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Matemática: 3 sugestões para trabalhar a cultura e os saberes dos povos indígenas

Atividades envolvendo contagem, sistema de representação numérica, jogos e Geometria são caminhos para levar o tema para os Anos Finais do Fundamental

POR:
Rosiane Prates
Entenda como levar à sala de aula uma perspectiva cultural para as aula de Matemática dos Anos Finais com o recorte da valorização dos povos indígenas brasileiros. Foto: Getty Images

Olá, professoras e professores! Quando a cultura e os saberes dos povos indígenas dialogam com as aprendizagens curriculares, garantimos o trabalho previsto na Lei 11.645/08, que altera a Lei 10.639/03 e determina a obrigatoriedade do estudo das histórias e culturas africana, afro-brasileira e indígena durante toda a Educação Básica.

Vale destacar que esse olhar atento para o planejamento e realização dessas atividades deve estar presente durante todo o ano.

A perspectiva da etnomatemática

Para falar desse assunto, é interessante olhar para os estudos do professor Ubiratan D’Ambrosio. O pesquisador destaca que, para compreender a cultura de determinado povo, a história e os saberes matemáticos são pontos de partida para entender as formas de viver e pensar de uma sociedade.    

Com base nessa concepção, de entender as perspectivas históricas e culturais da Matemática, temos a oportunidade de planejar e propor atividades que considerem saberes de diferentes povos.

Destaco três caminhos para auxiliar a garantir que a valorização dos povos originários esteja presente em sua sala de aula nos Anos Finais do Ensino Fundamental.

1) Proponha reflexão a respeito de estratégias de contagem e sistema de representação numérica

Nos Anos Finais, em especial nas turmas de 6º ano, é comum a ênfase nos processos de contagem e representação dos números, dado que é um tema de grande curiosidade dos estudantes.

Esse trabalho pode ser aliado a uma perspectiva de valorização da diversidade cultural, ao propor um estudo comparativo da representação numérica e métodos de contagem dos povos de diferentes etnias para identificar características dessas outras formas de contagem e identificar se há, ou não, relação com o nosso sistema de numeração com algarismos indo-arábicos e a base dez.

Podemos citar como exemplo o sistema de contagem dos povos Guarani, cuja principal base de contagem é cinco. Nele, o caule da mandioca é considerado como símbolo para o número cinco, pois possui caroços que formam grupos de cinco e cria figura semelhante a um segmento de reta. Para os quatro símbolos anteriores ao cinco, é considerado cada caroço, que originalmente é desenhado em pequenas circunferências, alinhadas ou não. Comparando com o nosso sistema de numeração decimal, ficaria um caroço equivalente a uma unidade, dois caroços equivalente a duas unidades, e assim até quatro unidades. Ao chegar em cinco caroços, teríamos a principal base de contagem desse método, que é considerada o cinco.

Levando em conta essa representação numérica, como realizar uma atividade em sala de maneira lúdica e atrativa? Compartilho uma sugestão com a utilização de materiais manipuláveis. Com minha turma, utilizei palitos de fósforo (para representar o caule de mandioca, que equivale a cinco) e caroços de feijão (para contagem até quatro).

Desse modo, é possível trabalhar atividades em que os alunos utilizem esses elementos para identificar e representar quantidades relacionando a contagem do nosso sistema de numeração com o sistema de contagem dos Guarani, no qual, para representar os números de seis a 14 e 16 a 29, é necessário utilizar a adição de duas parcelas, sendo uma delas o cinco ou o agrupamento dessa base de contagem. Já para 15, 20 e 25, é feita a adição do agrupamento do três segmentos de reta, representado pelo palito de fósforo.

Proposta de atividade com objetivo de comparar representação numérica e contagem no sistema decimal e no sistema de contagem dos povos Guarani, adaptado com material manipulável, palitos de fósforo e grãos de feijão. Foto: Acervo pessoal da autora

2) Explore a geometria presente na cultura indígena

Na arte e artesanato dos povos originários, há uma forte presença de grafismos, representações abstratas apresentadas em pintura corporal, cestaria, cerâmica e outras manifestações culturais. Nelas, aspectos da Geometria, como a simetria, podem ser aproveitados nas aulas de Matemática.

Um caminho possível é propor que eles construam padrões geométricos em uma malha quadriculada, como na imagem abaixo. Pode solicitar que identifiquem o que se repete e a simetria, com a finalidade de estudar conceitos e relações geométricas e usar o desenho na malha quadriculada como forma de evidenciar a geometria da arte indígena.

Ainda nesse contexto, é possível enriquecer a prática ao relacionar esses padrões com outras questões, como, por exemplo, a simetria espelhada ou de reflexão.

3) Utilize jogos e brincadeiras indígenas

Outra possibilidade é a utilização de jogos de tabuleiro. Um exemplo é o Jogo da Onça, que consiste em construir um tabuleiro com 14 cachorros (representados pelos pontos azuis) e uma onça (ponto vermelho), como no esquema abaixo. Sua origem está na Península Arábica. O jogo foi trazido pelos portugueses e adaptado pelos povos originários.

O tabuleiro pode ser desenhado em uma folha sulfite, cartolina ou papelão. Para representar os pontos, podem utilizar grãos de feijão e de milho.

Em cada partida, podem participar dois alunos – um deles será a onça e o outro, os cachorros. Se a onça devorar cinco cães, ela vence o jogo. Os cachorros não podem matar a onça. Para vencê-la é necessário levá-la até a armadilha – espaço representado pelo triângulo.

A partida se inicia com a onça na casa central e os cachorros ao seu lado. Todas as peças podem se movimentar em qualquer direção, uma casa por vez. Quando a onça salta sobre um cachorro, este é capturado e retirado do jogo.

O jogo permite abordar conceitos de Geometria, localização de um ponto e desenvolvimento do raciocínio lógico, além de valorizar a cultura indígena de maneira lúdica e divertida.

Assim, colegas, essas são algumas sugestões que não devem ficar restritas somente ao mês de abril. Agora é sua vez de levar para a prática a valorização dos povos indígenas nas suas aulas de Matemática!

Forte abraço e até a próxima.

Rosiane.

Rosiane Prates é professora de Matemática dos Anos Finais do Ensino Fundamental, atua há mais de dez anos na rede pública e já integrou o Comitê de Avaliação do Município de Pinheiros (ES). Em 2022, participou da quarta edição do Mulheres na Ciência e Inovação, programa de formação para pesquisadoras no Brasil realizado pelo Museu do Amanhã e o British Council. Também foi professora-autora no projeto Planos de Aula de Matemática, realizado pela Associação Nova Escola. Além disso, tem participação como voluntária em projetos socioeducacionais e de empreendedorismo. É licenciada em Matemática e Pedagogia, graduada em Administração, especialista em Ensino e Currículo e em Matemática na Prática.

 

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