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Livros infantis que disparam boas conversas em sala de aula

Veja 15 indicações de leituras e saiba o que levar em conta na hora de escolher uma história para contar à sua turma

POR:
Soraia Yoshida, Laís Semis
Ilustração de Bruna Assis Brasil para o livro 10 Bons Conselhos do meu Pai, de João Ubaldo Ribeiro   Foto: Divulgação

Os livros infantis estão entre os materiais mais usados em sala de aula na Educação Infantil e nos primeiros anos do Ensino Básico. E por uma razão importante: eles podem compor um universo de temas que o professor quer trabalhar com as crianças e ampliar seu vocabulário e compreensão. “O livro é um ‘disparador’ para que as crianças possam pensar sobre algumas coisas, como respeito, o outro e aquilo que que é diferente”, diz Denise Tonello, orientadora educacional e pedagógica do 1º ciclo Ensino Fundamental 1 no Miguel de Cervantes, em São Paulo. Segundo ela, principalmente na faixa até o 3º ano, as histórias são importantes para trabalhar essa reflexão das crianças sobre vários assuntos.

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Para o professor, tão interessante quanto as histórias que o livro conta é o que essa leitura trará para a turma. “A literatura ajuda no desenvolvimento da linguagem, na ampliação do vocabulário, além de despertar sentimentos, emoções, desenvolver a imaginação, a criticidade, proporcionar experimentar mundos novos de modo significativo e prazeroso”, afirma a professora Samantha Ishikawa, do Colégio Santa Maria. Nesse processo, durante ou após a leitura, é crucial ouvir as crianças, para que digam qual é o seu entendimento. “Às vezes a gente se surpreende com o que elas enxergam naquela história”, afirma Denise. Ela reforça que as histórias são importantes, mas as crianças também precisam ver exemplos na vida real. “Não adianta pegar um livro bom, ler com os alunos e achar que já fez sua parte. É importante dar voz para a criança e perceber o que e como ela entende a história”.

O educador precisa estar ciente que não é uma questão de escolher o livro somente preso a ensinamentos moralizantes. “Trocar impressões, aguçar percepções, demorar-se em uma página, voltar e reler trechos provocadores são situações muito mais valiosas do que buscar mensagens, na maioria das vezes, reducionistas”, destaca Cristiane Tavares, mestre em Literatura e Crítica Literária pela PUC-SP e coordenadora do curso Livros, crianças e jovens: teoria, mediação e crítica, no Instituto Vera Cruz.

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Nesse contexto, se o professor tem um tema claro de conversa que deseja puxar com a turma, vale questionar se a escolha do livro contempla o tema como estereótipo ou em suas sutilezas. “Via de regra os livros que disparam as melhores conversas com as crianças não são aqueles que necessariamente tratam do tema de forma direta”, pondera Cristiane. Um livro que foi programado para falar sobre preconceitos, por exemplo, pode sustentar e perpetuar estereótipos, mesmo que não intencionalmente.

“Ao escolher os livros, os professores preocupam-se muito com a linguagem explícita e com as imagens, se o livro é visualmente interessante e se o vocabulário é de fácil compreensão para a faixa-etária”, diz Samantha. Embora a preocupação seja legítima, outros cuidados devem ser tomados considerando o tema, a ampliação do vocabulário e os significados das palavras e as próprias interpretações que podem ser feitas a partir da leitura.

Ilustração do livro infantil Esperando a Chuva, de  Véronique Vernette   Foto: Divulgação



Abordagens questionáveis
Nesta semana, por exemplo, uma cartilha com a proposta de apresentar hábitos alimentares prejudiciais à saúde e a contra obesidade infantil foi distribuída para crianças em São José dos Campos (SP). O material associava gordo a botijão. A abordagem foi considerada preconceituosa e agressiva. Em 2017, outro tema causou repúdio. O livro Peppa, de Silvana Rando, suscitou muitas discussões e foi retirado de circulação. A proposta era discutir como as crianças, por vezes, acabam deixando de aproveitar a infância ao se obrigar a seguir determinados padrões. O sonho da protagonista Peppa é ter um cabelo liso. Mas para chegar até a proposta, a personagem passa por situações e comparações que muitos consideraram ofensivas apesar da autora não ter tido a intenção e alguns leitores não enxergarem problemas na forma como o texto trabalha a questão. Os cabelos de Peppa, por exemplo, eram descritos como “feitos de aço”, o que remeteu comparações entre cabelos crespos e palhas de aço (ou Bombril) – expressão geralmente usada de forma ofensiva para falar dos cabelos de meninas negras.

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“Dependendo de como o livro surgiu, ele não vai ter um bom efeito, pois parte de um estereótipo”, defende Cristiane. “É melhor um livro que não tem essa conversa editorial, mas que foi escrito por um autor negro, por exemplo”. Samantha concorda e acrescenta que além de considerar a história de vida do autor, é interessante compartilhar esse conteúdo com os alunos após a leitura. “Além de se familiarizar com o autor, isso abre a possibilidade de compreenderem melhor a intencionalidade do professor com essa ação”, diz. A professora também indica que a forma como a linguagem é abordada no livro infantil é fundamental para o seu sucesso ou seu fracasso. “Por isso, é fundamental que o professor analise bem a linguagem apresentada pelo livro”.

Para Cristiane, a leitura compartilhada com crianças pode ser disparadora de boas conversas sobre os mais variados assuntos. “Mas conversar sobre livros é, antes de tudo, uma experiência estética. Na maioria das vezes, os não-ditos são extremamente significativos”, considera. Por esse motivo, a conversa pode estar baseada em outros elementos que não a mensagem em si. O ‘disparador’ pode estar nas ilustrações, na construção textual ou no próprio projeto editorial.

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Além disso, Samantha destaca que, muitas vezes, é a partir das perguntas dos professores que os livros trazem essas boas conversas e os alunos percebem o que está nas entrelinhas. Para isso, é importante aguçar a curiosidade dos alunos em relação ao tema. Ela indica que é possível conversar antes da leitura sobre o título, imagens de capa e contra-capa e até mesmo o próprio conteúdo. A troca entre perspectivas dos alunos também é importante nesse processo. “Isso é fazer a predição, é envolver os alunos na tentativa de estabelecerem relações. Depois a história será contada e confirmarão ou não suas hipóteses iniciais”, diz.

A seguir selecionamos alguns livros indicados pelas entrevistadas desta reportagem. No entanto, sobre a lista de bons autores e livros, Cristiane acrescenta: “Uma lista é sempre uma lista - reduzida e incompleta, ponto de partida, nunca de chegada!”.

1. Dez bons conselhos do meu pai
João Ubaldo Ribeiro – Companhia das Letras
O livro elenca valores a partir dos conselhos que o pai do escritor lhe deu: seja verdadeiro, pense no que você faz, nunca seja medroso... Durante a leitura, o professor pode explicar a razão desses conselhos para as crianças e trabalhar a questão dos valores e da importância de ouvir os mais velhos.

2. O sol se põe na tinturaria Yamada
Claudio Fragata – Editora Pulo do Gato
Ao retornar à cidade na qual passou a infância, o senhor Yamada faz uma viagem ao tempo com o neto a partir de poesias e de uma velha cantiga. A partir da leitura, é possível trabalhar a relação afetiva com os livros, poesia, família, cotidiano e até com a própria escola.

3. Roupa de brincar
Eliandro Rocha –  Editora Pulo do Gato
Indicado tanto para uma leitura compartilhada quanto para quem está começando a ler sozinho, a obra conta a história de uma menina que tinha como a melhor diversão o guarda-roupa da tia. É um livro para se trabalhar as relações familiares, fantasia e realidade, olhar infantil, brincadeiras, mudanças e superação.

4. Maria vai com as outras
Silvia Orthof – Editora Ática
Maria era uma ovelha que sempre fazia o que as outras ovelhas faziam. E se uma ovelha faz algo que não deveria e as outras copiam? É um livro que faz a criança pensar por ela, o que é certo e o que é errado.

5. O pote vazio
Demi – Martins Fontes
O imperador busca um sucessor e decide distribuir sementes a todas as crianças, para que cultivem flores, dizendo que uma delas será escolhida. A história trabalha a questão do fracasso e da honestidade, com ilustrações e texto primorosos.

6. O Reizinho Mandão
Ruth Rocha - Saraiva
O personagem do título é um menino que vive dando ordens aos outros e só faz o que quer. É uma história para que o professor trabalhe a questão do coletivo, lembrando às crianças que em casa pode ser uma coisa, mas no dia a dia com o grupo e na escola é preciso dar espaço ao outro.

7. Valores para convivência
Esteve Pujol - Pons
Coletânea de contos que falam de respeito, justiça, desigualdade. A partir dos temas, o professor pode discutir com as crianças quais são os valores que consideram importantes em suas vidas.

8. O Livro das Virtudes para Crianças
William J. Bennet – Nova Fronteira
Dois volumes com contos, em que cada história trabalha uma virtude. A leitura ajuda as crianças a reconhecer os bons valores.

9. Não fui eu!
Brian Moses – Editora Scipione
É um livro para tratar a questão da honestidade, a partir da história do menino que não assume aquilo que fez.

10. Pode pegar!
Janaína Tokitaka – Boitatá
A obra aborda de forma sutil a identidade do gênero a partir de uma questão muito presente desde o nascimento das crianças: existe roupa de menino e roupa de menina? O questionamento sobre os costumes culturais é feito a partir de dois coelhos, um de saia, batom e sapatinho de salto e de botas, calça e gravata.

Ilustração do livro infantil Tenho Medo, de Ivar da Coll    Foto: Divulgação



11. Tenho medo
Ivar da Coll – Livros da Matriz
Eusébio não consegue dormir por ter medo dos monstros que se escondem em lugares escuros. Para se proteger dos perigos da noite silenciosa, ele conta com um amigo. A obra trata da confiança e da importância da amizade para vencer os medos – mesmo que sejam imaginários.

12. Minhas duas avós
Ana Teixeira – Pólen
O tema central é o das diferenças. A autora faz uma ponte, tanto no texto, quanto nas imagens do livro entre sua própria vida e a ficção. A história fala sobre duas mulheres muito diferentes, que vivem juntas em um universo lúdico.

13. Vazio
Catarina Sobral – Ed. 34
Este é um dos títulos que não fica restrito à história escrita l – até porque se trata de um livro sem palavras. A partir de recortes, pinceladas, carimbos e garatujas, a autora cria uma fábula visual que permite vários níveis de leitura sobre o sentimento do vazio.

14. Esperando a chuva
Véronique Vernette – Editora Pulo do Gato
Afinal, vai chover ou não? Nesse livro, a autora explora a necessidade do homem de se adaptar à força da natureza. O texto em primeira pessoa também ajuda as crianças a se identificar com os pensamentos da personagem.

15. Migrando
Mariana Chiesa Mateos –  Ed. 34
Neste livro também sem palavras, a autora aborda um tema cada vez mais presente dentro das escolas: a imigração. A leitura pode ser iniciada pela capa ou contracapa: tem dois inícios com duas histórias de imigração paralelas que se cruzam em seu interior.

E no seu caso, professor, quais livros infantis já dispararam boas conversas com a sua turma? Compartilhe suas indicações nos comentários!