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Parceria entre professores e gestores favorece boas práticas de avaliação

Saiba como promover um trabalho colaborativo e constante entre educadores e coordenadores para melhorar o planejamento e favorecer o avanço das aprendizagens

POR:
Ingrid Yurie
Foto: Getty Images

As avaliações são fundamentais para o professor acompanhar o desenvolvimento dos estudantes e planejar os próximos passos e intervenções.

Mas, se o docente puder contar com o apoio do coordenador pedagógico para isso, as possibilidades de ofertar um instrumento avaliativo de qualidade se ampliam.

A partir de formações e reflexões conjuntas sobre avaliações internas e externas, é possível repensar o projeto pedagógico e aprimorar o processo de ensino e aprendizagem.

“O coordenador pedagógico tem um olhar à frente e para o todo, possibilidade que os professores, sozinhos, não têm”, afirma Joice Lamb, coordenadora pedagógica na EMEF Professora Adolfina J. M. Diefenthäler, em Novo Hamburgo (RS).

Para que essa parceria seja possível, a gestão escolar deve acompanhar os educadores cotidianamente. “É preciso assegurar na rotina um ambiente de formação, de apoio e de incentivo para os professores terem expectativas de aprendizagem [

de seus alunos] bem definidas e analisarem os resultados das avaliações a partir disso. Se não, instaura-se um clima de perseguição, não de colaboração”, alerta Angela Luiz Lopes, coordenadora pedagógica da Comunidade Educativa Cedac.

Como fazer uma boa formação

A formação dos professores para trabalhar a partir de novas concepções de avaliação esbarra nas experiências iniciais que esses educadores tiveram enquanto estudantes e que agora transportam diretamente para as suas salas de aula.

É isso que explica Cipriano Carlos Luckesi na obra Avaliação da aprendizagem: componente do ato pedagógico.

Assim, se foram acostumados a ser avaliados praticamente apenas por provas somativas, recebendo uma nota só no final do processo, com um caráter punitivo e classificatório, é difícil que façam algo diferente com seus alunos. 

Para provocar reflexões e construir mudanças, uma estratégia é tentar colocá-los na mesma situação dos estudantes e pedir, por exemplo, para os professores compartilharem com os gestores como se sentem ao receberem, ao final de processos, apenas feedbacks quantitativos, que pouco orientam e informam sobre sua aprendizagem. 

Há outros caminhos, mas todos partem da identificação dos conhecimentos e experiências prévias da equipe docente.

“É preciso começar as formações descobrindo o que o grupo de professores pensa sobre avaliação. E atuar na reflexão e na experimentação de como ela pode oferecer pistas sobre como os estudantes aprendem e o que eles já sabem, a fim de planejar em conjunto como continuar a partir desses resultados”, orienta Angela.

Também é importante que os educadores conheçam profundamente outras modalidades e instrumentos avaliativos, que contemplem uma diversidade de linguagens e de oportunidades para os estudantes demonstrarem seu desenvolvimento em múltiplas dimensões.

“Um único instrumento e uma única forma de avaliar não dá conta da complexidade dos saberes de cada aluno”, ressalta Luciane Palma, coordenadora pedagógica da Secretaria Municipal de Educação de Campinas (SP) e pesquisadora doutoranda no Laboratório de Observação e Estudos Descritivos (LOED) da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Trocas entre docentes e coordenadores

Nas formações, vale incentivar as trocas de experiência entre professores: o que dá certo para um pode funcionar para outro.

A coordenadora pedagógica Joice também lembra que há casos em que uma única avaliação não serve para todas as turmas, ainda que sejam os mesmos objetivos de aprendizagem e componentes curriculares.

“O coordenador pedagógico pode auxiliar a identificar o perfil de cada turma e as melhores formas de avaliá-la.”

José Luiz Pastre, coordenador pedagógico na EMEFEI/EJA Dr. João Alves dos Santos, em Campinas, conta que promover trocas entre orientadores pedagógicos de diferentes unidades escolares também foi muito produtivo.

Com isso, a equipe conseguiu transformar as tradicionais provas semestrais em uma avaliação temática construída pelos educadores de forma coletiva, que promove mais aprendizagens e permite torná-las mais visíveis, inclusive para os próprios estudantes.

“É um direito deles saber o que está sendo avaliado, que pontos são importantes do que está sendo discutido em sala e onde precisam se desenvolver.”

Com os professores que acompanha, o coordenador preza por estabelecer descritores comuns de avaliação, o que facilita desenvolver o trabalho coletivo para atingir os objetivos do currículo – normalmente ligados às habilidades e seus respectivos objetivos de aprendizagem – e do Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola.

Todos os professores são orientados, por exemplo, a observar se os estudantes conseguem se expressar de forma escrita.

Eles também analisam juntos os próprios instrumentos de avaliação, o clima de convivência e as condições de trabalho, que impactam diretamente a qualidade da Educação. 

Para apoiar formações docentes sobre avaliação, NOVA ESCOLA preparou um roteiro formativo para professores e coordenadores pedagógicos sobre avaliações externas. Confira:

baixe roteiro formativo

Além de momentos formativos específicos, reuniões de planejamento e trocas cotidianas também podem ser ricas oportunidades de formação e de estreitamento da parceria.

Rômulo Bezerra da Silva, coordenador pedagógico da EM Sarah Kubitschek, em Açailândia (MA), costuma analisar em detalhe com os professores as avaliações que eles prepararam antes de aplicá-las.

Quando chegam os resultados, eles tentam identificar quais estratégias foram mais bem sucedidas e definem juntos os passos seguintes.

Esse olhar externo ajuda os professores a analisarem e entenderem quando há uma dificuldade geral da própria turma e o que fazer em relação a isso, identificando se é uma falha nas estratégias pedagógicas ou se são questões individuais de cada estudante. “O que o aluno vivencia fora da escola influencia no seu processo de aprendizagem, e muitos deles estão passando por dificuldades econômicas, insegurança alimentar etc. Tudo isso também precisa ser olhado a partir dos resultados das avaliações, porque a escola pode tentar ajudá-los”, diz Rômulo.

Glossário
Confira o significado dos principais termos utilizados quando o assunto é avaliação externa ou em larga escala

Habilidades: Expressam as aprendizagens essenciais que devem ser asseguradas aos estudantes nos diferentes contextos escolares. 

Descritores: São a associação entre os objetos de conhecimento e as competências e habilidades aprendidas pelos alunos. Os descritores determinam o que os itens da prova devem cobrar dos estudantes, de acordo com o ano e/ou o ciclo cursado.

Em Matemática, por exemplo, uma questão sobre probabilidade pode ser especificada pelo descritor “resolver problemas envolvendo o cálculo da probabilidade de um evento”.

Objetivos de aprendizagem: Descrevem os conhecimentos, conceitos, habilidades e processos que os estudantes devem saber, compreender e serem capazes de fazer em determinada etapa de sua escolaridade.

O conjunto de objetivos de aprendizagem ao longo da Educação Básica representa o que deverá ser aprendido e retrata a trajetória de desenvolvimento dos estudantes.

A sequência de objetivos de aprendizagem oferece ao professor um quadro de progressão em cada área do currículo, apoiando o planejamento, o monitoramento e a análise das aprendizagens e do desempenho dos estudantes.

Eles também ajudam a saber o que avaliar em cada etapa e dar coerência às avaliações externas.

Gabarito: Trata-se da alternativa com a resposta correta em uma questão ou um item de múltipla escolha.

Distratores: São alternativas razoáveis, porém incorretas, em uma questão de múltipla escola. Elas visam identificar o estudante que não tenha desenvolvido de forma adequada a habilidade contemplada na questão ou no item e, por isso, seleciona uma das alternativas erradas.

Ainda que falsas, nenhuma das respostas erradas pode ser absurda. Ou seja, um distrator plausível parece uma resposta correta para aqueles que não conseguem atingir o objetivo do descritor e, por isso, tem importante função pedagógica.

Fontes: Base Nacional Comum Curricular (BNCC); Guia de referência para o planejamento e redação de objetivos de aprendizagem; Avaliação em sala de aula: conceitos e aplicações, de Michael K. Russel e Peter W. Airasian; O Saeb e a agenda de reformas educacionais: 1995 a 2002, de Maria Helena Guimarães Castro.

Avaliação externa

Além das avaliações elaboradas pelos professores, a gestão também deve orientar a equipe em relação às avaliações externas, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb).

Os resultados dessas avaliações costumam gerar uma pressão para os professores “prepararem” os alunos para irem bem nessas provas e conseguirem um bom posicionamento da rede de ensino.

No entanto, esse não é o cenário ideal, tanto por desvirtuar os resultados quanto por gerar uma pressão desnecessária sobre docentes e estudantes. Com o apoio da gestão e das formações, a ideia é mudar as concepções acerca dessas provas e aproveitá-las para melhorar a qualidade do processo de ensino e aprendizagem. 

Como um retrato da educação nacional, os resultados das avaliações externas balizam as políticas públicas e os investimentos com o intuito de promover patamares de qualidade minimamente equitativos para todos os estudantes brasileiros.

“Já na escola, essas avaliações precisam ser compreendidas como um elemento a mais para compreendermos se as condições básicas para o ensino e a aprendizagem estão ou não sendo asseguradas”, explica Angela. Não se trata, portanto, de avaliar pontualmente o desempenho de um professor ou da turma de forma descontextualizada.

Para que essa compreensão sobre a avaliação externa seja possível, é preciso engajar todos os professores em dois processos: um anterior à análise dos resultados e outro posterior a ela.

Por exemplo, primeiramente, estudar a matriz de referência da prova, os descritores de habilidades esperadas dos estudantes e exemplos de questões e analisar os resultados dos anos anteriores e o que foi feito entre a última avaliação e a atual para melhorar a aprendizagem dos alunos. Já a análise posterior é fundamental para a tomada de decisões em busca de melhorar as aprendizagens.

É importante também deixar bem claro que, embora a avaliação externa tenha como foco alguns anos específicos, ela busca aferir toda a trajetória escolar dos estudantes, desde a Educação Infantil. Todos são responsáveis pelo resultado, não um professor ou outro”, reforça Angela. 

O papel de cada um no processo

Se o trabalho dos professores é validado coletivamente e acompanhado de perto pela gestão escolar, a avaliação externa causa menos ansiedade nos docentes. “Porque eles estão seguros de que fazem o melhor que podem. Estando seguros, eles também não passam essa ansiedade para os alunos”, destaca Joice. 

Para ajudar nesse processo, ela conversa com as turmas um mês antes da data da aplicação para explicar o objetivo da prova, o histórico da escola com a avaliação e o que se espera deles. “Sempre digo que não queremos que eles tirem dez, mas que se concentrem e deem o melhor de si. Qualquer resultado serve para avançarmos, desde que a gente tenha segurança de que é um retrato fiel da escola.”

A coordenadora pedagógica conta que não abre mão da presença dos professores na sala durante a aplicação da prova. Entre 2013 e 2015, a escola teve um salto nos resultados do Saeb, essencialmente porque, segundo ela, os alunos estavam mais seguros no dia da prova ao terem o professor de referência presente. “O preparo dos estudantes se limita a essas conversas. No máximo, ensinamos a riscar um cartão de respostas e fazemos jogos com questões similares às da prova, só para quebrar a tensão.”

Quando os resultados das avaliações externas chegam, é preciso encará-los da mesma maneira que os das avaliações internas. “Não é um resultado final, mas pistas para continuar”, finaliza Angela.

Como usar os resultados das avaliações externas
Confira sugestões do que pode ser feito e evitado para melhorar as condições de ensino e aprendizagem

O que fazer: 

  • Propor trocas e formações entre escolas. Estratégia utilizada pelo Ceará, ajudou a melhorar a equidade entre as unidades do estado.
  • Reconhecer as conquistas. Além de valorizar o trabalho dos professores, conversar com a equipe sobre o que eles acham que ajudou a melhorar um dos índices pode oferecer pistas de como avançar em outros aspectos.
  • Estudar e planejar. Promova formações para analisar os resultados em equipe e considerar o que pode ser feito a partir disso. Por exemplo, repensar o currículo, ofertar formação continuada em determinada área, aumentar o quadro de professores, diminuir a quantidade de alunos por turma, criar espaços e tempos de trabalho coletivo de avaliação e planejamento, mudar metodologias, entre outros. 
  • Compartilhar os resultados e o planejamento. Tanto com os professores quanto com os estudantes e seus familiares. Afinal, todos fazem parte desse trabalho e podem contribuir com o planejamento e sua execução.

O que não fazer: 

  • Separar as turmas por desempenho. Além de responsabilizar os alunos pelo resultado e gerar discriminação entre eles, essa prática desconsidera que se aprende mais e melhor na diversidade.
  • Culpar estudantes e professores. Afinal, trata-se de um panorama do trabalho de todos, influenciado pelas condições oferecidas à unidade e até pelo contexto social e cultural do local. 
  • Limitar-se à divulgação dos resultados. É preciso ir além e planejar o que fazer para avançar na Educação.

Consultoria pedagógica: Alessandra Novak e Kátia Chiaradia

Esta reportagem faz parte do Especial Avaliação. Confira aqui os demais conteúdos.

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