Combate à evasão: como fazer a busca ativa em 2022
Organizar um esforço multidisciplinar e acolher os estudantes são ações fundamentais para realizar esse trabalho
POR: Camila CecílioÀs vésperas de completar dois anos, os impactos da pandemia da Covid-19 ainda são sentidos no país. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) apontou que, em 2020, 1,2 bilhão de estudantes no mundo foram afetados pelo fechamento das escolas.
Em novembro de 2020, segundo estudo publicado em 2021 pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com o Cenpec, mais de 5 milhões de estudantes brasileiros não tiveram acesso à educação — número semelhante ao que tínhamos no início dos anos 2000.
Desse total, mais de 40% eram crianças de 6 a 10 anos, etapa em que a escolarização, antes da Covid-19, estava quase universalizada. “O que temos assistido é a uma diminuição do número de alunos matriculados no Ensino Fundamental”, frisa Solange Feitoza Reis, coordenadora de Pesquisa e Avaliação do Cenpec.
No segundo semestre de 2021, segundo levantamento do Todos Pela Educação, a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), cerca de 244 mil crianças e adolescentes entre 6 e 14 anos estavam fora da escola. Essa realidade representa aumento de 171% em relação a 2019, quando o número era de 90 mil crianças longe das salas de aula.
Com o ano letivo de 2022 prestes a começar, em um contexto em que a pandemia ainda é real, secretarias e escolas terão de desempenhar esforços para atrair os alunos. Pensar e executar estratégias de busca ativa escolar será fundamental para que o abandono não se torne evasão — entenda a diferença entre os conceitos no quadro abaixo. “No contexto que estamos atravessando, no qual as taxas de abandono e evasão subiram drasticamente, temos de dar maior ênfase a essa política [de busca ativa], pois tivemos um retrocesso significativo”, aponta Solange.
Abandono e evasão escolar
Entenda o que significa cada termo
Abandono escolar é um dos indicadores que, junto com a reprovação e a aprovação, compõe o que se denomina de rendimento escolar. Esses dados são gerados por cada escola ao final do ano letivo.
Evasão escolar é a situação do estudante que abandonou a escola em determinado ano letivo e que não efetuou a matrícula no ano seguinte. Neste caso, portanto, evade-se do sistema de ensino.
O que esses dados significam? “É importante notar que há um ciclo do fracasso escolar que se retroalimenta por uma combinação desses indicadores (reprovação, distorção idade-série e abandono), causando altas taxas de evasão escolar, ainda mais se considerarmos variáveis como localização, raça, cor e gênero. Essa situação dificulta a permanência de crianças e adolescentes nas escolas, colocando em xeque o direito à educação”, explica Solange.
Para a especialista, o principal desafio neste momento é atuar de forma intersetorial, combinada e sistêmica, pois “o fenômeno da exclusão escolar é multifacetado e exige a articulação de diferentes áreas do governo, como a Educação, a Assistência Social e a Saúde, da sociedade civil organizada, como os Conselhos de Proteção, e de atores sociais”.
Busca ativa na prática
Apesar do cenário desafiador, as perspectivas do grupo de Busca Ativa Escolar de Petrolina (PE) são as melhores, segundo a coordenadora operacional Nara Siqueira. Desde o início da pandemia, foram registrados 576 possíveis situações de abandono, com o retorno de 374 estudantes quando as escolas voltaram às atividades presenciais.
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Entenda como planejar o acolhimento emocional, a busca ativa, a organização para um retorno seguro, com todos os protocolos de higiene e saúde, e a garantia da aprendizagem.
Os casos foram cadastrados na plataforma Busca Ativa Escolar, ação desenvolvida pela Unicef, em parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). A iniciativa busca garantir o acesso e a permanência dos alunos nas escolas ao permitir identificação, registro, controle e acompanhamento daqueles que estão em situação de abandono escolar. “É uma ferramenta social que congrega uma metodologia e uma plataforma que organiza os diferentes esforços”, explica Solange.
Nara explica que o resgate dos estudantes tem sido possível graças ao trabalho realizado por uma equipe multidisciplinar — há professores, pedagogos, assistentes sociais e psicólogos — que, em parceria com as escolas, indica potenciais casos de abandono. Com o apoio da gestão escolar, esses profissionais passam a atuar também junto às famílias, com o intuito de tratar as situações para evitar a evasão.
Entre as iniciativas, foram realizadas entrevistas com as famílias durante o ensino remoto e um acompanhamento dos estudantes que estavam acessando as atividades e de quem retirou os kits pedagógicos e de alimentação.
Em 2022, o objetivo é superar as situações de abandono que já foram mapeadas e aquelas que ainda podem surgir durante a campanha de rematrícula deste ano. “Após a finalização dessa etapa, teremos o cenário de quem não se matriculou, de quem não buscou a rede. Com isso mais bem desenhado, também conseguiremos mapear as situações de exclusão escolar”, diz.
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Experiências no Maranhão e em São Paulo
O período de ensino remoto também foi o momento em que a estratégia da busca ativa foi mais utilizada por uma equipe em Trizidela do Vale (MA). “Fizemos chamadas públicas pelas ruas, conscientizando as famílias da importância do vínculo escolar, e temos trabalhado para não deixar nenhum aluno fora da escola”, conta Gerlane Aragão Aguiar, coordenadora da Busca Ativa Escolar na região.
Não bastasse os efeitos da pandemia, anualmente as fortes chuvas provocam enchentes e alagamentos na cidade. Diversas famílias precisam recorrer aos abrigos, e, com isso, muitos alunos deixam de ir à escola — até porque algumas unidades acabam se tornando refúgio para os que foram afetados pela chuva.
Por isso, uma das ações da equipe de Gerlane foi detectar em quais abrigos os estudantes estavam localizados para ajudar na manutenção do vínculo com a escola. Atualmente, a equipe acompanha 142 casos registrados na plataforma da Busca Ativa Escolar, dos quais 106 surgiram com a pandemia.
“Para este ano, já está no nosso plano de ação buscar parcerias com igrejas, grupos culturais de dança, ballet e capoeira, e com as escolinhas de futebol. Vamos tentar seguir essa linha e fazer um trabalho de conscientização [da importância de permanecer na escola] com as pessoas que empregam adolescentes”, compartilha Gerlane.
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Entenda como fazer o planejamento tendo em vista a realidade dos alunos neste momento, compartilhar formas de realizar busca ativa aos evadidos e de resgatar a identidade escolar, para que os alunos se sintam pertencentes àquela comunidade e criem laços com a instituição de ensino.
Itanhaém, município da Baixada Santista (SP), também sente os bons resultados da estratégia. Em 2021, foram notificados 1.522 alertas de ausência durante o ensino remoto e depois no híbrido.
Com as ações da equipe de Busca Ativa Escolar da cidade, o ano foi encerrado com apenas 10 casos — os quais continuam estão sendo acompanhados. “Quanto aos alunos sem matrículas, faremos um estudo para que possamos encontrar crianças nos bairros e garantir o direito de acesso e permanência na escola”, afirma Márcia Galdino, secretária de Educação do município.
Sugestões para planejar a busca ativa em 2022
Para começar o trabalho, Solange aponta que é preciso realizar uma pactuação no território entre os diferentes atores do poder público, sistema municipal e sistema estadual, área da assistência social e conselhos de proteção. Além disso, é preciso estabelecer um compromisso com esses diferentes atores para enfrentar juntos a exclusão e determinar quais são as responsabilidades de cada participante, os fluxos e os protocolos a serem seguidos.
Outras dicas para realizar uma boa busca ativa escolar são:
- As escolas devem fortalecer os vínculos com os estudantes: uma estratégia interessante é promover o acolhimento da comunidade e realizar um trabalho voltado para o desenvolvimento de competências socioemocionais;
Realizar pesquisas constantes com famílias e estudantes: esse diálogo, além de colaborar para a manutenção da relação, permite identificar quais são as dificuldades que causam a falta de participação e mapear possíveis casos de alunos que correm risco de evasão. Acompanhamento é a palavra-chave, tanto dentro da escola quanto para o monitoramento feito dentro das secretarias de Educação;
Sistematizar e atualizar os dados: todas as informações devem estar devidamente registradas para, por meio da análise das evidências, encontrar formas de solucionar os problemas encontrados.
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