Carnaval: conheça sugestões práticas para usar marchinhas na alfabetização
Nos Anos Iniciais, o tema potencializa o desenvolvimento de habilidades que vão além da Língua Portuguesa
POR: Dimítria Coutinho“Mamãe, eu quero; mamãe, eu quero; mamãe, eu quero mamar! Dá a chupeta, dá a chupeta, dá a chupeta 'pro' bebê não chorar.” É por meio de versos simples, rimados e fáceis de decorar que as marchinhas de Carnaval perpassam décadas e gerações, continuando a fazer sucesso entre todos, inclusive as crianças.
Justamente por isso, esse gênero de música pode ser um valioso instrumento pedagógico nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, ao valorizar a cultura popular brasileira e ajudar os estudantes a desenvolver diversas habilidades.
“O Carnaval é uma festa popular que traz dados da nossa cultura, e a escola é o espaço de valorização da cultura popular. Por isso é importante trabalhar com esse tema”, comenta Érica de Faria, coordenadora pedagógica na Comunidade Educativa CEDAC.
Mauricio Maas, mestre em Artes Cênicas, integrante do grupo Barbatuques e professor do Instituto Singularidades, complementa: “As marchinhas carregam consigo muito carinho, sobretudo por se tratar de um ritmo que tem um caráter emotivo, que traz muitas lembranças”.
Além de honrar a cultura brasileira e auxiliar na construção cultural das crianças, as marchinhas também permitem o desenvolvimento de diversas habilidades, sobretudo as relacionadas à alfabetização. Os versos são marcados por rimas e textos fáceis de serem decorados, o que ajuda tanto a atrair a atenção das crianças quanto a aplicar atividades relacionadas à compreensão de textos.
O ano começa em festa
Neste ano, o Carnaval acontece em fevereiro, pouco depois do início do ano letivo. Por isso, muitos professores não terão tempo de planejar e executar atividades complexas antes das festividades – o que também não é um impeditivo para levar a temática aos estudantes.
Mesmo depois do Carnaval, ainda é possível trabalhar com marchinhas, já que todo o mês de fevereiro é marcado pela festa popular. Além disso, é possível iniciar um projeto antes do feriado e concluí-lo depois, por exemplo.
“Planejar atividades com esse tema não é tão difícil assim”, garante Mariluce Franca, professora do 3º ano do Ensino Fundamental na EE Professor Emidio José Pinheiro, no Guarujá (SP), onde também já foi professora de Arte do 1º ao 5º ano.
Todos os anos, a docente costuma abordar o tema do Carnaval das mais diversas formas, seja antes ou depois do feriado em si. No campo das Artes, algumas atividades envolvem a criação de instrumentos e fantasias, apresentações de peças teatrais com marchinhas e a produção de paródias musicais, permitindo o desenvolvimento de habilidades entre as turmas do 1º ao 5º ano.
Já como professora titular do 3º ano, Mariluce comenta que as marchinhas se relacionam muito facilmente com a alfabetização, já que o gênero musical permite o desenvolvimento da leitura e da escrita.
Alfabetização cantada
Nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, uma das formas mais poderosas de trazer as marchinhas de Carnaval para a sala de aula é justamente como instrumento para o desenvolvimento de habilidades relacionadas à alfabetização.
“Quando as crianças sabem o texto de cor, como no caso das marchinhas, o trabalho delas não é pensar o que escrever, porque isso já está dado. O foco da criança está todo em saber como escrever essas palavras, e isso tem um valor pedagógico enorme”, avalia Érica.
A partir de textos previamente decorados, a especialista afirma que os estudantes podem refletir sobre o sistema de escrita, pensando quais e quantas letras usar e em qual ordem. “É isso que vai ajudá-las a avançar em suas hipóteses de escrita e leitura, apropriando-se cada vez mais ou consolidando o trabalho de alfabetização”, completa. O uso de textos que as crianças já conhecem é, inclusive, uma das grandes estratégias para auxiliar na recomposição das aprendizagens, já que facilita o desenvolvimento da escrita, comenta Érica.
As possibilidades para o trabalho com marchinhas carnavalescas são vastas durante o período da alfabetização. Do 1º ao 3º ano, é possível, por exemplo, pedir que os alunos escrevam marchinhas e produzam um mural; organizar grupos para montarem trechos das canções com letras móveis; produzir paródias para serem escritas pelos alunos ou pelo professor; identificar versos previamente escritos após ouvir uma marchinha; fazer o reconhecimento de letras; e trabalhar a análise fonológica e estrutural das palavras, além da ortografia.
Já em turmas mais avançadas, como no 4º e 5º ano, nas quais os estudantes já se apropriaram do sistema de escrita, é possível consolidar as aprendizagens com elementos como as rimas, versos e estrofes, além de entrar em análises mais aprofundadas no que diz respeito ao significado das letras das marchinhas, que muitas vezes trazem ironia, humor ou elementos de outros contextos históricos. “Esse trabalho na sala de aula vai ajudar o aluno a se perceber enquanto leitor, analisando o que ele precisa para atribuir sentido aos textos”, afirma Érica.
No ritmo das marchinhas
Para levar o Carnaval para dentro da escola com intencionalidade pedagógica, a professora Marília Forte, do time de autores da NOVA ESCOLA, produziu o plano de aula “No ritmo das marchinhas”, destinado ao 2º ano do Ensino Fundamental. Por meio dele, é possível trabalhar com os estudantes a relação entre elementos sonoros e sua representação escrita, a leitura de palavras novas e a identificação da função social de textos, entre outros pontos.
No plano de aula, a professora usou a marchinha Mamãe, eu quero, para que os alunos identifiquem palavras e, nelas, letras e sílabas. Além disso, os aspectos culturais do gênero musical também são abordados.
A depender do contexto da turma, Marília comenta que dá para fazer adaptações no plano de aula. É possível, por exemplo, escolher uma marchinha diferente da proposta e que tenha alguma importância local para a cidade ou o estado onde a escola está situada. Outra adaptação que pode ser feita é pedir que os alunos façam uma escrita espontânea após ouvirem a marchinha, o que pode servir como um diagnóstico para o professor. Também dá para distribuir versos ou palavras da marchinha para que os estudantes, em grupos, façam a composição do texto.
Independente de haver adaptação ou não, a principal dica de Marília para a aplicação deste plano de aula é que o professor permita que os alunos sejam protagonistas do processo, intervindo apenas pontualmente para fazer questionamentos que levem os próprios estudantes à reflexão.
Além da alfabetização
Para além da Língua Portuguesa, diversos outros componentes curriculares podem se apropriar do tema das marchinhas carnavalescas nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Confira algumas sugestões de atividade:
- História: abordar o contexto histórico de produção das marchinhas, bem como tentar encontrar histórias locais relacionadas ao Carnaval, seja com os familiares dos estudantes ou com a comunidade escolar;
- Arte: confeccionar instrumentos e fantasias, trabalhar com a musicalidade ou produzir peças teatrais;
- Educação Física: desenvolver coreografias a partir das marchinhas carnavalescas;
- Geografia: abordar os diferentes ritmos musicais relacionados ao Carnaval nas diferentes regiões do Brasil;
- Matemática: fazer uma pesquisa com os familiares e produzir gráficos e tabelas com as marchinhas mais citadas, ou trabalhar com sistemas numéricos a partir das datas de criação das marchinhas;
- Ciências: produzir paródias de marchinhas com temas relacionados à disciplina.
Seja na alfabetização ou para desenvolver habilidades relacionadas a outros componentes curriculares, é essencial que o trabalho com as marchinhas carnavalescas venha acompanhado da sua importância cultural. “É muito importante conversar com as crianças sobre a questão da tradição, de como as marchinhas surgiram. O Carnaval faz parte da nossa cultura, e é importante honrar essa tradição”, reforça Maurício, professor do Instituto Singularidades.
Para que as crianças se sintam valorizadas, as produções relacionadas ao tema do Carnaval, sejam de escrita, dança, música ou pesquisa, podem ser expostas na escola ou apresentadas para outras turmas, por exemplo.
“Essa situação de leitura e de escrita em torno das marchinhas, por exemplo, precisa ter um propósito comunicativo. É necessário que as crianças não leiam só por ler, mas para alguém”, aconselha Érica.
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