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Reflexões de um professor na retomada presencial da Educação Infantil durante a pandemia

Desafios incluem evitar contatos físicos e o compartilhamento de objetos, e ainda não perder o olhar pedagógico no momento de construir práticas que façam sentido dentro da realidade complexa que estamos vivendo

POR:
Evandro Tortora
Crédito: Getty Images

Começo esse texto sabendo que vários colegas pelo Brasil afora que trabalham com Educação Infantil permanecem em atendimento remoto. Porém, há aqueles que, assim como eu, já retomaram as atividades presenciais com as crianças. 

Resolvi, então, usar esse espaço para compartilhar algumas experiências e reflexões relacionadas ao meu retorno. 

Passei mais de um ano afastado das atividades presenciais na minha escola.

Assim como todos os professores e professoras do país, permaneci trabalhando muito para que a Educação Infantil continuasse acontecendo de alguma forma, ainda que não presencialmente. Nesse tempo, todos nós aprendemos sobre tecnologias, sobre meios de interação de forma remota, desenvolvemos uma sensibilidade além da conta para tratar de assuntos que tocavam em dificuldades que as famílias enfrentavam... Enfim, foram diversas as atitudes necessárias para dar conta dessa nova realidade que apareceu diante de nós. 

Assim, pensando na retomada gradual das atividades escolares presenciais que começa a tomar forma em algumas partes do país, sabemos que vários profissionais têm se empenhado muito para que esse retorno aconteça da maneira mais segura possível, seguindo todos os protocolos orientados pelas autoridades sanitárias.

Nesse sentido, algumas condutas como o uso de máscaras, distanciamento físico, disponibilização e uso de álcool gel, lavagem constante das mãos, não compartilhamento de objetos, e medição de temperatura na entrada das escolas, passaram a fazer parte do cotidiano dos educadores. 

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Esse curso exclusivo procura responder questões como: quais propostas priorizar no retorno, levando em conta a Base Nacional Comum Curricular (BNCC)? Como acolher os estudantes e famílias? E de que forma envolver o grupo de professores para fortalecer a escola?


Reflexões iniciais e principais incômodos do retorno presencial

Na escola de Educação Infantil em que trabalho, retomamos as atividades presenciais há algumas semanas. Por aqui, temos sido bastante rigorosos com relação aos protocolos, e mais do que isso, temos desempenhado várias atividades pedagógicas para que as crianças possam compreender a importância de seguir essas diretrizes sanitárias. Além disso, estamos dando um apoio emocional aos pequenos, para que possam compreender que o espaço que existia anteriormente à pandemia foi totalmente repensado, e que agora é preciso utilizá-lo sob outras orientações.

Nesse retorno, as crianças brincam em mesas separadas e, quando tentam, quase que instantaneamente, compartilhar algum objeto (algo que parece natural para elas), eu tenho que tomar a atitude de orientá-las para que evitem esse tipo de comportamento. Essa é uma das coisas que mais tem me incomodado atualmente; afinal, educamos os pequenos para solidariedade, parceria e companheirismo, e em momentos como esses em que precisamos evitar o compartilhamento de objetos, fica em mim a sensação de que estamos indo na contramão desses valores.

A melhor solução para lidar com tudo isso tem sido dizer para as crianças que essa é uma situação passageira e que, no futuro, tudo isso vai passar e vamos poder brincar juntos novamente com os nossos brinquedos.

Essa, aliás, não é uma fala direcionada apenas às crianças – mas serve para mim também! Afinal, assim como elas, estou aprendendo a lidar com essa nova realidade em que estamos inseridos.

Além disso, enquanto professor de crianças, outro ponto que me incomoda bastante atualmente é o fato de não podermos nos abraçar!

Para algumas crianças, é quase automático o ato de abrir os braços e vir em nossa direção após termos ficado tanto tempo sem nos ver. Me dói muito dizer para a criança que não vou poder abraçá-la, após chegar tão perto e já de braços esticados! Batemos os cotovelos, ou os pés, e temos evitado ao máximo ter mais contato físico do que isso, por conta das medidas de segurança. Nesse caso, assim como tenho feito em relação ao compartilhamento de objetos, procuro dizer às crianças que este não é o momento de nos abraçarmos, mas que no futuro voltaremos a estar juntinhos, assim como fazíamos antes da pandemia.

Minha análise a partir desse cenário é que eu, de fato, compreendo que evitar o compartilhamento de objetos e os abraços são novas formas de desempenhar nossas atividades docentes nesse momento, e precisamos nos adaptar a esta nova perspectiva. Porém, trata-se de algo momentâneo: são coisas que não podem ser naturalizadas por nós educadores. 

Atividades de Educação Infantil: Planejamentos alinhados à BNCC

Nesse curso, você conhecerá experiências e indicações que ajudam a realizar um planejamento completo e alinhado à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), além de plenamente voltado aos interesses e à perspectiva das crianças que frequentam a Educação Infantil.

“Protocolos pedagógicos”

Após esse relato inicial, é importante dizer que entendo que estamos trabalhando para manter a segurança das crianças seguindo os protocolos sanitários, mas devemos ficar atentos também aos “protocolos pedagógicos”. 

Esta é uma expressão dita por uma querida amiga professora, que me propôs a reflexão que agora compartilho com vocês.

As peculiaridades das práticas pedagógicas na Educação Infantil devem ser levadas em consideração ao se pensar em um retorno presencial. Coloco aqui uma especial atenção àquelas crianças que estão indo à escola pela primeira vez, e que estão ainda se apropriando das práticas que são novidades tanto para elas quanto para nós!

Na escola em que trabalho, tivemos uma postura de acolhimento e liberdade nas primeiras semanas. Ao invés de propor algumas práticas aos pequenos, eu passei a perguntar “o que você gostaria de fazer?”. A partir dessa pergunta, investigamos os interesses das crianças e começamos a propor novas práticas!

Adaptações estão acontecendo, mas os planejamentos estão sendo executados dentro do possível a partir do diálogo entre famílias, crianças, docentes e equipe gestora. Já há alguns textos, venho dizendo que deveríamos participar dessas discussões, e tal diálogo pode ter reflexo positivo nesse retorno presencial.

Na medida do possível, estamos tentando desenvolver um trabalho em que os direitos das crianças sejam preservados, inclusive dando às famílias a opção de enviar as crianças à escola ou de esperar um pouco mais. As famílias ainda têm medo desse retorno e, por aqui, a maioria delas têm preferido aguardar um pouco mais.


Acredito que o temor seja perfeitamente compreensível, e não sou imparcial quando as famílias perguntam a minha opinião: por mais cuidado que estejamos tendo, acredito que protocolos sanitários não foram feitos para crianças tão pequenas conseguirem respeitá-los à risca.

Pequenos deslizes podem acontecer, mas temos conversado, feito brincadeiras, contado histórias, entre outras atitudes, tudo para convencer as crianças da importância de seguir os protocolos em prol da nossa saúde.

Para além desse trabalho, ressalto aqui algo de essencial que todos nós precisamos trabalhar com as nossas crianças: há muitas novas demandas vindas desse tal de “novo normal” que surgiu junto com a pandemia; contudo, nunca se esqueçam de salientar para as crianças que tudo isso vai passar, e que há muita gente trabalhando para possibilitar que esse “novo normal” passe logo!

Não deixem que as crianças percam a vontade de compartilhar, de estar junto, abraçar, cochichar no ouvido, assoviar, enfim, essas e outras tantas ações que nos são valiosas, só não podem acontecer nesse momento.

Além disso, não deixem também de colocar em seus planejamentos que o distanciamento, o uso de máscaras, e outras tantas ações são novos atos de demonstrar amor, carinho e amizade por aqueles que queremos perto de nós! Voltaremos a falar sobre esse assunto em outros textos, então espero vocês numa próxima reflexão.  

Abraços carinhosos e se cuidem!

Evandro

Evandro Tortora é professor de Educação Infantil há 7 anos na Prefeitura Municipal de Campinas, licenciado em Pedagogia e Matemática e doutor em Educação para Ciência pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) de Bauru. Além da docência na Educação Infantil, tem experiência com pesquisas na área da Educação Infantil e Educação Matemática, bem como desenvolve ações de formação continuada para professoras e professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental.

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