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Inglês: projeto mostra que presença de imigrantes melhora o ensino

Com o desafio de mostrar que aprender inglês é possível em escolas públicas, Cristiane Dias também conduziu seus alunos em uma pesquisa sobre os imigrantes na cidade

POR:
Camila Cecílio
Cristiane Dias com alunos do projeto We Speak the Same Language, que levou o Prêmio Educador Nota 10   Crédito: Eduardo Marques

Nem em casa, nem em sala de aula. Foi em uma loja de departamentos que a professora Cristiane Dias, 41, teve a ideia que mudaria a forma de ensinar – e de aprender – Língua Estrangeira na EEB Maria José Hulse Peixoto, em Criciúma (SC). Ao perceber a dificuldade de uma funcionária em se comunicar com um ganês e um haitiano que procuravam emprego, a educadora logo se prontificou a ajudá-los, uma vez que não falavam português. A partir dali, Cristiane começou a refletir sobre a realidade dos imigrantes em busca de uma vida melhor na cidade e nas barreiras que eles encontravam: as da língua e as do preconceito.

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“No dia seguinte, entrei na sala de aula e escrevi na lousa a palavra xenophobia (xenofobia em inglês) e perguntei aos meus alunos se eles sabiam o que significava”, lembra. Assim nasceu o We speak the same language, projeto com o intuito de trabalhar com estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental a Língua Inglesa, mas também a empatia e o respeito à diversidade. Os resultados foram tão positivos que Cristiane recebeu o prêmio Educadora Nota 10 em 2018.

A professora, que há 15 anos leciona na escola, conta que o maior desafio era desconstruir as ideias de que não se aprende inglês em escola pública, de que a língua é difícil e de que não tinha razão para estudar o idioma no Brasil. Quando ela percebeu que havia muitos imigrantes passando por dificuldades – que iam desde um pedido de informação a episódios de xenofobia por parte de moradores locais –, sabia que era o momento unir todas essas questões. “Naquele dia, saí da loja de departamentos incomodada, pensando em como meus alunos poderiam ajudar essas pessoas e, então, decidi juntar tudo no projeto”, recorda. 

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Como posso desenvolver esse projeto na minha escola?

Para Cristiane, o projeto pode e deve ser replicado em outras escolas. É importante aproximar o cotidiano do aluno do que se ensina na escola, diz. Para começar, o professor pode se informar sobre a existência de imigrantes na cidade e convidá-los a conversar com os alunos. Caso o educador não conheça nenhum imigrante, uma alternativa bacana seria entrar em contato com pessoas que moraram em outros países, especialmente países que têm no inglês ou no espanhol sua língua oficial.

Outra dica é entrar em contato com escolas de idiomas que, geralmente, contratam pessoas que já moraram em outros países ou até mesmo estrangeiros para lecionar. “É importante que o professor entenda que, melhor do que o aluno pronunciar corretamente as palavras em inglês, é ele ter autonomia para se comunicar em inglês”, ressalta. 

We speak the same language - por CristianE DIAS 

Crédito: Eduardo Marques



INDICAÇÃO: Fundamental II, 1º Ano do Ensino Médio
DISCIPLINAS: Língua Estrangeira - Inglês e Espanhol
DURAÇÃO: 2 meses 

O que é o projeto?
O projeto We speak the same language foi pensado para quebrar barreiras e mostrar que todos podemos aprender e falar inglês para nos comunicarmos com os estrangeiros que visitam ou moram no Brasil. “Na minha cidade (Criciúma), recebemos muitos imigrantes africanos que falam inglês e francês. Então, falar inglês ajuda a combater o preconceito e a promover o respeito e a empatia”, afirma a professora. “Como o projeto aborda temas como preconceito, xenofobia, entre outros, é interessante que a turma seja mais madura, já tenha estudado temas relacionados á imigração em outras disciplinas e tenha repertório para debater e opinar”. 

Do que vou precisar?
Para desenvolver o projeto, Cristiane usou os seguintes conteúdos:
· Um vídeo de um supermercado alemão que retirou todos os produtos estrangeiros das prateleiras, deixando o supermercado praticamente vazio, para mostrar a importância do outro em nossa vida.
· Imagens dos estrangeiros que vivem em Criciúma, retiradas de reportagem dos jornais e sites
· Para trabalhar as direções em inglês, um mapa de uma cidade com áudio em inglês. Os alunos ouviam as instruções e acompanhavam no mapa o deslocamento até o local indicado

Como a escola não possui sala informatizada nem acesso à internet Wi-Fi, os alunos utilizaram os próprios celulares para baixar e utilizar o aplicativo VOKI, que cria avatares que "falam" inglês. “Esse aplicativo ajudou muito os alunos a lidar com o idioma de forma divertida, pois eles puderam trocar os sotaques, mudar roupa, cabelo e acessórios de seus avatares”, diz a professora. Dicionários também auxiliaram no processo, que podem ser online ou em papel.

Quanto tempo é necessário para planejar e executar o projeto?
Todo o projeto foi executado em dois meses, já que na grade da escola constavam três aulas de inglês por semana. Mas o professor pode incrementar e até mesmo transformar em um projeto interdisciplinar, convidando outros professores a pensar e discutir aspectos variados da imigração. 

Quais os objetivos trabalhados?
O objetivo desse projeto era quebrar a barreira de que não se aprende inglês na escola pública, de que o inglês não é “necessário” porque estamos no Brasil. “Outro objetivo importante foi utilizar a Língua Inglesa como meio de combater a xenofobia e o preconceito, gerando respeito”. Em vista da implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o projeto toca ainda nas seguintes competências gerais:
- Conhecimento
- Comunicação
- Cultura digital 

E os desafios? Como encará-los?
Um dos problemas enfrentados foi a falta de computadores e de acesso à internet, que fez com que os alunos tivessem de usar seus próprios smartphones. “Cheguei a desanimar um pouco, pois imaginei que eles não iriam querer usar o aplicativo devido à falta de acesso à internet. Mas eles ficaram bem animados e, para minha surpresa, fizeram vídeos ótimos e até memes”, conta Cristiane. Ela diz que gostaria também de ter levado os alunos até a Associação dos Imigrantes Ganeses, mas como a escola não dispõe de ônibus, não houve como viabilizar o transporte. “Ainda assim, o projeto não ficou prejudicado, pois os imigrantes estão pela cidade: trabalhando em restaurantes, como ambulantes, no caminhão do lixo. E alguns alunos conseguiram se comunicar com eles, o que deixou o projeto mais rico”. 

E no final? O que meus alunos vão aprender?
Com relação ao conteúdo da Língua Inglesa, os alunos ampliaram seu repertório, aprendendo mais palavras em inglês, e o mais importante, palavras que eles utilizam no dia a dia. “Aqui na minha cidade tem farmácia que já mudou a placa para drugstore, além das lojas que colocaram o store junto ao nome do estabelecimento”, diz a professora. Saber pedir e dar informações foi muito útil, pois nunca se sabe quem será possível ajudar a partir do conhecimento de uma língua estrangeira. “Uma aluna minha encontrou um imigrante que perguntou a ela onde ficava o mercado. Ela me disse: ‘Professora, quase que eu voltei para casa para pegar o meu caderno de inglês para conversar com ele’". Eles aprenderam que “a diversidade nos faz melhores”. “Costumo dizer que as melhores oportunidades pessoais e profissionais na minha vida eu tive por saber falar inglês. É isto que tento mostrar todos os dias para meus alunos”.  

                                     

Cristiane Dias é graduada em Letras - Português/Inglês e tem especialização em Metodologias no Ensino de Línguas Estrangeiras Modernas. Leciona desde 2000 e aprendeu a falar inglês sem sair do Brasil, mas sempre teve contato com professores estrangeiros. 

 

 

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