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Professores e gestores: como preparar a transição 2021-2022?

Aprendizagens essenciais, currículo contínuo, apoio a alunos e famílias e (re)planejamentos constantes darão o tom na virada do ano letivo – e educadores explicam como tudo isso vai se dar no dia a dia das escolas públicas

POR:
Victor Santos
Crédito: Getty Images

Falar da transição de um ano letivo para o outro é falar de um período que sempre exige especial atenção das equipes pedagógicas. “Tudo começa com um balanço daquilo que dispomos de diagnóstico, em âmbito de rede e de escola, olhando para o cenário de aprendizagem que se tem”, sintetiza Sonia Guaraldo, consultora pedagógica do Instituto Gesto e especialista em formação de professores. “A partir dessa análise, traçamos as grandes diretrizes para o ano que vai iniciar.”

A questão é que, depois da virada 2020-2021 em pleno contexto pandêmico, a transição para 2022 coloca as equipes escolares novamente em um processo complexo. “Por um lado, enfrentamos um grande desafio agora: a perda de vínculo das crianças com a escola”, aponta Sonia. “Por outro, se compararmos com o ano passado, naquele momento havia muitas incertezas, e o processo de reorganização de currículo ocorreu de forma menos estruturada. Hoje, temos um cenário mais configurado de retorno e mais visibilidade em pontos como avaliações diagnósticas e quem voltou e quem evadiu da escola.” 

Conforme explica a especialista, o continuum curricular segue muito importante – o Conselho Nacional de Educação (CNE) já havia publicado orientação nesse sentido para 2020-2021 e aconselhou novamente em parecer que essa ação se estenda para 2022. “É importante reforçar que ninguém está falando em mudar o currículo”, indica a consultora. “A ideia de continuum, na verdade, mantém as mesmas referências curriculares. O que ocorre é que elas são flexibilizadas de forma a caber em um ano, com uma lista de habilidades prioritárias que é repassada para as redes e, em seguida, para as escolas. Tudo construído com base nas questões que sustentam um currículo.” 

Dessa forma, o cenário de transição envolve uma articulação de reflexões e ações de todos os educadores envolvidos nas diferentes frentes da Educação. Nesta última reportagem do especial Como planejar o fechamento do ano, ouvimos de especialistas, redes e escolas quais são os principais caminhos para que essa transição ocorra da melhor forma possível.

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Transição e currículo na perspectiva de uma rede
 
A especialista Sonia Guaraldo diz que, neste contexto de transição, a atuação da rede é crucial. “As políticas macro devem olhar para os maiores desafios nas salas de aula, e o trabalho deve ser baseado em acompanhamento e monitoramento das escolas. Assim, no âmbito da Secretaria, é preciso verificar quais são as defasagens da rede, garantir que cada escola olhe para essas tendências e fazer uma flexibilização para o contexto de cada instituição.” 

Na rede de Rancharia (SP), as movimentações de transição de ano intensificaram-se após a realização das avaliações diagnósticas e do gradual retorno presencial, iniciado em agosto e efetivado em outubro. “Depois da aplicação das avaliações diagnósticas, conseguimos enxergar o que as crianças não atingiram e tomamos a decisão de construir um currículo próprio embasado nessas necessidades”, conta Cláudia Elena Slobodticov, secretária de Educação da cidade. 

Essa reorganização curricular é comandada de maneira articulada pela secretária e pelas supervisoras Priscila da Silva de Medeiros, de Ensino Fundamental – Anos Iniciais; Liliane Barbosa, de Ensino Fundamental – Anos Finais;  Rosângela Oliva, de Educação Infantil (creche); e Andreia Palopolli, de Educação Infantil (pré-escola). Todas elas enfatizam que a expectativa é de que, com o currículo, seja possível superar algumas lacunas deixadas pela pandemia. 

“Na última avaliação diagnóstica, realizada em agosto, fizemos toda uma tabulação dos resultados e, em seguida, buscamos construir um plano de ação para recondução dessas aprendizagens”, lembra Priscila. “Dentro disso, iniciamos a reorganização do currículo e fizemos diversos encontros no segundo semestre, que serão finalizados no primeiro bimestre do ano que vem.”

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Suporte aos gestores, professores e alunos
 
De acordo com Sonia Guaraldo, na transição de ano letivo, há outras demandas que também fazem parte do escopo das redes. “É sempre importante que a Secretaria ajude a levar essa questão formativa para as suas escolas, apoiando os gestores na organização desses momentos de suporte aos professores, de modo que acompanhem os planejamentos com feedbacks e mesmo um olhar para a prática da sala de aula.” 

Em Rancharia, a secretária Cláudia relata que as quatro supervisoras sempre montam, juntas, as avaliações da rede, pois trata-se de uma continuidade – afinal, o aluno da creche vai para a pré-escola e da pré-escola segue para o Fundamental. Além disso, todas são muito próximas dos gestores, estando presentes nas instituições e dando devolutivas. 

A supervisora Priscila conta como essas ações transcorrem no dia a dia. “Todos os bimestres, nós, supervisoras, realizamos visitas administrativas e periódicas nas escolas municipais, e também as próprias instituições nos passam demandas. Nós elaboramos os HTPCs [horários de trabalho pedagógico coletivo] de formação com gestores a cada 15 dias e, em seguida, eles repassam essas formações nas suas escolas.” 

Outro tópico relevante nessa virada de ano letivo, segundo a secretária e as supervisoras, é a busca ativa, que já ocorria no período remoto, quando monitoravam entregas de atividades por WhatsApp, e seguirá prioritária. Elas também destacam a estruturação do calendário, com espaço para formações de professores já em janeiro. O objetivo é de que iniciativas como o apoio pedagógico já possam ser trabalhadas desde a segunda semana de aulas, visto que o mapeamento das aprendizagens dos estudantes está em andamento. 

Transição na prática em uma escola pública 
Depois de considerar a perspectiva da rede, o processo de transição desdobra-se ainda mais quando se adentra na rotina de uma escola. “Tendo recebido apoio dos seus gestores, o professor volta-se para a sua turma em termos de defasagens e constrói a partir disso o planejamento para aquela sala de aula”, destaca Sonia Guaraldo. “Parece básico, mas esse olhar para a ação de cada professor às vezes não acontece e trata-se de algo muito necessário e bastante complexo.” 

Segundo Thiago Pereira de Souza, professor coordenador que trabalha com Ensino Fundamental – Anos Iniciais na Escola Estadual Gianfrancesco Guarnieri, em São Paulo (SP), a transição para 2022 é, de fato, bem complexa. “Em 2020, nós ainda tivemos um contato mínimo com as crianças, antes da pandemia. Porém, em 2021, o retorno de 100% dos alunos de forma presencial ocorreu apenas em outubro e foi bem desesperador, porque nos vimos diante de muitos desafios: parte da clientela da escola vive à margem da sociedade, quase na ‘periferia da periferia’, e então foi impossível acompanhar as aulas on-line. Já outra parte conseguiu participar do remoto. Tenho crianças que desapareceram, famílias que voltaram para os estados de origem, e precisamos administrar tudo isso.” 

Assim, esse retorno presencial dos alunos no fim do segundo semestre praticamente emendou com as reorganizações e o início da transição para 2022, exigindo esforços de toda a equipe. “Inicialmente, no retorno, trabalhamos a questão socioemocional com os professores, ensinando como ouvir os alunos”, recorda Thiago [veja aqui mais detalhes sobre esse trabalho realizado pela vice-diretora da escola, Sonia Maria Lima]. “Em seguida, os professores realizaram sondagens e reclassificaram os estudantes, avaliando o que eles possuíam de aprendizagem e repensando os trabalhos a partir dali. Então, eu e o outro coordenador auxiliamos na organização dessa reestruturação, utilizando recursos, tais como sequências didáticas, intervenções e trabalho com habilidades prioritárias.”

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Habilidades essenciais e aspectos socioemocionais
 
Para o educador, esse trabalho com aprendizagens essenciais continuará sendo muito importante na transição para 2022. “Tem muita coisa para ser recuperada, mas o crucial não é só olhar para essas habilidades, mas também pensar em como será o trabalho com elas. Dentro do trabalho metodológico do estado de São Paulo, por exemplo, recebemos orientações para valorizar as estratégias que os alunos utilizam para resolver as atividades, além de priorizar a aprendizagem significativa. Isso significa pensar em como ela é feita e como trazer um significado para a criança neste momento. Temos, na coordenação, o desafio de formar os professores para isso”, ressalta. 

Nessa linha, Thiago comenta que são muitas questões envolvidas na virada de ano letivo e que o trabalho de planejamento já começou. “O ideal é iniciar agora os planos para o ano que vem. Nas semanas de estudos intensivos (SEI) deste fim de ano [semanas previstas pelo calendário escolar paulista para análise dos percursos de aprendizagem dos estudantes], nós já vamos tabular e analisar conhecimentos e habilidades descobertos via sondagens e diagnósticos e estudar as mudanças na grade. E, até o final do mês, saberemos todos os professores que vão atuar nessa unidade.” 

Depois disso, segundo o coordenador, haverá, no começo de 2022, outra semana de estudos intensivos e uma semana de planejamento dos professores, em que será construído o caminho para o começo do ano. “Escuta ativa e questões socioemocionais voltam a surgir nessa hora, porque precisamos pensar em como criar o ambiente de retorno – tem aluno que não voltou até hoje. A própria dinâmica de recepção já pode incluir habilidades essenciais.” 

Por fim, Thiago enfatiza o que deve nortear a transição 2021-2022. “No retorno presencial, os professores ficaram desesperados com a recuperação das aprendizagens. Não tem um ser humano que torce mais para que a criança aprenda do que o professor. Então, se conseguirmos, na coordenação, controlar a ansiedade dos professores em relação às aprendizagens dos alunos, incentivá-los a irem aos poucos e aprofundarem as habilidades essenciais, já vamos começar a sanar os problemas que enfrentamos.” 

Replanejamento contínuo e recomposição de aprendizagens 
Tendo em mente todas as variáveis e os atores envolvidos neste ato de planejar a transição para 2022, a consultora do Instituto Gesto, Sonia Guaraldo, reforça que o fundamental nessa etapa é traçar grandes premissas de trabalho a serem desenvolvidas ao longo do ano. “Começamos a traçar tudo isso agora e em janeiro e fevereiro consolidamos o planejamento anual, mas o replanejamento é contínuo, em momentos como conselhos e fechamentos de bimestre.” 

Todo esse trabalho gira em torno da recomposição de aprendizagens, que funciona como um grande guarda-chuva de práticas que apareceram nas falas dos educadores entrevistados. “Dentro da recomposição, é preciso articular pilares, tais como busca ativa, reflexões de como avaliar e como engajar alunos e famílias e um replanejamento articulando habilidades prioritárias. Para esse último caso, ferramentas como os mapas de foco do Instituto Reúna seguem muito importantes, pois contam com uma lógica de progressão, garantindo avançar para habilidades complementares após atingir as prioritárias”. 

Conforme a especialista, a chave é realmente fixar um plano de ação com esses grandes princípios, articulando ensino e acolhimento com toda a comunidade escolar, sempre tendo como base uma relação de confiança entre os membros da equipe. “No fundo, para além das aprendizagens, é preciso repensar com as crianças e com as suas famílias qual é o sentido que a escola possui no mundo em que estamos vivendo agora. A gente estuda para quê? Será que na escola estamos conseguindo divulgar isso de forma concreta? Redes e escolas precisam refletir sobre isso”, conclui.

Este conteúdo faz parte de uma série especial sobre como planejar o fechamento do ano. Confira as demais reportagens aqui.

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