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Asperger: como a escola deve acolher o aluno e os pais

POR:
Mariana Della Barba
Foto: Getty Images

Confusão. Falta de empatia. Caos. Esses são alguns termos usados por pais e mães para definir o período em que seus filhos com Síndrome de Asperger frequentaram escolas que não estavam verdadeiramente preparadas ou dispostas a recebê-los.

“Quando meu filho começou a estudar, não sabíamos exatamente o que ele tinha. A primeira escola para a qual ele foi era grande, mais tradicional. Mas ele não conseguiu ficar de jeito nenhum. Os professores não estavam nem um pouco preparados. Foi uma tristeza", conta Izabel Grandinetti Barros, presidente da Associação da Síndrome de Asperger Asa-Tea MG.

O filho de Izabel, Henrique Grandinetti de Barros, só foi diagnosticado com Síndrome de Asperger aos 9 anos. O menino tinha fascinação por dinossauros, sabia tudo a respeito deles. Ele também já foi fanático por números. Essa é justamente uma das características da Síndrome de Asperger: ter um tema de interesse no qual focam incansavelmente durante um certo período de tempo. 

Eles se dedicam tanto ao assunto que costumam se tornar especialistas e podem acabar desenvolvendo habilidades extraordinárias, seja no conhecimento de animais pré-históricos até em exercícios matemáticos, por exemplo.

Para os educadores, o desafio é integrar essas habilidades a outras desenvolvidas em sala de aula. Para os pais, em geral, trata-se de uma peregrinação até encontrar uma instituição de ensino que oferece o acolhimento que a criança precisa para ser feliz e aprender de acordo com as suas necessidades. 

Izabel Grandinetti Barros e o filho Henrique, que demorou a ser diagnosticado com Síndrome de Asperger. Ela se tornou presidente da Associação da Síndrome de Asperger Asa-Tea MG    Foto: Acervo pessoal

O que mudou na classificação

A síndrome foi incluída no chamado Transtorno do Espectro Autista (TEA) em 2013 – antes disso, era considerada uma condição distinta. Mas diferentemente de outros tipos de autismo, as crianças com Asperger não costumam apresentar atrasos cognitivos graves.

A nova classificação, que investiga mais sintomas, agrupou algumas categorias. Se antes eram quatro principais (Comunicação, Interação Social, Interesses Restritos e Comportamentos Repetitivos), hoje, as duas primeiras foram agrupadas em uma só.

Assim, na área de Comunicação & Interação Social, são analisados o grau de respostas atípicas, déficits para responder a interações com outras pessoas, dificuldade de manter relacionamentos/amizades, dificuldade de interpretação em relações não-verbais.

Já nas outras categorias se analisa o grau e a frequência das chamadas obsessões por interesses restritos (como enfileirar objetos ou números ou determinadas cores). A terceira área analisa os comportamentos considerados repetitivos, em que ocorre um apego excessivo à rotina, além de atividades e movimentos reiterados e constantes.    

Escuta e parceria são fundamentais

Mesmo com déficits mais leves que outras síndromes dentro do TEA, o relato de pais mostra como é complexo achar uma escola. Izabel Grandinetti Barros precisou mudar o filho de escola. "Ele foi para uma menor, com só oito alunos por classe. E foi ótimo”, lembra.

Ela conta que o acolhimento foi importantíssimo para a ambientação de Henrique. “Havia uma parceria muito grande minha com a diretora e a psicóloga da escola; uma disposição em ouvir o nosso lado. Lá ninguém nunca forçou nada. Quando o Henrique não queria ir para a quadra, elas deixavam ele ficar brincando com os dinossauros dele numa boa. E de tempos em tempos a gente voltava a conversar, para ir ajustando tudo."

Para Joana Elkis, coordenadora educacional da escola Alecrim, em São Paulo, esse trabalho conjunto entre pais e escola é peça fundamental para promover uma melhor recepção. "A escuta é fundamental para qualquer inclusão no ambiente escolar. Da parte da coordenação e dos professores, é preciso que haja uma disponibilidade em se adaptar para acolher da melhor maneira possível as dificuldades dessa criança."

A coordenadora afirma que é preciso “olhar de perto” a criança com Asperger para entender o melhor caminho a adotar em cada caso. Ela cita como exemplo o currículo escolar: há casos em que é necessário montar um programa especial e em outros, é mais válido seguir o mesmo currículo para manter o desafio para a criança, garantindo um acompanhamento especial ou dando-lhe um tempo diferente para cumprir as atividades. 

Joana Elkis, coordenadora educacional da escola Alecrim, em São Paulo   Foto: Acervo pessoal

Compartilhar as habilidades

Izabel se lembra com carinho de uma professora que trabalhava muito para integrar os interesses de seu filho Henrique ao currículo escolar. "Nunca vou me esquecer do quanto ele ficou feliz quando a professora propôs que ele desse uma ‘palestra’ sobre dinossauros para os colegas. Ele se sentiu realizado e os alunos também gostaram. Eles estavam estudando dinossauros naquela época, então cada um fez uma pesquisa individualmente e depois o Henrique foi lá na frente falar para a classe."

Para Joana, é papel da escola encontrar um jeito legítimo de a criança com Asperger participar das atividades em classe. "Pegar essa super habilidade e reverter isso para o grupo acaba sendo interessante para todos", diz a coordenadora. 

Cuidado na comunicação

Outra característica vinculada à Síndrome de Asperger é o fato de muitas vezes não conseguirem entender ironias e metáforas. "O fato de verem o mundo de um modo mais objetivo e concreto pode atrapalhar a comunicação, seja na compreensão do que o professor está falando ou na maneira que a criança (com Asperger) fala com os colegas, que muitas vezes não tem filtro", diz Joana.

Para evitar esse tipo de entrave, ela afirma que é preciso investir em formas de melhorar a comunicação com esse aluno. Outra conduta positiva por parte do professor é estar atento para, quando necessário, agir para que a criança com Asperger não seja mal interpretada pelos colegas por sua maneira franca e direta de se colocar.

A professora do departamento de Educação Especial da Unesp Anna Augusta Sampaio de Oliveira afirma que "os docentes têm de estar sempre próximos para evitar processo de isolamento desses estudantes, atuando até como mediadores, trabalhando para que essa criança e os colegas se aproximem". 

Um exemplo real de como driblar essa dificuldade aconteceu com Henrique Gradinetti de Barros, quando ele teve problemas para acompanhar a aula de Filosofia. Ao cursar sua primeira faculdade, História, ele sentiu dificuldade com as aulas de conteúdo subjetivo.

A alternativa encontrada por seu professor foi dividir a prova em tópicos para facilitar a compreensão e o raciocínio do aluno. Funcionou: tanto que Henrique se formou e hoje, aos 24 anos, cursa sua segunda graduação, em Direito. 

Evento promovido pela Associação da Síndrome de Asperger Asa-Tea MG   Foto: Reprodução/Facebook

Investir em formação

Para acolher bem um estudante com Asperger, mantê-lo interessado, se comunicando bem e valorizando suas habilidades, os especialistas afirmam que é preciso investir na formação da equipe.

"É fundamental que a coordenação trabalhe com os professores para discutir os melhores caminhos para adaptar o programa e as estratégias”, diz Joana Elkis, da escola Alecrim. “Trabalhamos muitos com textos teóricos e até filmes que tratam desse tema, sempre tendo em mente cada caso".

Outro desafio apontado por ela é afinar a conduta da escola com as linhas de tratamento que essas crianças seguem fora da escola, em terapias comportamentais ou com acompanhamento psicológico, por exemplo.  

A professora Anna Sampaio, da Unesp, lembra que desde 2008 está previsto em lei a existência de uma rede de suporte ao Atendimento Educacional Especializado, que pode ser em forma de aulas no contraturno, um centro de atendimento a esses alunos ou mesmo o apoio de professores especializados a colegas que lidem com pessoas que têm a síndrome. 

Henrique ao lado da mãe Izabel Grandinetti Barros: graças ao acolhimento e esforço, ele conquistou graduação em História e agora estuda Direito   Foto: Acervo pessoal

O que mudou?

Tanto para Izabel, com a experiência com seu filho e dentro da associação que coordena, como para as especialistas em educação ouvidas, a inclusão da Síndrome de Asperger dentro do espectro autista não trouxe grande impacto no ambiente escolar até o momento.

Anna faz, inclusive, um alerta de que é preciso ter em mente que uma pessoa com síndrome de Asperger não tem deficiência intelectual e pode aprender qualquer conteúdo, bastando que seja passado de outra forma. "É importante não se prender tanto ao diagnóstico em si, levando em conta mais as especificidades da criança", afirma.

A mudança na classificação, aliás, acabou trazendo outro problema para pais e educadores. Como fica dentro da classificação de autismo, o número de crianças diagnosticadas deve subir daqui para frente. O que só aumenta a necessidade de que pais, professores e escolas estejam atentos para garantir a melhor educação para as crianças.

 

Referências

Associação da Síndrome de Asperger Asa-Tea MG
Livro "Humor Azul - o lado engraçado do autismo" 

Associação Inspirare 

Associação de Amigos do Autista

 

 

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