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Alfabetização: explore a leitura e a escrita de receitas de comidas de festa junina

A culinária das festas populares permite trabalhar com listas e produzir podcasts a respeito dos pratos típicos e seus ingredientes

POR:
Caroline Rezende
Explorar listas e receitas de pratos típicos das festas juninas e julias podem render aprendizagens de leitura e escrita na alfabetização. Foto: Getty Images

Como diz a música: “o baile lá na roça foi até o sol raiar. A casa estava cheia, mal se podia andar. Estava tão gostoso aquele reboliço. Mas é que o sanfoneiro. Ele só tocava isso.” O mês de junho começa e já se ouve nas escolas as músicas dos ensaios das festas juninas e julinas. Quando não estão na quadra se preparando, as crianças estão em sala de aula com essa deliciosa trilha sonora. Nada melhor do que entrar também nesse clima nas propostas de leitura e escrita, não é mesmo?

Pipoca, milho verde, amendoim torrado, paçoca, pé de moleque e pinhão são sabores e palavras que inauguraram o projeto de leitura com o tema “Receitas Juninas” em minha turma neste ano, no qual exploramos as listas e receitas. 

Como produto final, propus a produção de um podcast lendo as receitas e as listas de outras receitas para o ouvinte experimentar. 

O engajamento das crianças foi imediato. A proposta me ofereceu a oportunidade de diversificar atividades de acordo com os saberes construídos por cada estudante. Pude elaborar desafios diferentes e ajustados aos níveis de proficiência leitora, com o intuito de criar condições para novas aprendizagens. 

Como explorar a leitura de listas de ingredientes na alfabetização

Para as crianças que estão aprendendo a ler, ofereci diferentes listas com ingredientes e títulos de receitas juninas. Elas tinham o desafio de identificar onde estava escrita determinada palavra. 

Aprender a ler lendo

Uma condição didática importante para esse trabalho com listas é que a criança saiba qual palavra está ali e tenha o desafio de localizá-la. 
Não pergunte para elas “o que está escrito aqui”, mas, sim, “onde está escrito x”. Isso garante um desafio ajustado para os estudantes no processo de aprendizagem da leitura, pois elas podem usar indícios como, por exemplo, letras que conhecem e tamanho da palavra, para localizar a palavra, promovendo uma reflexão a respeito do sistema de escrita.

Para a primeira lista, selecionei três ingredientes da receita de bolo. Escrevi na lousa: OVOS, AMENDOIM e LEITE. 

Chamei duas crianças, uma que já demonstra reconhecer o valor sonoro das letras e outra que ainda está começando esse processo de reconhecimento. Em seguida, perguntei onde estava escrito AMENDOIM. 

Mediei este momento perguntando com qual letra acreditavam que começava ou terminava a palavra, assim como também quais letras acreditavam que eram boas para a escrever. Cada uma escolheu uma. Pedi que discutissem com o colega a razão da escolha. 

Um dos estudantes disse que escolheu aquela palavra “porque amendoim começa com A e só tem essa que começa assim”. Perguntei ao outro estudante se ele concordava, a resposta foi positiva. Pedi também que ambos lessem acompanhando com o dedo a palavra na lousa para que realizassem o ajuste do falado com o escrito nas respectivas partes da palavra.

Para aprofundar a reflexão a respeito do sistema de escrita, apontei onde estava escrito OVOS e perguntei por que AMENDOIM não poderia estar escrito ali. Ambas disseram que não era possível porque a palavra começava com O. 

Nesse momento, até mesmo o estudante que não estava demonstrando identificar letras pertinentes à palavra no momento da leitura, demonstrou que aprendeu a estratégia de analisar a primeira letra da palavra com o colega.  

Repeti esse processo com outras listas ao longo da semana. Também variei o tamanho do desafio ao escolher palavras mais complexas. Por exemplo: 

  • Selecionando duas ou mais palavras que começavam e terminavam com a mesma letra, como por exemplo “paçoca” e “pamonha”, o que ajudou os estudantes a analisarem outras partes que não só o começo e o fim da palavra. 
  • Títulos de receitas com diferentes extensões.
  • Palavras compostas, inclusive, algumas delas em que a segunda eram iguais como é o caso de VINHO QUENTE e CACHORRO QUENTE. Dessa forma, elas tinham de pensar como diferenciariam uma da outra. 

Escutar a criança para entender como ela está pensando pode dar pistas para pensar em novas e boas intervenções. 

Lembre-se que o propósito didático é criar uma situação de leitura pelo estudante em que ele aprenda a ler lendo, por essa razão esse momento de reflexão é de suma importância. A cada nova participação em situações assim, as crianças aprendem mais. 

Leitura de receitas para avançar na fluência leitora

Começamos com a leitura coletiva de todas as receitas. Conversamos também sobre as palavras, expressões ou medidas que a turma não conhecia. 

Entendendo que compreensão do texto é condição para que façam uma leitura fluente, promovi a socialização dos diferentes saberes da turma para que houvesse máxima circulação de informação. 

Não expliquei de cara o que significavam os termos que não entendiam, mas permiti que a turma começasse a tentar explicá-los usando informações do contexto e conhecimentos prévios.

Um exemplo desse momento ocorreu na leitura da receita de “Bolinhos de tapioca”. No “modo de fazer” havia a seguinte expressão: “asse em forno brando”. 

Arthur, muito interessado em fazer a receita em sua casa, foi o primeiro a perguntar o que era “fogo brando”. Devolvi a pergunta para a turma. Alguém mencionou que sabia o que era “fogo alto” e explicou o que significava. Os estudantes concluíram que “forno brando” não seria a utilização de fogo alto, então poderia ser parecido com “fogo baixo”? 

Seguimos a discussão, surgiu a ideia de pesquisamos na internet. Com base nos resultados continuamos explorando o significado até Arthur concluir cozinhar o bolinho, do começo ao fim, em fogo baixo – dado que brando significa uma temperatura baixa e constante. 

O mesmo se repetiu para outras receitas.

A próxima etapa foi solicitar que lessem um para o outro a receita e colhessem opinião sobre a leitura que fizeram. O colega poderia dar alguns conselhos como, por exemplo, dizer para ler mais devagar ou mais alto, fazer pausas ou maneiras de entoar a voz. 

Depois, chegou a hora de gravar a leitura. Ofereci um celular e um computador para que fizessem áudios. Ao gravar, tinham de escutar para se colocar no lugar do ouvinte do podcast e verificar se a leitura estava compreensível e agradável – se necessário, poderiam fazer ajustes e regravar. 

Essa etapa despertou muito interesse em todas as crianças. Fizemos também a leitura de listas do nome das receitas. 

As crianças que ainda estão em processo de aprendizagem da leitura também participaram desse momento. Cada lista tinha três títulos de receitas, o que ajudava a memorização do que estava escrito. Uma vez de cor o conteúdo, elas faziam o ajuste da pauta sonora com a escrita e se saiam muito bem na leitura, visto que a medida que usavam os indícios para ler ajustando, avançavam na aprendizagem a ponto de usar estratégias de inferência que apoiavam a antecipação do conteúdo, assim avançando cada vez mais.   . 

“Caros ouvintes, começa agora nosso podcast junino…”

Também tivemos um momento de escrita, em duplas, de outros pratos tradicionais para compor as sugestões para os ouvintes e planejar as falas de abertura e despedida. 

Algumas crianças sabiam o que era um podcast, outras ainda precisavam ser repertoriadas. Selecionei alguns exemplos para que ouvissem para servir de inspiração e escrever suas próprias falas. 

Formei duplas produtivas de estudantes que já apresentavam compreensão do sistema de escrita alfabética com outros que ainda estão no processo de aprendizagem. 

Um dos grupos escreveu: 

Início: “Olá, ouvintes, estamos começando o podcast junino do 2º ano A. Você quer conhecer uma receita junina gostosa para fazer na sua casa? Daquele doce que você come nas festas? Então aí vai…

Término: “Você ouviu mais uma dica de receita do 2º ano A. Espero que gostem!”

Para contemplarmos a leitura das listas que elas escreveram, incluímos um trecho no roteiro falando sobre receitas que seriam lidas nos próximos podcasts. 

No momento, estamos realizando a edição dos áudios e em breve teremos os podcasts nas redes sociais de nossa escola. Quem quiser conferir é só buscar “Escola Prudente de Moraes” nas mídias sociais. 

Espero que vocês se deliciem com as dicas. Fica o convite para que também realizem propostas semelhantes com sua turma, pois com certeza muita aprendizagem e diversão estarão garantidas! 

Até a próxima!

Caroline Rezende é professora alfabetizadora na E.E Prudente de Moraes, na capital paulista, e mestranda em Escrita e Alfabetização pela Universidade Nacional de La Plata. Também atua como formadora de educadores.

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