Como ajudar os estudantes a lidar com a pressão do final do semestre?
Auxilie seu aluno a superar eventuais frustrações e entender o processo avaliativo como oportunidade de avançar na aprendizagem
POR: Nairim Bernardo
Final de semestre é um momento de muitas demandas para os professores, entre elas, lidar com a ansiedade, a frustração ou mesmo a indiferença dos alunos frente ao período de provas e entrega de trabalhos. No entanto, os docentes podem ajudar os estudantes a ressignificarem essa fase, apontando que a finalização de um ciclo deve vir acompanhada de reflexão e planejamento em relação aos estudos e ao comportamento em sala. E auxiliá-los na compreensão de que as provas são uma forma de entender avanços e dificuldades para continuar o processo de aprendizagem.
Para Guilherme Barboza De Fraga, professor de História dos Anos Finais do Ensino Fundamental na EMEF Rondônia, em Canoas (RS), quando o aluno conhece o modo como o professor avalia, o estresse e o medo diminuem. “Mas é um processo que precisa ser resultado de um diálogo contínuo e da construção de uma relação de confiança entre o docente e suas turmas”, afirma. Segundo ele, principalmente no período pós-pandemia, muitos estudantes têm demonstrado mais ansiedade e aversão a avaliações formais.
Esse comportamento também é percebido por Luiz Felipe Lins, professor de Matemática das redes pública e privada do Rio de Janeiro (RJ). Ele cita outras formas pelas quais os adolescentes demonstram que não estão conseguindo lidar com o fechamento do semestre. “Cada estudante age de uma maneira. Alguns extrapolam na indisciplina, às vezes, até para desviar o foco do real problema, de não querer que o professor perceba o que eles não sabem.”
Luiz Felipe considera que os professores precisam ter sensibilidade e se preocupar com a maneira como os alunos lidam com períodos avaliativos, porque a escola não pode ser um espaço de sofrimento. “Ela deve ser um lugar de acolhimento e não causar mais um trauma, uma angústia, um problema para as crianças e os adolescentes. A Educação tem de ser uma alternativa para modificar a vida e o ambiente nocivo em que, às vezes, eles já estão.”
Dificuldades com avaliações
Alessandra Novak, docente de Ciências e Biologia em Joinville (SC) e formadora de professores nas áreas de planejamento reverso, metodologias ativas e avaliação, comenta sobre uma situação frequente na vida escolar de muitos estudantes e que só agrava a tensão do fim de semestre. “É muito comum alunos que estudam apenas no dia anterior à prova. Se o estudante realmente aprendeu o conteúdo e está sempre estudando, na véspera, ele precisa apenas revisar. Quando ele não aprende ao longo do processo e vai tentar fazer isso um dia antes do exame, a situação vira um caos”, diz.
Simone Godoy, psicóloga clínica e hospitalar e especialista em terapia existencial e em controle e gerenciamento de estresse, acrescenta que, na adolescência, as pessoas são mais inseguras, observam muito o comportamento dos outros, sentem-se observadas e se compararam e disputam constantemente com os colegas. Assim, têm vergonha de fazer perguntas em aula e muito medo de errar, ficar de recuperação ou reprovar. “Na faixa etária dos Anos Finais do Fundamental, o adolescente vive uma mistura de sentimentos: tem consciência que precisa ser mais responsável, mas também sabe que ainda está saindo da infância. Na puberdade, as questões hormonais e sociais também podem pesar”, aponta ela.
Diante disso, a escola pode e deve ajudar os estudantes a desenvolverem competências socioemocionais ao longo de sua formação. Autoconsciência, autogestão e tomada de decisão responsável, entre outras habilidades, são essenciais na organização das tarefas cotidianas, incluindo os estudos.
Os adultos – educadores e familiares – também têm de trabalhar suas habilidades socioemocionais para lidar com essa situação da melhor maneira possível e, principalmente, não negligenciar os sentimentos dos adolescentes. Cobrá-los excessivamente, sobrecarregá-los com muitas atividades e avaliações e culpabilizá-los quando os resultados diferem do esperado são outras atitudes prejudiciais.
Muitas vezes, as pessoas consideram que aqueles jovens que não precisam trabalhar têm muito tempo para estudar, mas as características da adolescência também ajudam a entender porque dedicar um tempo para revisar os conteúdos e realizar tarefas pode ser tão difícil. “O adolescente realmente sente muito mais sono do que o adulto, devido à fase de crescimento. Além disso, estão num momento em que querem muito socializar e interagir, então permanecem mais nas redes sociais. E mesmo os que ficam em período integral na escola, em que horário vão estudar sozinhos e mais concentrados? Só a noite”, indica Simone.
Organização dos estudos e provas: como auxiliar os alunos nesses processos
Além de compreender questões comuns dessa faixa etária, que podem influenciar no modo como os estudantes lidam com os estudos, também é importante que os professores saibam como agir quando os alunos demonstram dificuldade em lidar com a organização e com os processos avaliativos.
Gerenciamento de tarefas
A orientação é o corpo docente escolher uma ferramenta, seja digital ou analógica, para que todos os professores da turma trabalhem com a mesma forma de organização. “Já temos de lidar com uma dificuldade de organização que é própria dessa fase e, com o excesso de conteúdo online, isso fica ainda mais exacerbado. Então, a escola não pode ser mais uma a criar excessos”, comenta Alessandra, sobre a importância de não sobrecarregar os estudantes.
Depois de escolher o recurso, é preciso implementar a forma de organização. Para isso, é importante sempre registrar as tarefas e checar se os alunos estão utilizando o recurso.
Estratégias de priorização
Para ajudar os estudantes a estabelecer prioridades, é importante que os professores dialoguem com a equipe pedagógica e com os outros docentes para ter uma noção global do que está sendo exigido das turmas. Além disso, é preciso considerar que atividades extracurriculares e pessoais também fazem parte das demandas dos adolescentes.
O professor Luiz Felipe diz que sempre tenta conversar com os alunos e ajudá-los a visualizar o que é prioritário em cada momento. “Eles precisam ser instigados a pensar no que podem estudar a cada dia. É legal sentar com os estudantes e criar uma agenda, eles até ficam surpresos, pois percebem que as coisas podem ser mais fáceis do que imaginavam. É bom quando nos vêem como parceiros.”
Nervosismo e “branco” durante a prova
Quando uma situação como essa ocorre, Alessandra sugere que o professor se abaixe na mesma altura [da carteira] do aluno, pergunte o que está acontecendo e se pode ajudar. Se mesmo com essa intervenção e depois de um tempo o jovem não conseguir realizar a prova por nervosismo, o professor pode recolher a avaliação e conversar com ele em outro momento.
“Primeiro, pergunto se ele sabe porque aquilo aconteceu, pois pode ser algo ligado ao nervosismo com o exame ou à outra situação. Depois, falo que entendi que ele não conseguiu fazer a prova naquela hora e questiono como podemos fazer outra avaliação”, detalha. Ela também diz que é preciso atentar ao comportamento do aluno, pois esses momentos de crise podem se repetir.
Para preparar os estudantes para a avaliação e tentar baixar a ansiedade, o professor Guilherme realiza uma pequena revisão antes da prova. Ele faz perguntas oralmente, e os alunos as respondem. Quando necessário, ele reformula a pergunta, acrescenta alguma informação ou pede para que expliquem determinado ponto do conteúdo. “Na prática, eu pergunto tudo que está na prova para deixar o estudante mais seguro para a avaliação formal. Quem presta atenção na revisão já tem grande chance de ter um bom desempenho na prova.”
Família e autonomia nos estudos
Os pais também precisam conversar sobre a organização dos estudos com os filhos e monitorar a rotina. Mas, por uma série de questões, nem todos contam com o acompanhamento constante de suas famílias. Por isso, Alessandra sugere que os professores incentivem a autonomia dos estudantes, de acordo com a faixa etária, e conversem com eles sobre isso, orientando-os a colocar na agenda um horário para estudos.
“Cada vez menos eu mando atividades para casa e, quando há necessidade, seleciono o que eles têm capacidade de fazer sem apoio. Pergunto que horas eles conseguem estudar sozinhos”, relata. “Não podemos contar que vai ter sempre alguém cobrando a rotina.”
- Leia também: Como ensinar a estudar?
O papel formativo das avaliações
As provas escritas costumam ser o foco de maior tensão para os alunos. Geralmente, o nervosismo nas avaliações está ligado à ansiedade, ao medo de errar e, por vezes, à pressão familiar por notas altas. Portanto, é preciso haver uma mudança de mentalidade da comunidade escolar para que todos entendam o papel formativo das avaliações.
Guilherme aponta que a avaliação é um processo que não se encerra com a prova e que não traz todas as evidências necessárias para verificar a aprendizagem. “Eu demorei a “virar essa chave” e notar que a avaliação é contínua, realizada a cada aula, a cada pergunta que o estudante faz, a cada resposta ou comentário que ele elabora.”
Ele acredita que a prova é apenas um instrumento formal de avaliação. “Como professor, eu não preciso de uma resposta escrita em uma folha para saber que o aluno desenvolveu determinada habilidade. Mas o documento é importante para fins legais e para prepará-lo para outros processos que enfrentará ao longo da vida, como o Enem ou o vestibular. Cabe trabalhar essas emoções para ajudá-lo a ganhar segurança e autoconfiança.”
O professor acrescenta que os docentes precisam ter consciência de que a nota não é uma punição. “É comum escutar professores dizendo que ‘o aluno vai ficar com nota baixa para aprender’. Isso é um grande equívoco. A nota baixa com função punitiva só vai desestimular esse estudante.”
Portanto, professores e coordenadores devem conversar com os alunos sobre a importância das avaliações no processo de ensino e aprendizagem. Uma possibilidade é utilizar exemplos concretos de avaliações já realizadas pela turma para explicar como os resultados ajudaram o professor a identificar dificuldades, potencialidades e planejar as aulas seguintes.
Os alunos, por sua vez, precisam ter espaço para fazer uma autoavaliação de como estão organizando a rotina de estudos em casa, quais habilidades conseguiram desenvolver e suas principais dificuldades. Também é importante que possam e consigam solicitar a ajuda do professor e fazer pedidos e sugestões.
- Leia também: Por que e como ir além das provas tradicionais?
Críticas construtivas e motivação para o semestre seguinte
Auxiliar os alunos a lidarem com as eventuais frustrações do processo educativo é outra tarefa que cabe aos professores. Fazer críticas construtivas é essencial para que os estudantes persistam em seus desafios de aprendizagem e desenvolvam-se de forma plena. “Não aprender a lidar com frustrações gera mais frustrações na vida adulta. Precisamos mostrar que elas fazem parte da vida e que os adultos também lidam com elas. Se não as encararmos como uma punição, elas se tornarão educativas”, diz Simone.
Segundo ela, para que os adolescentes não fiquem ansiosos ou retraídos, é preciso tomar cuidado com os comentários feitos, principalmente, quando os resultados obtidos não foram os esperados. Por exemplo, culpar o jovem por não ter estudado nem sempre condiz com a realidade, pois ele pode ter considerado que havia estudado o suficiente por não conseguir dimensionar o quanto realmente precisava se dedicar. Neste caso, o ideal seria sugerir ajustes na organização dos estudos.
Ao motivar os alunos, o professor Luiz Felipe retoma um ponto essencial: a importância de olhar para a realidade de cada escola. Ao perceber os jovens cada vez mais imediatistas e frustrados com os próprios resultados, ele busca trazer exemplos positivos de realidades próximas a deles.
Ele conta que a escola está num local dominado pelo tráfico, e é preciso falar sobre isso. “Os alunos desanimam e querem desistir, mas para onde vão se saírem da escola? Mostro exemplos de jogadores, de rappers, de artistas que eles admiram para perceberem que as coisas não foram conquistadas de uma hora para outra, que eles também falharam antes de chegar onde chegaram”, ressalta. “Outro exemplo que dou é o de uma ex-aluna da escola que nunca ganhou medalhas nas olimpíadas de Matemática, mas nunca deixou de participar. Depois, quando fez o vestibular para Medicina, ela passou. Não é uma prova que diz que você não pode fazer algo”, conclui ele.
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