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Replanejamento na Educação Infantil: como analisar evidências e repensar propostas?

Nesses primeiros meses, já podemos visualizar os impactos causados pela pandemia no desenvolvimento das crianças – e por isso conseguimos reordenar nossas ações com foco total na aprendizagem

POR:
Paula Sestari
Foto: Getty Images

Olá, professoras e professores, tudo bem por aí? Estamos prestes a completar um primeiro período de atividades letivas, ou seja, é hora daquele habitual movimento de colher, organizar e comunicar as evidências das aprendizagens das crianças, compondo a documentação avaliativa da Educação Infantil

Na rede de ensino em que atuo, preparamos um relato avaliativo que será disponibilizado às famílias, além dos materiais que já foram compartilhados ao longo deste período, como fotos, registros de propostas realizadas na escola com apoio dos próprios familiares, exposição de obras dos pequenos, entre outros. 

A partir desses registros, podemos consolidar a análise e o replanejamento das nossas ações de trabalho, que devem estar sempre pautadas na garantia dos direitos de aprendizagem das crianças e ter como foco a seguinte questão: “O que as crianças tiveram a oportunidade de aprender ao longo desses meses?”. Nesse balanço, vale refletir sobre as vivências que foram significativas, pensando em meios de torná-las ainda mais atrativas e desafiadoras, e também identificar os momentos que foram difíceis, definindo quais as iniciativas necessárias para retomar essas propostas de forma a alcançar o devido impacto. 

Nessa conversa de hoje, gostaria de apresentar alguns pontos que já consegui evidenciar a partir da minha realidade e que podem ajudar você, professor, a reconhecê-los na sua escola e posteriormente redefinir estratégias garantindo, acima de tudo, condições para o pleno desenvolvimento de meninas e meninos. 

Reflexos da pandemia no desenvolvimento das crianças

Desde que o retorno ao modelo presencial se consolidou, o foco em todas as escolas foi retomar uma convivência harmoniosa e restabelecer laços de confiança entre crianças e adultos. Porém, diversas questões envolvendo os marcos de desenvolvimento dos pequenos, suas preferências, características e modo de convívio em sociedade foram alteradas devido aos reflexos do período pandêmico. 

Assim, quem está acostumado com o ritmo de determinado grupo etário, pode ter notado certas alterações. Como exemplo, é possível identificar um número maior de crianças fazendo uso chupetas, com paninhos como objetos de apego e sendo mais seletivas ao experimentar novos alimentos. Outra questão está relacionada a certos pontos de conquista, como o desfralde, que está acontecendo com crianças já com quatro anos completos. Essas alterações exigem, então, um olhar mais cuidadoso por parte do professor, para apoiar esses momentos e ampliar a aprendizagem. 

Isso nos leva, então, ao ponto de rever os nossos planejamentos. O sentido desse processo de replanejamento está em entender que esse é um caminhar não linear – e muito menos uma via de mão única. Pelo contrário: o sentido da aprendizagem e desenvolvimento das crianças é circular, irregular e acontece no campo das relações que estabelecem entre o que é vivenciado na escola e o que a convivência familiar e comunitária oportuniza. 

Por falar na comunidade, também é comum a constatação de que as dificuldades financeiras e sociais intensificadas pela pandemia se mantêm alarmantes – e as crianças sofrem com os impactos diretos dessas condições de vulnerabilidade, que podem prejudicar o seu desenvolvimento. Essa já é uma questão mais complexa, mas, da nossa parte na escola, podemos pensar em estratégias como a busca ativa para acompanhar de perto essas famílias. 

O que levar em consideração ao (re)pensar propostas?

Muitos dos impactos causados pela pandemia ocorreram porque grande parte das crianças ficou com contato ainda mais restrito com a natureza e mesmo com outras crianças. Por isso, cabe a nós, educadores, entendermos as potencialidades que as brincadeiras ao ar livre podem oferecer, levando em consideração os materiais, a diversidade de elementos e mesmo a variação de tempos e espaços, para que cada criança consiga (re)construir suas percepções de maneira particular. 

Como os pequenos ficaram menos tempo expostos a brincadeiras de desafio corporal, é possível observar maior ocorrência de quedas e mesmo de fraturas (já que se colocam em risco com mais facilidade). Sendo assim, é importante a mediação cuidadosa do professor quando em áreas que possam oferecer certos riscos, como parques, escadas e áreas com solo de nível irregular, bem como se preparar para um trabalho de prevenção e conscientização sobre pequenos acidentes. 

É possível observar ainda alterações relacionadas ao desenvolvimento da fala e ao repertório de músicas e brincadeiras, que estão cada vez mais ligados às redes sociais, à cultura produzida pelos adultos e aos aplicativos, devido ao maior tempo de consumo de telas – mesmo entre os bebês. Assim, é válido que o professor pense e estimule a convivência em interações que valorizam a boa conversa e os momentos de partilha de saberes. As rodas podem ser planejadas com a elaboração de questões mais pontuais, de maneira sistematizada para que as crianças possam vivenciar momentos de real interesse pelo que elas pensam e sabem a respeito das experiências vividas. 

Um último ponto diz respeito à sequência de propostas quando pensamos nas primeiras hipóteses de escrita. Trata-se de algo que pode nortear o planejamento desse período, mas que deve ser bem pensado, trazendo à tona quais outras habilidades é preciso oportunizar antes, como as brincadeiras que exigem percepção corporal, coordenação motora e que contribuem com noções de lateralidade.  

Queridas professoras e professores, esses pontos que compartilhei aqui podem ser bastante desafiadores no nosso dia a dia, mas, ao reconhecê-los, é possível definir as primeiras metas para um novo ciclo, nesse momento em que nossas referências estão fragilizadas e que, mais do que nunca, precisamos colocar as crianças como ponto central de todas as nossas práticas. 

Um abraço e até breve!

 

Paula Sestari é professora da Educação Infantil da rede municipal de ensino de Joinville (SC), com dez anos de experiência nessa etapa, e mestre em Ensino de Ciências, Matemática e Tecnologias. Em 2014, recebeu o Prêmio Educador Nota 10, da Fundação Victor Civita, e foi eleita Educadora do Ano com um projeto com crianças pequenas na área de Educação Ambiental.

 

 

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