberdade de escolha e tem como eleitores, em sua maioria, mulheres.

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Infográfico: Lucas Magalhães

Infográfico: Lucas Magalhães

Nas entrevistas realizadas com os eleitores, critérios como honestidade, capacidade de diálogo e administração dos recursos financeiros e humanos foram levantados. Todos os pesquisados afirmaram que a escolha não estava relacionada ao sexo. Apesar disso, eles apontavam como diferença entre gestores homens e mulheres que os primeiros eram mais duros, racionais e inflexíveis, enquanto as mulheres eram mais afetivas, abertas ao diálogo e flexíveis. “As respostas são politicamente corretas. É unanimidade nos discursos que elas são tão capazes quanto os homens, mas o resultado das urnas contraria os discursos”, diz Olga na pesquisa.

O estudo revela que na Educação Infantil, 86% das equipes gestoras eleitas são formadas por mulheres. Não há chapas eleitas masculinas, mas em 14% das escolas, a gestão é formada por um homem na direção e uma mulher como vice. De acordo com a pesquisadora, há uma aceitação natural da gestão feminina nas escolas de crianças pequenas, mas com ressalvas. “Mesmo na Educação Infantil, em que a parcela de homens é muito baixa, quando há um homem na equipe, é ele quem gere a escola”, afirma.

Como é possível imaginar, os números vão ficando inversamente proporcionais à medida que os alunos crescem. Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, as chapas exclusivamente femininas passam a ser 78%; nos finais se reduzem a 57% e no Ensino Médio zeram. Nesta etapa, a maioria das chapas (45%) é formada por diretores homens e vices mulheres, enquanto o inverso (diretoras mulheres e vices homens) soma 33% e as chapas exclusivamente masculinas são 22%.

A pesquisadora Olga Freitas analisou a composição feminina nos cargos de direção da rede pública do Distrito Federal. Crédito: Acervo pessoal

Em um segundo momento, Olga Freitas questiona por que as mulheres não se candidatavam ou não ganhavam nessas etapas. “A fala é de que é preciso pulso firme porque os adolescentes são mais difíceis e é preciso alguém para impor a moral”, explica. Outro fator era o desafio de conciliar as demandas de gestão da escola à jornada doméstica-familiar. “Ceder esse lugar para o homem tem a ver com saber o quanto é difícil ter disponibilidade de tempo para vivenciar esses espaços. Mas é também uma forma que ajuda a reproduzir o sexismo”, analisa Sandra Unbehaum, pesquisadora da Fundação Carlos Chagas (FCC), uma das autoras dos estudos "O Gênero nas Políticas Públicas no Brasil" e "Tesauro para Estudo de Gênero e Sobre Mulheres".

Em instâncias como secretarias de Educação e o próprio Ministério da Educação (MEC), a desigualdade de gênero fica ainda mais clara. “São cargos de gestão, de predominância do espaço público, lugar em que os homens foram ensinados historicamente a estar, e as mulheres, não”, diz Amélia Artes, também pesquisadora da FCC, onde integra o Núcleo de Relações de Gênero, Direitos Humanos, Raça e Etnia.

Nos municípios que integram a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) – e que atendem, em sua maioria, Educação Infantil e anos iniciais do Fundamental – a relação acompanha o fluxo de mulheres na gestão. Em 2017, 72,2% dos que ocupavam o cargo de secretário municipal de Educação eram mulheres. Já dos 27 secretários estaduais (instância que comumente atende anos finais do Fundamental e Ensino Médio, quando os homens aparecem com mais frequência, mas não em maioria), são apenas 8 mulheres.

Finalmente, entre os 58 ministros que passaram pela pasta da Educação desde a década de 1930 (incluindo interinos), apenas uma foi mulher: Esther de Figueiredo Ferraz, que ocupou a cadeira por 2 anos e 8 meses, durante o governo de João Figueiredo, ainda durante a ditadura militar. “Temos inúmeras mulheres com competência para esses cargos, mas elas serão preteridas com frequência em relação ao homem”, aponta Macaé Evaristo, ex-secretária de Educação de Minas Gerais. “Os mecanismos de composição dos governos também passam pelas composições políticas. Temos um número baixíssimo de representação feminina no Legislativo, o que interfere nessa composição dos ministérios”, diz. Para ela, há uma transformação que poderia ser iniciada ao aproveitar melhor as oportunidades – como a eleição para diretor de escola e o cenário político – para empoderar as mulheres. “São medidas oportunas para mudar essa relação. A representatividade feminina é muito importante, precisamos defender a presença das mulheres nos espaços públicos”, acredita.

A primeira e única mulher no cargo de Ministro da Educação, Esther Figueiredo. Crédito: J. Moura/EBN

Na avaliação de Maria Helena Guimarães de Castro, secretária-executiva do MEC, cargo mais elevado de nossa Educação ocupado por uma mulher atualmente, as últimas décadas ampliaram a participação e o respeito às mulheres nos espaços de poder, mas ainda há trabalho a ser feito. “Hoje as mulheres estão cada vez mais qualificadas e preparadas. Mas essa qualificação crescente precisa ser reconhecida e valorizada pelo mercado de trabalho”, afirma.

Para ampliar a participação das mulheres nas políticas públicas, a secretária-executiva do MEC acredita que o Brasil poderia se inspirar nas medidas de países desenvolvidos. Na França e no Canadá, os ministérios foram divididos igualmente entre homens e mulheres. Na Finlância, a representação feminina no Parlamento é de 42%, na Suécia, 44%, de acordo com dados de 2015 do Banco Mundial

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