Crie sua conta e acesse o conteúdo completo. Cadastrar gratuitamente

Você sabe o que é a escrita silábica sem valor sonoro convencional?

Essa é uma fase muito importante no aprendizado, a criança começa a representar cada emissão sonora com uma letra

POR:
Beatriz Vichessi
Professora vista apenas de costas entrega uma letra A em azul para criança em sala de aula
Foto: Getty Images

Na caminhada para aprender a escrever de modo convencional, as crianças elaboram ideias, pensam sobre a escrita , o que ela representa e como podem representar a linguagem graficamente. No desafio de escolher letras, a quantidade e a ordem em que devem estar para registrar o que desejam comunicar, os pequenos entram em conflito com as próprias ideias quando leem em voz alta o que escreveram, ao interagir com seus pares ou se apoiam em textos conhecidos. Tudo isso é muito bem-vindo e importante, porque cria a possibilidade de irem reelaborando suas ideias iniciais sobre como se escreve.

LEIA MAIS   Escrita pré-silábica: no que devemos prestar atenção

Durante esse percurso, para que possa avançar até alcançar a escrita convencional, a turma também precisa ter oportunidade de trabalhar em pares, manter contato permanente com bons textos e ser incentivada a  escrever à vontade, inclusive fora da sala de aula. Com base nas ideias de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky das hipóteses de escrita (pré-silábica, silábica, silábico-alfabética e alfabética), agora vamos falar sobre a escrita silábica sem valor sonoro convencional.

Um pouco sobre a hipótese

A hipótese silábica sem valor sonoro convencional é um divisor de águas na aquisição da escrita, pois a criança passa da fase da escrita não fonetizada para a escrita fonetizada . Relações se estabelecem: os pequenos começam a representar cada emissão sonora com uma letra. Por isso, nas escritas silábicas sem valor sonoro convencional, usam  uma letra para cada sílaba (embora não compreendam ainda o conceito de sílaba). Outra marca importante é que ainda não fazem uso, necessariamente, das letras correspondentes para escrever as palavras. Justamente por isso, a hipótese é classificada como “sem valor sonoro convencional”. Em resumo, nessa fase, acontece a descoberta de que a quantidade de letras pode se relacionar com a quantidade de sílabas e os pequenos já sabem que têm de variar as letras ao escrever tanto uma palavra como um conjunto de palavras. 

Exemplos


CTD para BANANA

PHV para JACARÉ

ADOG para TELEFONE

KEA para MACACO

CJTI para ELEFANTE  

Boas intervenções

Dicas para fazer com que as crianças possam avançar  

  1. Manter um alfabeto exposto e ao alcance das crianças para que consultem sempre que necessário. Com acesso a ele, elas podem relembrar a forma gráfica de determinada letra que querem registrar, por exemplo. Importante: prefira um alfabeto com letras de imprensa, todas maiúsculas, sem nenhum tipo de desenho nem letras minúsculas ou manuscritas acompanhando. Elas dificultam a vida dos pequenos nesse momento.
  2. Expor nas paredes da sala de aula, textos de tradição oral que a turma conheça e saiba de cor, como parlendas, versos, trava-línguas, adivinhas, entre outros, para que os pequenos recorram a eles quando estiverem escrevendo e queiram se apoiar em exemplos. Por exemplo: para escrever COZINHA, podem recorrer à MEIO-DIA, MACACO ASSOBIA. Trabalhar com narrativas e outros textos mais extensos, que circulam socialmente, também é fundamental.
  3. Organizar duplas produtivas de trabalho, reunindo uma criança com escrita silábica sem valor sonoro convencional com um colega que apresenta uma hipótese silábica com valor sonoro convencional, para que o segundo questione o par sobre as letras escolhidas, a ordem, dê sugestões para melhorar a escrita.
  4. Pedir que a criança leia em voz alta, seguindo com dedo, o que escreveu. Assim, ela verbaliza o que pensou e você pode fazer intervenções - por exemplo, perguntar se ela acha que há letras sobrando, se quer eliminá-las, se deseja trocar alguma letra por outra que considere melhor. Também é possível pedir para ela apontar onde está o ME de MELISSA em CAMELO que ela mesma escreveu. Atenção: ao pedir que a criança leia em voz alta, a ideia não é verificar se ela sabe ler nem corrigir sua escrita, e sim criar condições para ela verbalizar o que pensou . A tomada de consciência de que há letras melhores para serem usadas acontece de outra maneira: com suporte e comparação com outras escritas, por exemplo.
  5. Impulsionar os pequenos a pensar que existem letras mais adequadas do que as que escolheram, já que é preciso fazer marcas correspondentes ao segmento que eles querem representar. Para isso, lance mão de textos conhecidos por eles, títulos de livros preferidos da turma, listas de palavras que façam sentido para o grupo, sugerindo que recorram a eles. O título do livro “O PATINHO FEIO”, por exemplo, pode ajudar a escrever PANELA.
  6. Depois do trabalho de escrita em duplas, compartilhe na lousa com toda a classe alguns registros, problematizando-os, de modo que a turma possa fazer sugestões de melhorias. Você também pode compartilhar o registro de duas duplas para mesma palavra, comparando-os e pedir para as crianças opinarem, pensarem em qual é o melhor conjunto de letras para representar graficamente a palavra em questão e justificar as ideias. Por exemplo: DUB e PNA para PANELA. O segundo registro, marcado pela hipótese silábica com valor sonoro, é de grande utilidade para fazer o grupo sem valor sonoro refletir e avançar. 

 

O que não fazer

Práticas que devem ser evitadas

  1. Falar, pausadamente e em voz alta, cada pedaço da palavra, intensificando o valor sonoro de cada sílaba, na tentativa de a criança compreender o que ela tem de escrever ou a fim de questionar as letras que ela usou.
  2. Ensinar sílabas separadamente, como se aprender primeiramente esses pedaços desconectados de palavras, ajudasse a criança a compreender o sistema de escrita.
  3. Ler em voz alta a produção da criança para mostrar a ela que o que está escrito não corresponde ao que diz (nem à palavra nenhuma). É ela quem deve ler o que registrou, apontando com o dedo o que escreveu, atendendo a um pedido seu, e então ser convidada a refletir a respeito e fazer adequações (trocar, inserir ou descartar letras), se achar prudente.
  4. Fazer os pequenos decorar o alfabeto, considerando que, conhecendo as letras, eles saberão escrever as palavras convencionalmente. 

Fontes: Denise Guilherme, mestre em Educação e idealizadora de A Taba, curadoria de livros infantis, e Renata Frauendorf, coordenadora de programas de didática específica de Língua Portuguesa do Instituto Avisa Lá.

Tags

Guias