Ataques a escolas: promover cultura de paz pode ser caminho a longo prazo
Compromisso por uma convivência positiva deve ser compartilhado por toda a comunidade escolar
POR: Paula Salas
Cada episódio de violência em escolas deixa uma cicatriz na Educação. Enquanto toda uma comunidade lida com o luto e o trauma, outros milhares de educadores, estudantes e famílias de todo o país sentem a tristeza pelas vítimas e temem ser os próximos alvos.
Esses são os sentimentos que circulam pelo Brasil desde a onda de ataques, tentativas e boatos que acompanhamos desde a tragédia na EE Thomázia Montoro, na capital paulista, no dia 27 de março de 2023. O crescimento exponencial de casos de violência vêm desde 2022.
Não há uma resposta simples para a causa dessa violência, que é um problema multidimensional. Isso significa que não pode ser colocado apenas na conta da saúde mental do agressor. Estão também os impactos de casos de bullying, normalização de discursos de ódio, mais acesso a armas, falta de competências socioemocionais e espaços de acolhimento para os alunos falarem de seus sofrimento e aumento de grupos extremistas que atraem virtualmente adolescentes vulneráveis.
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Dessa forma, as ações de resposta ao problema devem cobrir diferentes aspectos. Por um lado, está a questão do aumento da segurança. Algumas secretarias de Educação, como as de São Paulo e Vitória, já anunciaram a instalação de botões de pânico, câmeras e melhorias na infraestrutura para evitar invasões, como foi o caso de Blumenau. Entre outros pontos, estão também as ações imediatas para acolher e tranquilizar toda a comunidade escolar diante dos boatos, apoio psicológico, construção de plano de convivência para promover relações mais positivas na escola e desenvolvimento sociomocional.
Uma das ações mais eficazes e com potencial de transformação a longo prazo é a construção e promoção de uma cultura de paz nas escolas. Essa concepção tem como marco a fundação da Organização das Nações Unidas (ONU) após o fim da Segunda Guerra Mundial (1945), quando se defendia a ideia de construir uma sociedade baseada nos princípios da não violência.
Na época, entendeu-se que a Educação era uma área central para o desenvolvimento de competências necessárias para que essa transformação se concretizasse. Foi assim que surgiu a Unesco (sigla em inglês para Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Em 1999, a Unesco criou um documento que trazia os compromissos de cada pessoa. Entre eles, estavam o respeito à vida, não praticar nenhum tipo de violência e defender a liberdade de expressão e a diversidade cultural.
Cultura de paz nas escolas: como levar para a prática
A quarta edição do material Paz, como se faz? Semeando cultura de paz nas escolas, publicado em 2021 pela Unesco, explica que uma cultura de paz não elimina os conflitos. “A mudança está na forma de lidar com eles e na valorização de espaços democráticos, que respeitem e valorizem a diversidade”. Isso significa uma “busca ativa de sua resolução de forma construtiva por meio da negociação, do diálogo e da democracia. Em vista disso, a força mais poderosa, capaz de resolver desafios de maneira edificante é a não violência. Ela é o oposto da passividade, da obediência e da resignação” (p. 21).
Para levar essa perspectiva para a prática, não basta o trabalho em sala de aula, mas toda a escola e a comunidade devem estar envolvidas. Pesquisadores do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral (Gepem) apontam que há três pilares para concretizar um projeto de cultura de paz:
- Formação continuada: gestão escolar, professores e todos os funcionários devem estar preparados para fazer mediação de conflitos e promover uma boa convivência na escola com o desenvolvimento de competências socioemocionais.
- Ações recorrentes: não basta ter uma semana em que o tema estará em debate na escola ou criar um componente para falar sobre o assunto. Pensar a convivência, valores e regras deve ser atividade permanente e transversal na escola.
- Diálogo e protagonismo: uma convivência pacífica exige ter canais e espaços de diálogo e um debate democrático entre toda a comunidade escolar. Essa ampla participação e uma gestão democrática possibilitam que a cultura de paz se torne um compromisso compartilhado, e não apenas de um ou outro educador.
Dessa forma, a cultura de paz nas escolas é um caminho interessante tanto para lidar com a situação atual quanto como forma de prevenção de uma nova onda de violência. E, claro, base fundamental para construir a longo prazo uma sociedade pautada pela não violência, pela democracia e pela valorização de todo tipo de diversidade.
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