12 autoras negras para trabalhar em sala de aula
25 de julho é o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha; conheça autoras para apresentar às turmas da Educação Infantil, Fundamental e Ensino Médio
POR: Tatiane CalixtoExaltar e dar visibilidade à luta contra o racismo e o machismo. É esse o objetivo do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, comemorado em 25 de julho. No Brasil, a data é duplamente importante, já que aqui também é o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. Por isso, o mês vem sendo chamado de Julho das Pretas, centralizando debates sobre a temática negra feminina – o que pode, claro, ser aproveitado nas salas de aula.
Tereza de Benguela virou símbolo de resistência à frente do Quilombo Quariterê, que reunia negros e indígenas escravizados no Mato Grosso, no século 17. A ideia da data é trazer visibilidade para o protagonismo, não apenas da líder quilombola, mas também de outras mulheres negras que fizeram e fazem história mesmo diante do apagamento, preconceito e machismo.
O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, por sua vez, foi instituído em 1992, após um encontro que reuniu grupos de feministas negras na República Dominicana para debater o impacto do machismo e do racismo na vida das mulheres negras e exaltar a luta de todas.
Realidade da mulher negra mostra urgência do debate
No segundo trimestre de 2022, enquanto o índice geral de desemprego no Brasil girava em torno de 9,3%, entre as mulheres negras o percentual era de 13,9%. Para homens e mulheres brancas as taxas eram de 6,1% e 8,9% respectivamente, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Por outro lado, o Atlas da Violência, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que, em 2019, 66% das mulheres assassinadas no Brasil eram negras. Segundo o estudo, para cada mulher não negra morta, morrem quase duas negras no país.
Para marcar a data, a NOVA ESCOLA ouviu professoras que dão dicas de autoras e livros que podem apoiar o debate dessas temáticas, valorizar a atuação de mulheres negras na sociedade, além de promover diversidade nas aulas.
Confira obras de autoras negras e sugestões de abordagens
Sonia Rosa
Para o dia 25 – e principalmente para todo o ano – a colunista da NOVA ESCOLA, professora Selene Coletti, que tem experiência na Educação Infantil e Anos Iniciais, indica a escritora carioca Sonia Rosa.
“Os textos são de um ritmo gostoso, muitas vezes, com rimas. Trazem temas relevantes e bastante reflexivos, como o Menino Nito, que trabalha a questão do choro para os meninos”, explica. Já o livro Alice vê chama atenção pela ilustração que dá para ser explorada, ‘relida’ e, por que não, reescrita, principalmente pelas turmas da Educação Infantil. “É de uma singela poesia”, define Selene.
Outra opção de Sonia Rosa é Enquanto o almoço não fica pronto. A história aborda o papel do homem na família, mostrando que ele também compartilha tarefas domésticas, além de trazer uma família negra como protagonista, “permitindo às crianças pretas se verem retratadas nas histórias. Assim, a autora pode ser lida tanto pelas crianças da Educação Infantil como dos Anos Iniciais, aprofundando as conversas de acordo com a turma”, aconselha a educadora.
Tereza Cárdenas
A professora de Língua Portuguesa, Ana Cláudia Santos, dá aulas nos Anos Finais, na rede estadual de Minas Gerais, há mais de 20 anos. Também colunista da NOVA ESCOLA, ela afirma que uma boa escolha é trabalhar com a obra Cartas para a Minha Mãe, da cubana Tereza Cárdenas.
“Tereza sentia falta de personagens negras em livros infantis. Cartas para Minha Mãe é a história de uma menina preta que, depois de ficar órfã, começa a escrever cartas para a mãe. Por meio de sua escrita, descobrimos que as primas a maltratavam e queriam que ela fizesse um esforço para disfarçar sua cor para ficar mais parecida com uma pessoa branca”, detalha Ana Cláudia.
Teresa escreveu também o livro Cachorro Velho, com o qual recebeu o Prêmio Casa de las Américas, na categoria literatura para crianças e jovens. As duas obras foram publicadas no Brasil.
Carolina de Jesus e Maria Firmina dos Reis
A professora Ana Cláudia sugere ainda apresentar à turma a primeira romancista negra brasileira: Maria Firmina dos Reis. Ela publicou o conto A Escrava, ainda no período escravocrata. A obra apresenta três vozes que podem guiar as atividades em sala de aula, confrontando os pensamentos de escravocratas, abolicionistas e da escravizada Joana.
“E não poderia deixar de mencionar Carolina Maria de Jesus, com a obra Quarto de Despejo, que pode ser trabalhada em consonância com Cartas a uma negra, da francesa Françoise Ega, analisando os respectivos processos de escrita”, orienta Ana.
Preta Rara e Veronica Oliveira
Jessica Machado dos Santos é professora de Geografia nos Anos Finais, em Ribeirão Preto (SP). Ela, que participou da websérie ProfessoreZ, da NOVA ESCOLA, sugere mostrar os desafios e as lutas das mulheres negras pela perspectiva das empregadas domésticas.
“Preta Rara (Eu, empregada doméstica) e Veronica Oliveira (Minha vida passada a limpo) foram empregadas domésticas e abordam a questão da exploração de trabalho dessa classe, além de levantarem temas como racismo e machismo. As duas autoras falam também da importância da Educação, independentemente do trabalho que se exerce. São duas obras bem legais para trabalhar com os Anos Finais e Ensino Médio”, opina.
Chimamanda Adichie, Djamila Ribeiro e Conceição Evaristo
Roberta Duarte, professora de História dos Anos Finais na rede municipal de Jaboatão dos Guararapes (PE), indica três obras que já utilizou com suas turmas. Segundo ela, os três livros abordam as questões de raça com uma linguagem simples, entendida com facilidade pelos estudantes: O perigo de uma história única, da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie; Pequeno Manual Antirracista, de Djamila Ribeiro, e Olhos D´água, de Conceição Evaristo.
Lélia Gonzalez
A professora Lavini Castro dá aulas de História nas redes pública e privada do Rio de Janeiro, é coordenadora da Rede de Professores Antirracistas e colunista da NOVA ESCOLA. O primeiro nome que ela cita é o de Lélia Gonzalez. “É de suma importância levar o pensamento de Lélia para a sala de aula, primeiramente, por ser uma personalidade ativa e fundadora do Movimento Negro Unificado (MNU) e por ser precursora do feminismo negro”, explica a educadora.
Para Lavini, Lélia é uma referência de intelectualidade ao abordar o conceito de amefricanidade que pode ser trabalhado em sala de aula quando se fala da questão da colonização, pois diz respeito às experiências de mulheres e homens negros na diáspora, bem como às experiências de mulheres e homens indígenas contra a dominação colonial.
“Em seus escritos, Lélia traz a experiência de vida para analisar o racismo cotidiano e o racismo estrutural, e como a contribuição das mulheres negras nos modos de falar, sentir e pensar da sociedade brasileira são importantes para mexer nas estruturas da sociedade, fornecendo ferramenta teórica para descolonizar o currículo e o pensamento”.
- Leia também: O que é e como construir um currículo decolonial?
Helena Teodoro
Outra pensadora negra indicada pela colunista Lavini é a professora Helena Theodoro. Doutora em Filosofia e mestre em Educação, a intelectual atuou junto à Lélia Gonzalez na Assembleia Nacional Constituinte de 1987-88. A ideia era considerar o conceito de amefricanidade para investigar o espaço do negro na história constitucional brasileira do pós-abolição.
“A professora Helena Theodoro atua com pesquisas no campo da aprendizagem, com conceito de identidade, cultura afro-brasileira e destaca a importância da educação da História Africana e Afro-brasileira nos currículos do sistema de ensino, porque crianças negras eram expostas a imagens e fatos históricos que apresentavam negros e indígenas em posições subalternas”.
Por outro lado, a cultura da população negra tende a ser considerada como folclore, sendo desvalorizada em sua potência criativa. Por isso, Helena mostra o quanto é necessário valorizar as manifestações artísticas e religiosas que se expressam de maneira distinta do padrão europeu. “Esse aspecto é ressaltado pelo fato de que as tradições africanas e afro-brasileiras são fortemente fundamentadas na oralidade, o que levava as professoras Lélia Gonzalez e Helena Theodoro a frisarem a necessidade de valorizar a contribuição africana na formação da Língua Portuguesa”, finaliza Lavini.
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