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Alfabetização: conheça jogos que usam só lápis e papel

Estratégia potencializa as aprendizagens, engaja os estudantes e o desenvolvimento de habilidades socioemocionais; baixe banco de jogos para usar em sala

POR:
Dimítria Coutinho
Com materiais básicos, como lápis e papel, é possível usar jogos que contribuem com as aprendizagens de leitura e escrita. Ilustração: Leandro Lassmar/NOVA ESCOLA.

“Eles pensam que estão apenas brincando, mas, enquanto eles se divertem, eu garanto a aprendizagem”. É assim que a professora Débora Barbosa define o uso de jogos voltados para a alfabetização com sua turma de 1º ano do Ensino Fundamental na EM Professora Maria Aparecida dos Santos Brigola, em Itararé (SP).

A estratégia, além de garantir o engajamento nas aulas, auxilia Débora a manter uma boa frequência na turma. “Eu falo que vai ter bingo e ninguém falta”, brinca a professora.

Durante a alfabetização, os jogos didáticos são, de fato, uma maneira mais lúdica de promover a aprendizagem dos estudantes. Mas esse não é o único motivo pelo qual essa é uma proposta tão potente. Daniela Montuani, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde é vice-diretora do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale), afirma que os jogos são capazes de despertar reflexões a respeito do sistema de escrita que outros tipos de atividades não são capazes.

“Em um momento divertido, eles estão pensando sobre a língua”, afirma a pesquisadora. “Durante o jogo, como é um momento mais livre e solto, as crianças verbalizam muito mais o que estão pensando. Elas conseguem expressar mais o que estão pensando sobre as palavras e suas percepções delas, o que também gera reflexões entre pares”, completa.

Essa interação com as outras crianças, citada por Daniela, é outra vantagem do uso de jogos na alfabetização. Conforme essas brincadeiras estão acontecendo, as crianças acabam ajudando umas às outras, desenvolvendo uma aprendizagem coletiva.

Além disso, os jogos possibilitam a repetição, elemento importante para o aprendizado, conforme afirma Patrícia Camini, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), coordenadora do Laboratório de Alfabetização (Lápis) e coordenadora adjunta da Rede de Laboratórios de Alfabetização nas Universidades (Rede AlfaLabs). “As crianças querem jogar várias vezes e isso favorece que elas consigam abstrair algumas regularidades do sistema de escrita alfabético”, afirma a pesquisadora. 

Além das habilidades ligadas à alfabetização, essa estratégia didática permite o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, como empatia, trabalho em equipe, criatividade e organização de ideias.

Jogos com lápis e papel para usar na alfabetização

Para que os jogos tenham esses efeitos positivos, é muito importante que os professores escolham as atividades adequadas para cada habilidade que desejam desenvolver nos estudantes, ou seja, que garantam a intencionalidade pedagógica por trás desse momento.

Para isso, não é preciso usar jogos caros com tabuleiros complexos; muitas vezes, lápis e papel são suficientes para criar brincadeiras didáticas que vão permitir que os estudantes desenvolvam habilidades importantes para a alfabetização.

Jogos tradicionais, como stop, bingo ou forca, são bons exemplos de brincadeiras que podem ser adaptadas para alfabetização. Além disso, outros jogos didáticos, como a Batalha de Palavras, podem ser adaptados para o contexto de cada escola, com os próprios estudantes colocando a mão na massa para criar os elementos necessários para o funcionamento do jogo – o que pode ser uma oportunidade de desenvolver ainda mais habilidades.

As opções de jogos na alfabetização que exigem apenas lápis e papel são diversas, e muitos deles têm múltiplas possibilidades para adaptação de acordo com o contexto da turma. No material a seguir reunimos algumas sugestões:

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Partir de um bom diagnóstico dos conhecimentos dos estudantes

O professor deve ter um bom diagnóstico e conhecer bem a turma para saber exatamente quais são os objetivos que deseja alcançar. Assim, é possível adaptar o jogo para o contexto, alcançando melhores resultados.

O momento de investigar os conhecimentos também pode ser divertido! Débora relata que prepara raspadinhas para fazer as sondagens relacionadas à escrita. Para isso, ela prepara fichas com figuras e seus respectivos nomes. Em cima do nome, passa tinta guache preta para que a palavra fique escondida. Na atividade diagnóstica, cada criança recebe cinco raspadinhas com desenhos variados e precisa escrever a palavra correspondente a cada figura. Depois de escrever o aluno pega uma moeda ou objeto metálico e raspa a tinta guache seca, encontrando a palavra correta.

Esse tipo de diagnóstico, assim como outras formas de observação, são essenciais para entender as habilidades que a turma ainda precisa desenvolver e, então, escolher ou adaptar um jogo relacionado a ela.

Adaptar os jogos para atender a realidade e necessidades da turma

Débora exemplifica que o bingo, jogo adorado entre seus alunos, aparece diversas vezes ao longo do ano, com diferentes níveis de dificuldade. Quando os estudantes estão em fase mais inicial de alfabetização, ela aplica o bingo das sílabas; quando eles já estão mais avançados, utiliza o bingo das palavras.

Além das adaptações relacionadas ao nível de alfabetização, Daniela afirma que os professores também podem adaptar os jogos a determinados contextos. Por exemplo, se a turma estiver trabalhando um texto ou livro específico, as palavras que aparecem no jogo podem ser relacionadas a essa narrativa, tornando a brincadeira temática.

Pensando no nível dos estudantes, outra adaptação possível diz respeito não ao nível de alfabetização, mas à dificuldade das regras. Por vezes, pode ser necessário que o professor adapte a jogabilidade da atividade, tornando-a mais simples ou mais desafiadora.

Organizar agrupamentos produtivos para potencializar as aprendizagens

Também é papel do professor organizar os grupos para a realização dos jogos. Vanessa Martins, professora do 1º ano do Fundamental na UEB Hortência Pinho, em São Luís (MA), conta que tem uma turma muito diversa e, por isso, tem alunos em diversos níveis alfabéticos. Quando ela propõe o bingo, por exemplo, costuma separar os estudantes em diferentes níveis e faz bingo das letras, das sílabas e das palavras ao mesmo tempo, sorteando três pedras por vez. “A cada rodada, vou incentivando conversas com toda a turma. Se eu sorteio uma letra, por exemplo, pergunto se eles conhecem alguém que o nome começa com essa letra, ou se sabem o nome de um objeto que comece com essa mesma letra”, diz.

Incluir os jogos na rotina da alfabetização

Além de ter intencionalidade pedagógica, é essencial que os jogos apareçam no planejamento dos professores, sendo inseridos na rotina da alfabetização. A atividade pode aparecer ao menos uma vez na semana ou até mais. 

Daniela comenta que quem não está acostumado a utilizar jogos na alfabetização pode evitar esse tipo de atividade por pensar que gera “muita bagunça”. Porém, para a pesquisadora, a organização também é uma habilidade desenvolvida com essas atividades.

“A gente percebe que realmente causa um certo agito no início, mas, à medida que a gente vai tendo essa prática com as crianças, elas começam a lidar bem com isso, vão se tornando mais autônomas. Para isso, é interessante também colocar as crianças para participarem do processo de contar se o jogo está completo e de organizar ao final do jogo as cartelas, por exemplo”, afirma Daniela.

Papel do professor durante os jogos

Durante esse tipo de atividade, é papel do professor ser o mediador para que a aprendizagem seja potencializada. Para isso, ele deve conhecer muito bem as regras do jogo e seu repertório de palavras, se for o caso, e transmitir esse conhecimento para os alunos. Também é importante planejar bons questionamentos para instigar que os estudantes reflitam a respeito do sistema de escrita. 

Confira dicas essenciais para uma boa aplicação de jogos na alfabetização

  • Garanta que os alunos entenderam as regras do jogo: Antes de mais nada, é essencial explicar as regras do jogo da forma mais clara possível. Se necessário, faça uma rodada de teste para sanar as dúvidas e dar mais autonomia aos estudantes e repasse as regras quantas vezes for necessário;
  • Esteja atento: Por mais que haja planejamento, é só no momento do jogo que o professor vai perceber se precisa fazer mudanças. Além disso, é importante ter um olhar atento enquanto o docente circula pela sala garante que ele faça as mediações corretas, ajudando os estudantes no processo de aprendizagem;
  • Faça intervenções de aspectos sociais e emocionais: Como jogos geralmente envolvem competição, um tipo de intervenção sempre necessária é a da ordem social ou emocional, ajudando os alunos a se organizarem, trabalharem em equipe e lidarem com as possíveis derrotas e vitórias;
  • Faça questionamentos que estimulem a reflexão: Essas são as intervenções feitas para potencializar a aprendizagem dos estudantes. Inclua perguntas provocadoras, mudanças nas organizações de grupos para potencializar as trocas de experiências, mudanças nas regras para tornar o jogo mais acessível ou criação de novos desafios para alunos mais avançados.

 

No que diz respeito às perguntas desafiadoras, Elaine Lembeck, professora do 2º ano do Fundamental na EMEF Governador Ildo Meneghetti, em Porto Alegre (RS), dá alguns bons exemplos, afirmando que sempre busca instigar os alunos a pensarem além do que o próprio jogo propõe. “Se for um bingo de letras, ao invés de só sortear a letra e falar qual é, eu digo, por exemplo, que tirei uma vogal, e questiono quais letras podem ser. Depois que eles respondem, eu continuo: ‘A letra que eu tirei não tem som de ‘ó’, então qual ainda pode ser?’. Outro exemplo é com o bingo de palavras. Ao invés de revelar de uma vez a sorteada, eu pergunto: ‘a palavra que eu tirei tem três sílabas, quais podem ser?’”, conta a professora.

Quando as atividades são em pequenos grupos, Elaine conta que vai andando pela sala e perguntando aos estudantes sobre como eles chegaram aos resultados, para que eles revelem qual reflexão fizeram.  “Ao mesmo tempo que eles brincam, a gente pensa sobre a escrita”, afirma.

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