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Alfabetização: identifiquei a hipótese de escrita do meu aluno, e agora?

Com base em duas produções reais, veja o que é possível extrair para planejar as próximas atividades e avançar nas aprendizagens

POR:
Mara Mansani
Foto: Getty Images

O primeiro passo de qualquer ação pedagógica é perceber o que os alunos já sabem e o que ainda precisam desenvolver e/ou consolidar. Com base nessas informações, temos os elementos necessários para avaliar quais são as melhores estratégias para que todos possam avançar. 

Na alfabetização, muitas vezes levamos em consideração somente as sondagens como termômetro para verificar como está a aprendizagem dos alunos. No entanto, elas não são as únicas. No dia a dia, durante as diferentes atividades desenvolvidas em sala de aula, as crianças têm a oportunidade de ler, escrever, falar e levantar e confrontar hipóteses sobre o sistema de escrita alfabético. 

A troca de saberes e dúvidas entre os pares, as intervenções pedagógicas do professor e a ampliação do repertório com textos de referência são momentos ricos para a construção individual e coletiva das aprendizagens, além de trazerem informações importantes que não aparecem nas avaliações diagnósticas. Logicamente, isso não exclui a importância da sondagem; pelo contrário, elas são complementares. 

Dois exemplos de como interpretar as produções dos alunos

Propus aos alunos de 1º ano do Fundamental que escrevessem, de forma individual, o que eles sabiam sobre os vegetais que costumamos comer nas refeições. A atividade faz parte de um projeto sobre alimentação saudável no qual os alunos, ao final, terão de criar e comer as suas próprias saladas.

Uma aluna escreveu sobre o tomate:

No texto, ela escreveu: “O tomate faz bem para a saúde. Com o tomate, ficamos mais saudáveis. Ele é muito gostoso. Com o tomate, ficamos muito fortes para brincar e fazer exercícios. Eu gosto mais ou menos do tomate. Mas, bem temperadinho, eu gosto mais”. Crédito: Acervo pessoal/Mara Mansani

Um outro aluno escreveu sobre a cenoura.

O estudante escreveu: “Esta é a cenoura. Faz bem para a saúde, para os olhos e também para a pele. É laranja. Bom é a cenoura”. Crédito: Acervo pessoal/Mara Mansani

Durante a produção, eu orientei as crianças, mas não fiz intervenções. Elas trabalharam com autonomia e puderam colocar em jogo o que já sabiam sobre a escrita alfabética. Em minha análise, ambos se encontram na hipótese alfabética, ou seja, já estão bem próximos da escrita convencional. 

Além dessa classificação, identifiquei outras questões importantes. Por exemplo, o texto sobre o tomate mostra que a aluna tem domínio do que escreve, pois conseguiu colocar de maneira clara seus conhecimentos sobre a fruta. Ela conseguiu conectar as informações – não são frases soltas ou desconexas –, faz uso de bom vocabulário e utiliza diversos de adjetivos (como é esperado em textos descritivos). O próximo passo seria focar em ortografia, sílabas complexas, segmentação das palavras, sinais básicos de pontuação e como evitar a repetição de palavras. Já o aluno que escreveu sobre a cenoura também tem autonomia e atendeu à proposta da atividade. Ele evita a repetição do substantivo cenoura e apresenta dúvidas na segmentação.

Qual intervenção pedagógica fazer durante o momento de escrita para que eles avancem?

Em ambos os casos, uma proposta de interferência possível é fazer a leitura dos textos escritos pelos próprios alunos. Ao ler as produções para a professora, é possível que eles já percebam e corrijam os erros, consigam notar o que falta ou o que pode ser melhorado, além de fazer boas perguntas que levem as crianças a refletir. 

O ideal é fazer as intervenções também durante a escrita, o que permite ampliar as possibilidades de aprendizagem e colher mais informações sobre como os alunos estão pensando o sistema alfabético. Em relação à segmentação de palavras, uma sugestão é trabalhar com a ordenação de palavras em textos que eles sabem de memória e propor muitas leituras de diferentes textos.

Vejam quantas reflexões e possibilidades consegui extrair com apenas uma atividade. Percebam que, quanto mais clareza tivermos em relação à fase de aprendizagem do aluno, mais preparados estaremos para planejar propostas que os façam avançar. Para tanto, a avaliação contínua dos alunos, estar atentos às situações dentro de sala e garantir tempo para a produção das crianças são elementos fundamentais. 

Mas, e vocês, queridos professores, como analisam a trajetória de aprendizagem de seus alunos? Quais ações planejam a partir dessa análise? 

Abraços a todos! Até a próxima!

Mara Mansani

Mara Mansani é professora há 34 anos. Lecionou em vários segmentos, da Educação Infantil ao 5º ano do Ensino Fundamental, passando também pela Educação de Jovens e Adultos (EJA). Em 2006, teve dois projetos de Educação Ambiental para o Ensino Básico publicados pela ONG WWF no livro Muda o mundo, Raimundo. Em 2014, recebeu o Prêmio Educador Nota 10, da Fundação Victor Civita, na área de Alfabetização, com o projeto Escrevendo com Lengalenga.