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O que Geografia tem a ver com Gênero e Sexualidade?

Projeto no Paraná discutiu se questões de gênero provocam ou não segregações espaciais

POR:
Camila Cecílio
A professora Gislaine Carla Waltrik e seus alunos
Foto: Marcelo Almeida

Gênero e Sexualidade, o que a Geografia tem a ver com isso? Essa foi a pergunta feita pela professora Gislaine Carla Waltrik muito antes de criar o projeto homônimo e ser vencedora do Prêmio Educador Nota 10 em 2017. O interesse pelo tema surgiu há mais de dez anos, em um dia em que ela encontrou um aluno chorando no pátio da escola porque estava sendo chamado de “gay” pelos colegas. Depois de pôr fim àquela situação constrangedora, Gislaine deu um abraço no garoto, mas percebeu que não tinha conhecimento suficiente sobre a temática. “Me senti envergonhada diante de um aluno tão jovem que precisava de mais que um abraço”, conta. 

Foi então que começou a jornada da professora, de União da Vitória (PR), pelo universo Gênero e Sexualidade. Para se aprofundar e entender mais sobre como poderia orientar seus alunos, ela participou de diversas formações sobre diversidade sexual, relações de gênero, sexualidade e Direitos Humanos. Enquanto se capacitava, Gislaine vivenciou outras situações difíceis, como perder alunos por crimes de homofobia, o que a fez ir além “Me senti movida a levar esse debate para a sala de aula e outros espaços de discussão, como as semanas pedagógicas”, garante.  

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Gislaine viu na Geografia um caminho para ensinar não só os conteúdos competentes à disciplina como também a sexualidade no espaço geográfico escolar. A educadora incentivou os alunos do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Astolpho Macedo Souza, a observarem se as questões de gênero provocam ou não segregações espaciais e se há espaços marginais para determinados gêneros. 

É em meio ao que observa no espaço escolar e nas propostas curriculares que Gislaine reflete sobre a docência e tenta colocar em prática aquilo que acredita e vê como demanda nas escolas onde trabalha. “A Educação para os direitos humanos é uma diretriz educacional que se efetiva à medida que cada pessoa atua de forma consciente e respeitosa em relação ao direito do outro, nas escalas mais próximas, nos espaços sociais e principalmente no espaço escolar”, destaca. 

Para despertar o interesse dos alunos ela passou a questioná-los sobre suas percepções sobre o lugar onde vivem. Como os espaços onde vivem ou transitam livremente os sujeitos dos diferentes gêneros foram se configurando ao longo do tempo? Como os diferentes gêneros estão posicionados no espaço escolar? Nas práticas esportivas, nas brincadeiras no recreio, há divisão de espaço por gênero? Como eles foram se configurando? Quem decidiu o lugar dos meninos e meninas? E na sociedade existem espaços dos homens, das mulheres? Dos homossexuais? Há espaços e horários restritos para que as mulheres possam transitar livremente e em segurança? Esses foram alguns dos questionamentos sobre a configuração do espaço geográfico, em relação às questões de gênero e sexualidade.

Os alunos da professora Alunos da professora Gislaine Carla Waltrik
Foto: Marcelo Almeida

Como posso desenvolver esse projeto na minha escola?

A professora explica que o trabalho pode ser desenvolvido com alunos de todas as séries e é possível uma prática interdisciplinar com os professores de Ciências, História e Língua Portuguesa. Alguns conteúdos, segundo Gislaine, são mais específicos do 6ºano do Ensino Fundamental ao 2º ano do Ensino Médio. O tempo de duração pode variar, pois é possível desenvolver ao longo de um ano, ou de alguns meses, dependendo do interesse da turma e das questões percebidas pelos alunos a serem problematizadas em sala de aula.

Foram organizadas oficinas para tratar do perfil demográfico da população brasileira e dos direitos da reprodução entendendo os alunos como sujeitos que, com seus corpos marcados, formam e transformam a sociedade e o espaço geográfico, que sentem, fome, medo, que circulam, são barrados, que precisam e têm direito a ocupar espaço, corpos que também são moldados pela sociedade conforme os seus interesses. 

Gênero e sexualidade, o que a geografia tem com isso? - por Gislaine Carla Waltrik

Os alunos da professora Alunos da professora Gislaine Carla Waltrik
Foto: Marcelo Almeida

Indicação: Fundamental II, Ensino Médio

Disciplinas: Geografia, História, Ciências, Língua Portuguesa

Duração: de 6 meses a 1 ano                                                       

O que é o projeto?
O objetivo desse trabalho foi convidar os alunos a olharem para como as relações de gênero estão postas desde as escalas mais próximas como o espaço escolar, familiar até espaços mais distantes, como os diferentes países. “As observações que faço sobre o espaço geográfico escolar também ganham força e fundamentação teórica e metodológica a partir do momento em que os temas que perpassam as relações de gênero vêm sendo amparados em documentos, pelas legislações, e incentivados nas propostas mundiais e nacionais sobre os Direitos Humanos”, explica a professora.

“Propostas estendidas aos estados e municípios, os quais iniciam os debates envolvendo a sociedade, para estudo e planejamento de ações que promovam a inclusão educacional e social dos sujeitos que, ao longo da história, tiveram institucionalmente seus direitos ignorados.”

“Desse modo algumas ações das secretarias estaduais de Educação estão atuando em consonância com as orientações e decisões mundiais e nacionais no âmbito dos Direitos Humanos através de políticas de Estado, algumas postas em prática nas escolas e outras em discussão. Assim também, minha prática de sala de aula vai sendo repensada a partir dessas orientações curriculares e das situações vivenciadas no cotidiano de sala de aula”, diz Gislaine.

Do que vou precisar?
Lista dos Direitos Humanos; legislação sobre o direito ao nome social e ao registro de nascimento com o nome do Pai e da Mãe.

Quais os objetivos de aprendizagem trabalhados?

  • Observar o espaço geográfico escolar e registrar em forma de mapas temáticos as informações coletadas sobre relações de gênero e sexualidade;
  • Interpretar e elaborar mapas temáticos, com informações demográficas do Brasil (cartogramas), identificando padrões espaciais;
  • Reconhecer as diferentes formas de composição familiar e valorizá-las;
  • Conhecer as diferenças entre formação biológica, identidade e expressão de gênero, orientação sexual e afetiva e os Direitos Humanos;
  • Conhecer as legislações que garantem o direito ao nome social e ao registro de nascimento com o nome do Pai e da Mãe;
  • Conhecer os Direitos Humanos e as possibilidades e locais para pedir ajuda e apoio em situações de violência.

E os desafios? Como encará-los?
“O maior desafio foi trabalhar com os relatos dos alunos sobre abuso sexual e também de violências sofridas em virtude da orientação sexual e afetiva, além dos preconceitos e homofobia”, conta a professora. 

E no final? O que meus alunos vão aprender?
- Importância do conhecimento sobre Direitos Humanos;
- Problematizar sobre como os conceitos de masculinidade e feminilidade, assim como os papeis sociais podem ser olhados de diferentes perspectivas;
- Compreender como as construções sociais e culturais definiram algumas características para diferenciar  ou formatar homens e mulheres;
- Perceber que há diferentes formações de famílias e todas podem ser legitimadas;
- O projeto virou tema de mestrado e também teve continuidade no espaço escolar em forma de oficinas sobre sexualidade e relações de gênero, os materiais produzidos durante o trabalho se transformaram em materiais didáticos para formação oferecida para acadêmicos e professores de outras escolas.

Gislaine Carla Waltrik é professora de Geografia, com especialização em Educação Infantil e Séries Iniciais pela Fundação Faculdade de Filosofia Ciências e Letras - FAFI – União da Vitória, mestre em Educação, Comunicação e Tecnologia pela Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC). Tem 33 anos de experiência trabalhando com Educação, sendo 15 anos na Educação Infantil. Atualmente trabalha com turmas do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos 

 

 

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