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Brincadeiras de percurso promovem o desenvolvimento motor e cognitivo na Educação Infantil

Alinhadas à BNCC, práticas também estimulam as habilidades socioemocionais de bebês e crianças

POR:
Carol Firmino
Circuitos e brincadeiras de percurso são atividades que promovem o desenvolvimento motor, cognitivo e socioemocional na Educação Infantil. Entenda como levar esse tipo de proposta desde os bebês. Ilustração: Leticia Moreno/NOVA ESCOLA

Os bebês e as crianças bem pequenas têm garantido pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) o direito a um ambiente convidativo e rico de oportunidades para que possam desenvolver plenamente suas habilidades motoras e cognitivas. Nesse sentido, as brincadeiras de percursos são uma opção divertida e eficaz de estimulá-los. Elas envolvem a criação de circuitos, que podem incluir desde túneis e obstáculos mais desafiadores, com o uso de pneus, cubos de madeira e cordas, até caminhos simples, utilizando objetos como tecidos, caixas, potes e almofadas. 

A versatilidade dessas brincadeiras permite ajustá-las, na Educação Infantil, de acordo com as possibilidades e necessidades de cada faixa etária, a fim de resultar em uma atividade significativa para todos. No caso dos bebês, os percursos ajudam a explorar o ambiente ao redor, promovendo a descoberta e a coordenação motora grossa, que envolve a capacidade de usar os grandes músculos do corpo para realizar movimentos amplos, como correr, pular, subir escadas, arremessar e chutar uma bola. Para crianças de 2 a 6 anos, os circuitos se tornam mais complexos e tendem a incentivar habilidades como equilíbrio, agilidade e planejamento de ações. 

Assim, a importância das brincadeiras de percursos ultrapassa os aspectos físicos do desenvolvimento infantil. “Muitas aprendizagens poderão ocorrer, como aquelas ligadas à lógica, à criatividade, à iniciativa, às relações interpessoais e ao trabalho em equipe”, afirma Carlise Pelissari, pedagoga, especialista em Educação Infantil e assessora pedagógica da Educação Infantil na rede municipal de  Lucas do Rio Verde (MT). As crianças avançam em suas habilidades socioemocionais, desenvolvendo a confiança em suas próprias capacidades, a perseverança diante dos desafios e a interação positiva com os colegas. Tais momentos ainda estimulam a resolução de problemas, pois os pequenos precisam encontrar maneiras de superar os obstáculos propostos.

Como planejar as brincadeiras de percurso?

Ao organizar propostas que envolvem brincadeiras de percurso, a professora Denise de Oliveira, da rede municipal de Porto Alegre (RS), explica que os materiais das atividades para os bebês e as crianças bem pequenas precisam ser planejados cuidadosamente, pois não podem oferecer nenhum tipo de perigo. Tecidos, argolas de plástico, caixas de papelão, tampas de latas de leite e carretéis de linhas são algumas opções. “Esses materiais devem estar limpos com antecedência e, no caso de latas, sem qualquer ferrugem”, diz. “Quando falamos de bebês com até dois anos, todo o cuidado é pouco. As caixas podem ser usadas apenas uma vez, e é necessário ficar de olho caso coloquem na boca, o que é bem comum, para podermos orientá-los.”

No decorrer da brincadeira, seja qual for, Denise acredita que o educador tem que atuar também como observador. Isso significa registrar as experiências com fotos, vídeos e escrita, para que possa identificar quais foram as habilidades desenvolvidas. Pode participar se as crianças o chamarem, mas não deve mexer no processo de experimentação. 

“Se o bebê está tentando empilhar alguns objetos sem conseguir, e o educador pega os objetos para mostrar como faz, quem está aprendendo não é o bebê, mas o educador. Acredito que os pequenos aprendem realizando diferentes experiências, com diversos tipos de materiais e com a interação entre seus pares. Eles não precisam ter um adulto para fazer o que conseguiriam por si mesmos. Além disso, precisam de espaços e oportunidades para experimentar e aprender”, completa. 

Para Carlise, a faixa etária das crianças vai definir a intensidade do desafio proposto. No entanto, um ponto importante ao escolher a atividade é o número de alunos que vai participar: “Quanto mais novas, menor o número de crianças participando ao mesmo tempo. Só assim elas vão conseguir aproveitar e se desenvolver de maneira realmente prazerosa e positiva”. A escolha do espaço também faz diferença, “mas a escola toda pode ser utilizada, com propósitos e olhares diferentes”, destaca a pedagoga.

Brincadeiras de percurso e a BNCC

A pedagoga Carlise Pelissari comenta que as brincadeiras são o eixo central da BNCC no que diz respeito à Educação Infantil. Desta forma, as interações que se apoiam nos percursos estão alinhadas aos cinco campos de experiências presentes no documento:

Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações, ao promover o pensamento lógico e a capacidade de observar e entender o ambiente.

Relatos de experiência para levar as brincadeiras de percurso para a turma

Para contribuir com ideias de jogos de percurso, convidamos duas as professoras Denise de Oliveira, da rede municipal de Porto Alegre (RS), e Mirtes Ramos dos Santos Melo, da Creche Municipal João Eugênio, em Recife (PE), para compartilharem suas experiências. 

Brincadeira de obstáculos

Sugestão da professora Denise de Oliveira, da rede municipal de Porto Alegre (RS)

Faixa etária: bebês de até 1 ano.

Objetivo: trabalhar a motricidade fina e o desenvolvimento cognitivo para facilitar e assegurar o progresso da aprendizagem dos bebês ao longo da vivência na Educação Infantil. Ou seja, movimentos de pinça, abrir e fechar, identificar o que é grande ou pequeno, alto ou baixo, pesado ou leve.

Materiais: caixas de papelão de diferentes tamanhos, latas de leite, potes com tampas, argolas, cones e carretéis de linha.

Organização do ambiente: tecido no chão (preferencialmente de cor única e sem estampas), materiais dispostos aleatoriamente sobre o tecido e em quantidade adequada para que todos os bebês possam brincar. A professora Denise conta que o planejamento começou com bastante antecedência, pois os materiais utilizados precisaram ser arrecadados em grande quantidade.

Como acontece a brincadeira: o professor faz o convite aos bebês que já engatinham ou caminham para que eles se aproximem dos materiais. “O adequado é realmente a escolha, por isso trabalho com ‘convite’. Nenhum bebê é levado até a brincadeira pelo educador, ele deve ir por vontade própria”, descreve a professora. 

Observações: o grupo que participou dessa proposta já estava familiarizado com brincadeiras desse tipo. Por isso, ao finalizar a organização do espaço, os bebês logo se dirigiram para brincar (engatinhando ou caminhando), sem precisarem do convite, pois o próprio ambiente organizado é quem convida.

Resultados: alguns bebês brincavam de colocar caixas pequenas nos potes (estavam aprendendo o “grande e pequeno”, o que é “maior ou menor”). Outros tiravam a tampa da lata de leite e tentavam colocar de volta (trabalhando a habilidade “dentro e fora”, o que “cabe ou não cabe”). Um dos bebês brincou com as argolas e latas (diferenciando as cores, o barulho feito ao bater na lata, vivenciando a “intensidade sonora”, ou o “alto e baixo”). No geral, todos os bebês se envolveram por um longo período em suas explorações. “Como o tempo da brincadeira é estipulado por eles, ela precisa ser realizada em um período amplo, sem interrupção, como o almoço, descanso ou jantar”, finaliza Denise. 

Brincadeira na abordagem Pikler

Sugestão da professora Mirtes Ramos dos Santos Melo, da Creche Municipal João Eugênio, em Recife (PE)

Faixa etária: bebês de 2 anos.

Objetivo: a partir da abordagem desenvolvida pela pediatra húngara Emmi Pikler, que enfatiza o respeito pela autonomia do bebê e a importância do movimento livre e do cuidado atento e responsivo, explorar formas de deslocamento no espaço, orientando as crianças por meio de noções como frente, atrás, embaixo, em cima, dentro, fora etc. 

Materiais: estruturas de madeira e blocos de encaixar gigantes.

Organização do ambiente: o circuito começava com uma base feita de blocos de montar gigantes. Em seguida, havia um triângulo de madeira para a criança escalar, depois uma rampa e, por fim, um cubo de madeira para a criança passar por dentro dele. 

Como acontece a brincadeira: a ideia do percurso era fazer a criança subir na base de blocos de montar e pular com os dois pés no chão. Depois, escalar o triângulo, passar por cima da rampa, equilibrando-se (um das partes da rampa é vazada, exigindo esse equilíbrio corporal) e, por fim, passar por dentro do cubo.

Observações: A professora fez uma roda de conversa sobre o circuito e, então, foi convidando uma por uma das crianças, indicando onde era o início e a incentivando a completar o percurso. “Nesse momento, esperar sua vez já era um grande desafio para algumas crianças. Em contrapartida, outras viam como desafio completar o percurso sozinhas”, detalha Mirtes. Quem não conseguia completar o circuito por conta própria, recebia ajuda, principalmente para escalar o triângulo, até que sentisse segurança para ir sem apoio. Depois, foi o momento de realizar o percurso, explorar o espaço e materiais com os colegas. “Nessa hora, observamos a solidariedade, pois aqueles que estavam com dificuldade em escalar ou se equilibrar foram ajudados pelos colegas. Por outro lado, houve situações em que a criança gostou muito de explorar o triângulo, e o escalava várias vezes, sem compartilhar com o restante da turma. Então, foi necessário intervir”. 

Resultados: o circuito ficou na sala por 40 minutos, e as crianças o exploraram por todo esse tempo. “As que inicialmente precisaram de ajuda para escalar o triângulo, ao final, ficaram mais confiantes e subiram e desceram várias vezes o objeto. Outras adoraram se equilibrar na parte vazada da rampa e explorar a parte de cima do cubo”, conclui a professora.

Cuidados e dicas para o momento da brincadeira

A professora Mirtes Ramos dos Santos Melo sugere alguns pontos de atenção ao propor atividades de percurso:

  • Ao escolher materiais, observe a altura, a firmeza e se há partes cortantes, para não haver riscos às crianças.
  • Confira a limpeza do espaço onde esses materiais serão organizados.
  • Um dos principais desafios em organizar circuitos se refere ao tamanho do espaço onde ele será realizado. Então, para não ter contratempos nesse sentido, não organize circuitos muito longos.
  • O subir, descer, entrar, sair, explorar por cima ou por baixo e pular é atrativo para a maioria dos pequenos, mas alguns podem se sentir inseguros. Fique atento para perceber inseguranças e apoiar as crianças que precisam de ajuda.