STEAM ajuda a preparar os alunos para desafios do século 21
Abordagem incentiva a interdisciplinaridade e fomenta a autonomia e criatividade dos estudantes
POR: Linaldo Oliveira
No mundo em constante evolução em que vivemos, a educação tem a responsabilidade crucial de preparar os estudantes para os desafios e oportunidades do futuro. A primeira vez que me dei conta dessa realidade foi quando ouvi uma distinta professora durante a semana pedagógica da minha rede de ensino.
Muito humilde e de atitude forte, a saudosa professora Dra. Inês Teixeira iniciou sua palestra com a seguinte frase: “Eu trabalho com vidas, você sabe o que eu sou? Eu, meus amigos, sou professora”. Costumo dizer em todo lugar em que dou formação de professores que, naquele exato momento, entendi que havia escolhido a profissão correta.
A abordagem STEAM (Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática, em inglês) emergiu nos Estados Unidos como um investimento no desenvolvimento tecnológico e científico do país.
Inicialmente denominada como Stem (porque originalmente não englobava as artes) buscava promover, já no Ensino Básico, não apenas o aprendizado disciplinar, mas também a criatividade e a autonomia dos estudantes para, assim, despertar o interesse das futuras gerações pelas ciências, o que resultaria no aumento do desenvolvimento científico e tecnológico do país.
E é aí que, para mim, essa abordagem se encontra com as palavras da sábia professora Inês. Afinal, somos nós, professores, que temos o poder de instruir pessoas que construirão o futuro.
O STEAM e a sala de aula
Os benefícios da implementação do STEAM nas salas de aula são vastos e significativos, devido a sua capacidade de integrar disciplinas aparentemente distintas como a Arte e a Matemática ou a Tecnologia e a Engenharia, o que promove o aprendizado interdisciplinar, movendo-se contrariamente à segregadora realidade onde os componentes curriculares parecem não conversar entre si.
Essa abordagem não apenas fortalece o entendimento conceitual, mas também estimula a habilidade de resolver problemas complexos. Os estudantes são desafiados a pensar de forma holística, uma competência essencial para o sucesso em qualquer campo que o aluno queira seguir como carreira.
Um aspecto igualmente vital do STEAM é a promoção da autonomia do aluno. Ao invés de, simplesmente, absorver informações, os estudantes são desafiados a assumir um papel ativo em seu próprio aprendizado.
Por meio de projetos práticos e colaborativos - que podem estar ligados a demandas ou problemas enfrentados pelos alunos na escola ou comunidade -, eles aprendem a definir metas, tomar decisões e gerenciar seu tempo de forma eficaz. Essa autonomia não apenas os prepara para os desafios da vida adulta, mas também alimenta um senso de responsabilidade e autoconfiança.
Para os educadores, a implementação do STEAM oferece uma oportunidade única de redefinir o papel da sala de aula como um espaço de exploração e descoberta, tendo a pesquisa como o princípio pedagógico dos alunos e não a mera transmissão de informações.
Nós, professores, nos tornamos facilitadores do aprendizado, guiando os alunos em sua jornada de investigação e criação, dando liberdade para que eles possam exercitar e defender seus respectivos pontos de vista e soluções criativas.
Você pode gerenciar esses momentos de criação por meio de debates em sala sobre temas específicos e relevantes para os seus alunos, levando-os a conversar entre si, conhecendo diferentes visões sobre o mesmo tema, o que desenvolve a capacidade de argumentação e comunicação das inúmeras cabecinhas pensantes da sua sala.
Essa abordagem colaborativa e orientada para o aluno não apenas aumenta o engajamento na sala de aula, mas também promove uma cultura de aprendizado contínuo e inquisitivo.
Mas como toda essa maravilha pode ser vista na prática? Deixa-me contar uma das experiências mais significativas que vivi com a abordagem em sala.
Criatividade e protagonismo juvenil
Com a volta à sala de aula presencial, após a pandemia, assim com todos os professores do mundo, eu me perguntava: o que é que eu vou fazer agora? Como vou engajar meus alunos, mais uma vez, na vivência coletiva da sala de aula? Como vou despertar o interesse pelo aprendizado?
Nesse meio tempo, entre as várias madrugadas e cafés, que nós, professores, conhecemos bem, me deparei pela primeira vez com o STEAM. Após ler alguns artigos, resolvi desenvolver um projeto que exercitasse a competência empreendedora nos alunos e os instigasse a explorar diversos conhecimentos na construção de um produto de mercado.
O projeto foi realizado em 2022, com alunos do 9° ano entre os meses de fevereiro a setembro, visando o desenvolvimento das habilidades (EF07CI06), (EM13CNT307), (EM13CNT308) bem como, das competências gerais da BNCC 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 10, por meio do trabalho em sala com o tema materiais, matéria e energia, focando em sua aplicação empresarial, tecnológica e ambiental.
Divididos em equipes, os alunos simularam a fundação de uma marca, deliberando e definindo com seus pares, aspectos reais necessários a tal criação como missão, visão empresarial, identidade visual, estratégias de propaganda e marketing e os valores sociais, financeiros e ambientais de sua nova empresa.
Cada marca fundada precisou desenvolver um produto, simulando todas as fases de mercado, desde o estudo de demanda até o desenvolvimento do protótipo e do produto final.
Os discentes assistiram a palestras com profissionais das áreas de engenharia de produção e marketing que nortearam suas respectivas produções.
Cada empresa fundada produziu um portfólio contendo toda sua estrutura financeira (precificação do produto e impostos), determinada, construída e analisada pelos alunos.
Para isso, os mesmos receberam aulas de Educação Financeira e Fiscal, ministradas pela professora de Matemática da escola. Os textos necessários à criação do documento foram produzidos em consonância com as aulas de Português. Antes da entrega dos produtos finais, os alunos permitiram que colegas, familiares e profissionais testassem seus protótipos, a fim de colher e analisar opiniões que pudessem aperfeiçoar seus produtos finais.
Para divulgação das marcas, os estudantes produziram comerciais e materiais midiáticos divulgados nas redes sociais e um podcast escolar que permitiu que toda a comunidade da escola pudesse conhecer e entender as propostas de cada empresa. Todos os produtos foram apresentados em uma feira de ciência e tecnologia.
Resultados
Foram produzidos 20 novos produtos, com potencial real de mercado que variaram desde aplicativos de jogos de entretenimento com centenas de personagens, até produtos didáticos, que possibilitam o aumento da qualidade e estrutura de ensino.
A prática promoveu a interdisciplinaridade, colaboração e contextualização, o que comprova o sucesso do método STEAM no desenvolvimento multidisciplinar dos alunos, autonomia, criatividade e capacidade de análise e comunicação de resultados em diferentes tipos de linguagens. Os alunos tornaram-se frequentes na escola, até mesmo em aulas extras ao horário regular, finais de semana e feriados, tamanho o engajamento.
O projeto segue em andamento desde então e tem gerado resultados cada vez mais surpreendentes. No ano de 2023, foram desenvolvidas cerca de quarenta iniciativas de pesquisa, que resultaram em parcerias com secretarias do município. Destacam-se trabalhos com agricultura familiar por meio da produção de agrotóxicos naturais; ergonomia; conhecimento ecológico local e indígena por meio de iniciativas de preservação do patrimônio imaterial da região; educação ambiental; recomposição de aprendizagem; sustentabilidade; energias renováveis e educação inclusiva.
Emotions: um mergulho em si mesmo
Você já pode notar que a abordagem STEAM nutre a criatividade dos estudantes de maneiras profundas e duradouras. Ao incorporar as artes ao currículo Stem tradicional, os alunos são encorajados a explorar novas formas de expressão e a pensar fora da caixa, a trabalharem o lado humano do conhecimento, estimulando o cuidado físico e emocional, bem como as diversas formas de expressões.
A criatividade floresce quando os limites disciplinares são rompidos, permitindo que os alunos mergulhem em projetos que combinam conhecimento técnico com imaginação e originalidade.
Pensando nesta realidade, nasceu o espetáculo Emotions, um projeto socioemocional da escola, que busca trabalhar com os alunos o bem-estar emocional por meio do teatro.
Dentro do ambiente escolar, foi realizado um mapeamento por meio de questionários, acerca das emoções que, do ponto de vista dos estudantes, são mais complicadas de lidar. Com base neste mapeamento, o enredo da série conta a história de dois personagens que encontram suas emoções reprimidas e, por meio, de um espetáculo cheio de luz e dança, buscam enfrentar seus traumas e resolvê-los.
A obra é inspirada em livros como A Hora da Essência e Quem me roubou de mim?, do padre Fábio de Melo, e Os quatro amores, de C. S. Lewis que trabalham a dimensão afetiva humana, em situações reais, experimentadas por quaisquer pessoas.
O destino final dos personagens foi escolhido e escrito pelos próprios alunos, gerando momentos de escuta e discussão em sala, que desenvolveram comprometimento e empatia.
Desta forma, meu caro professor, ao integrar Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática, essa metodologia prepara os alunos para os desafios do século 21, equipando-os com as habilidades e mentalidades necessárias para prosperar em um mundo em constante mudança.
Para os educadores visionários, o STEAM não é apenas uma abordagem pedagógica, mas sim uma missão para cultivar mentes curiosas e inovadoras que moldarão o futuro.
Linaldo Oliveira é mestre em Ecologia e Conservação e professor da EMEF Iraci Rodrigues de Farias Melo, em Mogeiro (PB). Foi tetracampeão do Prêmio Educador Nota 10 do Instituto Alpargatas e foi eleito Educador do Ano na 24° edição do Prêmio Educador Nota 10 e um dos cinco professores mais criativos do país, pelo Prêmio Perestroika.
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