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Educação Infantil: como planejar experiências significativas para todos?

A intencionalidade pedagógica é essencial para que o professor se organize e desenvolva atividades que efetivem a inclusão em sala de aula

POR:
Carol Firmino

Mais do que adaptar atividades a um tipo de deficiência, é importante planejar de forma diversificada para que todos brinquem juntos. Foto: Getty Images

Para garantir os seis direitos de aprendizagem na Educação Infantil (conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se), professoras e professores têm de promover situações para que todas as crianças se desenvolvam e aprendam. Isso mesmo: todas, e é nesta palavrinha tão inclusiva que mora o desafio. Para não deixar ninguém e nenhum direito de fora, o bom planejamento é essencial.

“Em se tratando de inserir práticas pedagógicas inclusivas no cotidiano das crianças pequenas, é preciso mudar o olhar docente: em vez de adaptar a situação para um tipo de deficiência, ele deveria planejar atividades diversificadas para que todos pudessem brincar juntos”, exemplifica Carla Mauch, coordenadora-geral da Mais Diferenças, organização que atua com práticas e políticas de Educação e cultura inclusivas e orienta formações de professores e gestores nessa área. 

É por meio de vivências planejadas que os pequenos começam a experenciar o mundo, o que faz diferença na continuidade de seu progresso escolar. Paula Sestari, professora na rede municipal de Joinville (SC) e consultora deste especial sobre intencionalidade pedagógica na Educação Infantil, com dez anos de experiência na etapa, afirma que, ao combinar objetivos e direitos indicados na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o professor amplia as oportunidades de interação das crianças.

E, sabendo que o planejamento é etapa essencial de um trabalho com intencionalidade, por onde começar?

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Fernanda Zanatta, diretora da EMEI Trenzinho Alegre, em Cruzeiro do Sul (RS), argumenta que, no campo educacional, nada deve ser feito sem que haja objetivos, então, é ideal começar pensando neles e na maneira de alcançá-los. Tendo isso estabelecido, é hora de planejar a organização do espaço, dos materiais e do tempo, e isso deve acontecer, defende Paula, a partir do que se pretende desenvolver.

Organização que favorece a inclusão

A diretora Fernanda lembra que cada turma é única, com interesses e necessidades específicas. O educador deve observar essas condições ao planejar o trabalho em sala de aula. Como as crianças com deficiência, Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD) e altas habilidades/superdotação estão cada vez mais presentes nas escolas, é imprescindível pensar na forma como as propostas vão acontecer.

Como a atividade será realizada para explorar os potenciais da criança com deficiência? Quais adaptações serão necessárias? De que forma explicar para ela? “É ao planejar que professor deve fazer esses apontamentos”, orienta Fernanda.

Não faltam exemplos, como descreve a consultora Paula: “No caso de uma criança com hiperfoco em carrinhos, é possível oferecer vivências como a construção de pistas, percursos e histórias que apoiem a interação inicial com a turma e o estabelecimento de vínculos que favoreçam a aprendizagem. Outros exemplos são proporcionar diferentes texturas para todos explorarem desenvolvendo a sensibilidade tátil não apenas quem tem deficiência ou construir um canteiro acessível para os cadeirantes. Tudo isso significa proporcionar boas experiências a todos”. 

Leia mais: Cinco dicas para realizar um bom trabalho de inclusão na Educação Infantil

A professora Hosana Santana Fonseca, que leciona na EMEI Trenzinho Alegre, de Cruzeiro do Sul (RS), destaca a importância de pensar como as atividades vão acontecer individualmente e em grupo. “Planejamos estratégias que atinjam um a um e a todos. Por isso, as aulas nunca são iguais, apesar de haver rotina. Lançamos mão de metodologias diversificadas porque as crianças aprendem de formas diferentes”, diz ela.

Hosana nota que muitas vezes a criança com deficiência necessita de mais foco e de uma atenção diferenciada. No entanto, ao planejar uma vivência, o professor deve considerar sua presença na turma e o aproveitamento de suas potencialidades individuais. “Em cada experiência proposta, existe um tempo de execução a ser respeitado. Também é necessário ouvir sugestões e até contar com o auxílio familiar em busca de estímulos para demandas mais específicas”, pondera a professora.

Paula acrescenta que muitos educadores tendem a permitir à criança com deficiência estar apenas presente em sala – sem participar das atividades como os colegas. Isso contribui para o capacitismo, termo que caracteriza a desvalorização e a desqualificação das pessoas com deficiência. Em outros casos, tecem elogios demasiadamente reforçados, evidenciando sua concepção de que a criança não é capaz de realizar certas ações.

Para evitar que isso aconteça, ela defende que o planejamento preveja momentos específicos de apoio e mediação com os quais a criança possa contar, ao mesmo tempo que considere aqueles em que ela terá autonomia para aproveitar a atividade. “Isso estimula a sua independência nas ações da vida diária, que são fundamentais para acesso e convívio em outros espaços sociais”, acrescenta.

Altas expectativas guiam o planejamento

Paula explica que as altas expectativas envolvem a certeza de que todas as crianças têm condição de aprender. Favorecer a aprendizagem em toda a sua potencialidade depende de fatores e agentes que interferem diretamente nessa condição, como questões socioeconômicas, rotina e convívio familiar, além do acompanhamento de outros profissionais.

Além de cuidar do convívio em sala, a especialista em Educação Infantil orienta que é preciso conhecer a rede de apoio da criança realizando encaminhamentos e reuniões com a família e compartilhando estratégias que efetivem, primeiro, a presença constante dela na escola e, depois, uma rotina que favoreça sua participação integral.

Tempo bem gerido = mais oportunidades

O tempo é considerado fator primordial em qualquer etapa da aprendizagem, mas ganha ainda mais relevância na Educação Infantil. Fernanda Zanatta enfatiza que sua organização do tempo é assunto de muitas pautas e leituras para apoiar a rotina e a forma de conduzir as vivências. “Conhecendo o ritmo da turma, é possível organizar as propostas pensando também nos espaços, mas planejar e replanejar são ações indispensáveis”, diz ela.

A diretora acredita que todas as atividades oferecidas às crianças devem ser oportunizadas mais de uma vez, pois é necessário justamente tempo para os pequenos se familiarizarem com elas. “O modo como cada um reage é diferente, de acordo com a frequência com que teve acesso a essas propostas. Quando se percebe que houve pouco envolvimento, é a hora de repensar e oferecer a vivência em outro momento”, completa Fernanda.

Dentro de toda a estrutura oferecida à criança, outra garantia importante, segundo Paula, é reservar tempo de qualidade para alimentação, sono e interação nos mais variados espaços e condições, para que ela experencie tudo isso em grupo e individualmente. Ela explica que é interessante que os pequenos sejam informados sobre essas dinâmicas, entendendo a importância de cada espaço e do tempo na escola.

Como lidar com as frustrações ao replanejar?

A professora Hosana, da EMEI Trenzinho Alegre, comenta que os replanejamentos são necessários. “Quando acontece o replanejamento, reflito sobre as propostas, avalio como a maioria reagiu, o que falhou ou o que pode ser aprimorado da próxima vez. Meu dia a dia tem pré-organização, mas não é engessado; é flexível”, diz ela.

Paula Sestari considera que a frustração faz parte quando algo não dá certo e que imprevistos acontecem. “É preciso que o professor se aproprie das particularidades sobre as crianças da turma e ajuste as expectativas em relação aos objetivos iniciais”, sugere. Ela reforça a importância dos registros. “Eles podem indicar conquistas individuais, as mediações que foram efetivas em cada caso e até novos objetivos para cada criança, sem que haja a expectativa de participação igual dos pequenos em uma mesma proposta.” Quem educa deve observar como o desenvolvimento acontece em meio às interações e brincadeiras, replanejando e interferindo sempre que necessário para apoiar a aprendizagem. 

Consultoria pedagógica: Paula Sestari, professora da Educação Infantil da rede municipal de ensino de Joinville (SC), com dez anos de experiência nessa etapa, e mestra em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias.

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